Experiência e sensibilidade inglesa na gestão
21/03/2014 - por Por Jacilio Saraiva | Para o Valor, de São Paulo

Há 31 anos, Annette Reeves de Castro pegou um avião e trocou a Inglaterra pelo Ceará. Ela ainda não sabia, mas não estava indo somente a passeio. Nascida em Huddersfield, a 310 km ao norte de Londres, a jornada a levaria a uma carreira de executiva de sucesso, bem longe dos súditos da rainha.

Levada ao novo país pelo marido brasileiro, Marcos de Castro, em dois meses de Brasil Annette ganhou um emprego na Esmaltec, empresa do grupo cearense Edson Queiroz e principal fabricante de eletrodomésticos de linha branca do Nordeste. Hoje, é superintendente de uma empresa de 3,8 mil funcionários que faturou R$ 1 bilhão no ano passado. "Em um ano em que os itens de linha branca tiveram uma queda de consumo de cerca de 10%, conseguimos chegar a uma meta 5% superior a 2012", explica, em um português impecável.

Annette começou na área de exportação da Esmaltec em 1983. Um cunhado que trabalhava na companhia a convidou para ajudá-lo. O desafio não era pequeno. Tinha 24 anos, estava em um novo país e não entendia ninguém. "Aprendi o português no chão de fábrica, traduzindo manuais de normas técnicas", conta. Três anos depois, já era a gerente do setor e desenvolveu as bases de negócios que despachariam os fogões da marca para mais de 50 países. "O Brasil iniciava suas principais exportações e éramos obrigados a criar os processos da cadeia de venda dos produtos."

Nos anos 1990, ela assumiu também as entregas externas da Cascaju, fábrica de castanha do grupo Edson Queiroz com cerca de 80% da produção destinada ao exterior. Em paralelo, desenvolveu os procedimentos de importações de todas as empresas da holding, com negócios nos setores de comunicação, distribuição de gás, educação superior, agroindústria, bebidas e mineração.

"Espero ser uma inspiração para as mulheres que trabalham comigo. Quero mostrar que é possível ter carreira, família e ainda realizar seus desejos"

Em 2003, foi convidada para assumir a gestão de uma nova fábrica da Esmaltec - uma responsabilidade totalmente diferente do mundo comercial onde vivia. "Busquei transformações que pudessem ser feitas com maior sensibilização das equipes. Saímos de um quadro de 1,7 mil funcionários para 3,8 mil. Deixamos de ser uma empresa apenas regional." A mudança deu certo. Annette assumiu a superintendência da Esmaltec há dez anos, aos 45 anos de idade.

Com fábrica em Maracanaú, município da região metropolitana de Fortaleza, a marca existe há cinco décadas e produz eletrodomésticos, como fogões, geladeiras, freezers, bebedouros e equipamentos para refrigeração comercial, além de botijões de gás. A indústria dispõe de 65 mil m2 de área construída e capacidade para produzir 300 mil máquinas, ao mês.

Para 2014, Annette diz acreditar que os valores de faturamento devem permanecer sem mudanças significativas. "Por ser um ano de Copa do Mundo, a linha marrom, de televisores e sistemas de som, tem um destaque maior", afirma. Será preciso, desse modo, buscar mais rentabilidade e fazer investimentos - está prevista uma expansão na capacidade produtiva da empresa, nos próximos 24 meses. A executiva confia em "demanda consistente", principalmente no Norte e Nordeste, áreas onde a penetração de alguns itens, como as lavadoras automáticas, ainda é tímida. Segundo Annette, a alta do emprego e os programas de incentivo do governo, como o Minha Casa Melhor, podem ajudar a esquentar a demanda.

No ano passado, segundo a superintendente, a Esmaltec conseguiu manter a liderança no país nas linhas de fogões a gás e bebedouros, feito que mantém há seis anos. A fabricante é considerada a terceira maior de linha branca no Brasil e a número 1 entre as nacionais. Em 2012, 32% do seu faturamento de exportação foi obtido em 16 países africanos.

 

 

A preocupação com o ambiente está na agenda de Annette. A empresa foi premiada pela Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec-CE) por perseguir uma fabricação "mais limpa", com a redução de impactos nos recursos naturais. O dia a dia na fábrica também obrigou a executiva a trabalhar em um ambiente no qual os homens são maioria - 75% do total de funcionários da empresa. "Aprendi a viver em mundo masculino e manter a sensibilidade de uma líder", diz. "Luto para ter os melhores profissionais ao meu redor, independentemente do gênero. Ao mesmo tempo, espero ser uma inspiração para as mulheres que trabalham comigo. Quero mostrar que é possível ter carreira, família e ainda realizar seus desejos."

Com a jornada na Esmaltec, Annette foi consulesa da Inglaterra no Ceará durante 22 anos. "Foi uma maneira de manter contato com o meu país e ajudar outros britânicos na região, além de desenvolver iniciativas comerciais, culturais e sociais entre as nações." Quando o consulado inglês fechou as portas em Fortaleza, o governo da Holanda a convidou para assumir a representação do país na cidade. Com a experiência de gestão que acumulou, não se nega a ajudar a filha, Sasha, de 23 anos, que montou uma academia, e o filho, Thomas, 26, que mantém uma exportadora de plantas tropicais.

Na Inglaterra, Annette começou a trabalhar aos 11 anos, durante as férias escolares. "Já fui faxineira, salva-vidas, vendedora e guia turística." Apesar de citar Londres como uma das cidades preferidas, foram os vínculos de amor, amizade e trabalho que fixaram Annette, definitivamente, à cidade que o marido apresentou. A Inglaterra, agora, é apenas mais um possível destino nas férias. Há dois anos, recebeu da Câmara Municipal o título de Cidadã de Fortaleza.



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