Dois anos atrás, Vitor Asseituno perguntou ao vice-presidente de uma grande operadora de saúde por que ele não fazia uma campanha para engajar os pacientes diabéticos. A resposta: ‘porque eu não tenho o email nem telefone dele. Isso fica com a corretora, e o RH da empresa não manda’.
O diagnóstico de Vitor: “Os planos de saúde não sabem para onde ir porque eles não têm nem os dados básicos para isso. É uma coisa inacreditável.”
Vitor está tentando resolver as inúmeras distorções que amaldiçoam o setor de saúde suplementar com a Sami, uma startup que funciona como uma camada de inteligência para as operadoras e quer capturar um naco de um mercado de R$ 200 bilhões cujo faturamento cresce 20% ao ano.
Os problemas da saúde suplementar são conhecidos: a remuneração geralmente é baseada em volume, o que estimula exames e internações desnecessárias; falta investimento na prevenção das doenças; e o relacionamento dos usuários com as operadoras tem o mesmo calor humano daquele tio que você é obrigado a ver no Natal.
O resultado é uma inflação médica pornográfica, com reajustes que fazem o IPCA comer poeira — só nos últimos cinco anos, os planos empresariais foram reajustados em mais de 150%.
Diversas healthtechs estão tentando atacar partes do problema, mas a Sami — que recebeu
seed capital da Redpoint eVentures e do Canary — se propõe a resolvê-lo por inteiro.
“O que fazemos é entender os problemas — em geral de incentivos, transparência e falta de prevenção — e buscar formas de corrigi-los usando tecnologia,” Vitor disse ao
Brazil Journal.
Hoje, a Sami já faz esse trabalho para dois clientes, a Unimed e o Pátria, atendendo cerca de 200 mil vidas. Neste modelo, além de receber um fee por vida, a startup também tem uma remuneração atrelada aos resultados.
A Sami usa análise de dados para tornar a jornada dos pacientes mais eficiente, definindo, por exemplo, o melhor médico para cada necessidade com base em dados e KPIs. Depois, usa a telemedicina para fazer os atendimentos básicos — eliminando idas desnecessárias a clínicas e hospitais. E por fim, tenta melhorar a conduta dos médicos e hospitais mudando o sistema de incentivos e remuneração.
O grande benchmark da Sami é a Oscar Health, uma seguradora americana que já fatura US$ 2 bilhões, tem 420 mil usuários e foi avaliada em US$ 3,5 bilhões numa captação recente. A Oscar é conhecida por seu UX impecável e uso intensivo de dados.
“Um dos grandes problemas nos Estados Unidos são os pacientes irem para o nível errado de atendimento, em geral mais caro do que seria necessário,” diz Alan Warren, que foi CTO da Oscar e hoje é sócio e conselheiro da Sami. “A Oscar ajuda a guiar os clientes dentro desse sistema complexo, usando tecnologia intensiva e tornando todo o processo mais eficiente.”
Alan também trabalhou 12 anos na IBM e outros 12 no Google, onde foi responsável pela criação do Google Finance e das ferramentas de compartilhamento da empresa, como o Google Docs, Sheets e Drive. Na Sami, ele está envolvido na estratégia e no desenvolvimento de toda a parte de TI.
O fundador da 99, Paulo Veras, e Sérgio Ricardo, o ex-CEO de Amil, também são advisers e investidores da Sami.
A Sami está tentando criar um sistema que ajude também na prevenção das doenças, entendendo a rotina de seus clientes e interagindo com eles com a indicação de hábitos mais saudáveis.
“Só 10% do que determina a saúde das pessoas é o cuidado clínico (ter um bom hospital e um bom médico). O restante é comportamento e ambiente,” diz Vitor. “O problema é que os planos de saúde focam apenas nesses 10% — em ter uma boa rede credenciada.”
Os dois fundadores da Sami são empreendedores de segunda viagem. Vitor, que é médico formado pela UNIFESP, fundou uma empresa de eventos médicos que foi vendida em 2018 para a Informa Markets, uma gigante inglesa do setor. Já Guilherme Berardo é o sócio fundador da rede de hospitais Premium Care, pioneira no modelo de long-term care hospital no Brasil.