Diversidade cultural no comando
21/03/2014 - por Por Helô Reinert | Para o Valor, de São Paulo

A racionalidade da paulistana Deborah Vieitas ao comandar uma instituição financeira contrasta com o sincretismo religioso que exibe com discrição. Um cordão vermelho ata ao pulso esquerdo um olho turco, enquanto uma fitinha do Senhor do Bonfim guarda, no direito, três pedidos feitos durante o réveillon em Trancoso, no litoral baiano. Filha de uma alemã e um brasileiro, cresceu influenciada por duas culturas. Da mãe, conservou a rigidez que compõe o principal traço da sua personalidade. "Não sou mais exigente com ninguém do que sou comigo", afirma. "Mas também sou alegre e otimista." Por 20 anos, a carreira também sofreu influência de uma terceira cultura: a francesa. "Eles têm uma forma cartesiana de trabalhar. Prezam organização e planejamento. Mas, como têm proatividade, adaptam os conceitos com o tempo."

Deborah Vieitas é diretora-presidente do Banco Caixa Geral-Brasil (BCG) desde outubro de 2008, seis meses antes de a instituição portuguesa iniciar operação no país. Montou o banco do zero. O recrutamento no mercado preencheu 90% das vagas, os outros 10% resultaram de seus relacionamentos profissionais. Acompanhou a implantação de soluções tecnológicas e criou uma base de 489 clientes de peso. A expansão da instituição é estratégica para o grupo financeiro e para a ampliação dos negócios portugueses nesse mercado. Segundo o anuário "Valor 1000" publicado em 2013, ficou em 7º lugar entre os 20 bancos que mais cresceram em depósitos totais em 2012, entre os pequenos e médios.

Deborah dedica muito tempo ao banco. Não é raro que a rotina absorva 12 horas de trabalho. Ela estabeleceu como regra não levar tarefas para casa, com exceção de leituras. Casada há 23 anos com um engenheiro, com um filho de 22 dedicado à economia e uma filha de 18 que cursa direito, considera a evolução de sua carreira uma conquista familiar, porque "é impossível se não há compreensão e colaboração de todos".

"Sempre fui competitiva sem tirar o espaço de ninguém, mas absorvendo novas responsabilidades sem que elas fossem oficialmente delegadas"

A proatividade acompanhou a carreira de Deborah, que aprova ser definida como competitiva. "Sempre fui assim, mas sem tirar o espaço de ninguém. Absorvia novas responsabilidades sem que elas fossem oficialmente delegadas, me envolvendo com assuntos que me interessavam e mostrando comprometimento."

Formou-se pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e entrou no mundo profissional pelas portas da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap). Mais tarde, foi selecionada para um mestrado na École Nationale d'Administration (ENA), escola de elite do governo francês. De volta a São Paulo, cresceu seu interesse pelas relações externas do Brasil e as finanças internacionais adquiriram peso maior. Na FGV, concluiu mestrado em economia internacional. Trabalhou cinco anos no Unibanco em um momento em que o Brasil declarava moratória da dívida externa, o que colaborou para desenvolver suas potencialidades.

No Crédit Commercial de France-Brasil, seu emprego seguinte, obteve a maior surpresa da carreira. No dia em que voltou da licença-maternidade do primeiro filho, recebeu a promoção de gerente a diretora de câmbio e comércio exterior. "Gostaria de deixar esse exemplo de reconhecimento ao trabalho da mulher. A qualidade profissional não é afetada pela chegada dos filhos, apesar de que a maternidade não torna a vida profissional mais fácil", diz. "Mas as mulheres têm boa capacidade de administrar muitas coisas ao mesmo tempo."

Deborah compartilha algumas impressões com Sheryl Sandberg. A diretora-geral do Facebook investigou as razões para o crescimento das mulheres na carreira permanecer estagnado por tantos anos. Sheryl as encoraja a sonhar alto, assumir riscos e se lançar em busca de seus objetivos sem medo. Deborah reflete sobre o quanto as mulheres evitam postos de responsabilidade com receio de não poder conjugar a vida profissional e a pessoal.

 

 

"O mundo de negócios tende a ser machista, mas há evolução. Não há uma situação paritária, mas nem todos os movimentos na vida profissional têm de ser de cima para baixo", diz. "A participação da mulher também é relevante. Precisa ser proativa." A proatividade de Deborah a levou a uma função de representação no ano passado. Após dois anos como vice-presidente, tornou-se presidente da Associação Brasileira de Bancos Internacionais (ABBI).

Antes de ser a diretora-presidente do BCG, respondeu, por oito anos, pela vice-presidência de outro banco francês, o BNP Paribas-Brasil, e contribuiu a posicioná-lo no grupo de cinco grandes bancos estrangeiros de investimento. A executiva atribui a motivação de permanência em uma empresa a um conjunto de condições: o desejo de participar da construção da vida corporativa, contar com um conjunto de ferramentas atualizadas para desempenhar bem a função e oferecer condições de trabalho, remuneração e possibilidade de evolução de carreira. "Não existe uma fórmula que defina os executivos. Cada empresa, segundo o estágio, necessita de atributos diferentes. Muitas vezes, os CEOs têm os seus ciclos dentro da empresa quando podem oferecer a ela o melhor da sua experiência."

Quando está fora do mundo financeiro, o que inspira Deborah - depois de viajar - é a arte contemporânea. Mover-se no circuito de museus e galerias paulistano para ter acesso à produção artística atual a faz sentir uma cidadã do mundo. Uma das experiências recentes que merece elogio é o trabalho do Museu da Imagem e do Som (MIS), que tem conseguido realizar exposições notáveis, em São Paulo. E ela nem precisa ir a Paris.



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