erencio, há um ano, uma equipe de oito pessoas em uma empresa de médio porte. Cerca de três meses atrás comecei a notar uma certa animosidade entre duas funcionárias bastante talentosas, com as quais nunca tive problemas anteriormente. Percebi que elas passaram a se evitar e mal se olham durante o expediente. Como considero a sinergia entre os colaboradores, o compartilhamento de informações e o clima organizacional como fatores importantes para o bom resultado do trabalho, fui investigar o que estava acontecendo. Em uma conversa com a secretária, fiquei sabendo que o caso é estritamente pessoal: aparentemente, uma "roubou" o namorado da outra, que também trabalha na empresa, mas em outro departamento. Agora, não sei como abordar as duas para tentar resolver essa questão, pois não quero parecer intrometido ou fofoqueiro. Também não queria me envolver na vida pessoal das funcionárias, ainda que o lado profissional tenha sido afetado. Procurei o RH e me disseram que não há política proibindo namoro entre colaboradores. O que devo fazer?
Gerente comercial, 30 anos
Resposta:
No ambiente de trabalho no Brasil, vida profissional e vida pessoal se misturam com facilidade. Estudos da antropologia e da cultura organizacional em nosso país apontam para esse fato. Inequivocamente, esse é um traço do modelo brasileiro de gestão. Questões relacionadas à vida pessoal dos empregados são transferidas facilmente para o ambiente de trabalho, podendo afetar severamente as relações profissionais e as rotinas de produção, como nesse caso que nos relata.
A princípio, a vida pessoal dos empregados não deve ser objeto de interesse das empresas. Círculos de amizade, preferência sexual, hobbies ou vida familiar são relações de fórum pessoal, e a empresa deve zelar pela privacidade de seus colaboradores. Não cabe aos gestores arbitrar sobre as idiossincrasias nos relacionamentos entre os empregados. Tais peculiaridades não são de competência da gestão empresarial.
Em que medida os assuntos que envolvem o relacionamento entre colaboradores passa a ser objeto de interesse da empresa? Quando passam a afetar as rotinas de trabalho e se tornam a causa de falta de eficiência e cooperação. Portanto, a indisposição na relação entre funcionários não é, em um primeiro momento, da competência dos gestores - a não ser que isso se torne um problema do time e afete o rendimento do trabalho.
Se isso está ocorrendo, caberá a você alertar as funcionárias em questão que essa animosidade entre elas não prejudique o desempenho da equipe. Não cabe a você arbitrar a relação amorosa ou buscar promover a reconciliação entre ambas. Aqui, é importante entender o seu papel como gestor: essa não é matéria de sua competência. Cabe a você zelar pelo bom desempenho da equipe e, consequentemente, pela boa relação entre os colaboradores.
Se, pela razão desse conflito, os resultados estão sendo prejudicados, caberá uma advertência solicitando que as partes entendam que qualquer problema fora do âmbito profissional não deve afetar o rendimento da equipe. Se, contudo, ainda assim houver perda de desempenho, caberá a você tentar romper essa animosidade entre ambas inibindo a interação entre elas - por exemplo, alocando uma delas em outra equipe.
Seres humanos não são máquinas. Como somos suscetíveis a conflitos de interesse, mau humor e dias ruins, muitas vezes ao longo da nossa vida teremos que enfrentar situações de discordâncias, animosidades, brigas e indisposições com os outros.
Deve haver, no entanto, a consciência sobre a maturidade e a responsabilidade para com o ambiente de trabalho e o desempenho. A empresa não representa o espaço ideal e não é responsável por resolver problemas que envolvem conflitos pessoais. O local de trabalho não é um ambiente privado e não deve apresentar tolerância aos caprichos pessoais de seus colaboradores. Espera-se que os funcionários tenham disciplina pessoal e entendam que são responsáveis por seus atos, comportamentos, entregas pertinentes as suas atividades e pelo zelo em criar uma atmosfera positiva no ambiente de trabalho.
Portanto, o meu conselho é: converse, busque elevar a consciência sobre o papel de cada uma no trabalho e a manutenção de um bom ambiente. Se não for suficiente, leve a questão a uma decisão que impeça a perda do rendimento do trabalho. Afinal, essa e a sua tarefa como gestor. Boa sorte!
Marco Tulio Zanini é professor e coordenador do mestrado executivo em gestão empresarial da Fundação Getulio Vargas e consultor da Symballein
Esta coluna se propõe a responder questões relativas à carreira e a situações vividas no mundo corporativo. Ela reflete a opinião dos consultores e não do Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações. As perguntas devem ser enviadas para:
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