“Objetivo deve ser melhorar a saúde dos pacientes e não a super utilização dos recursos”, afirma o superintendente executivo do Instituto de Estudos da Saúde Suplementar (IESS), Luiz Augusto Carneiro.
Em entrevista exclusiva ao Saúde Web, ele diz que há sim desperdício de recursos no Brasil e falhas na precificação de materiais. Também aponta semelhanças entre o Brasil e os Estados Unidos, obtidas no estudo “Fontes de desperdício de recursos no sistema de saúde americano”.
Saúde Web: De acordo com o estudo não há como estimar o desperdício de recursos no Brasil. No entanto, a pesquisa pode servir como base para o aperfeiçoamento tanto do SUS quanto da Saúde Suplementar. Na sua opinião, o que poderia ser apontado como crítico nos dois sistemas?
Carneiro: Se olharmos os números dos Estados Unidos, onde tem mais gasto desnecessário é no item “tratamentos, consultas, medicamentos e exames”, que pelo levantamento feito com base no PIB de 2011 está em torno de US$ 158 a 226 bilhões. Outros estudos mostram que, por exemplo, nos Estados Unidos não se tem uma expectativa melhor ao nascer do que em países que gastam menos com saúde proporcionalmente, como Japão e Reino Unido. Então, no Brasil, principalmente no setor privado com certeza estamos com tratamento em demasia, um exemplo são os exames. O número de tomógrafos, mamógrafos, equipamentos de ressonância magnética que temos no País, o que tem disponível para cada 100 mil habitantes é muito superior do que o exigido pelo Ministério da Saúde e muito maior do que encontramos em países desenvolvidos, isso de fato existe no Brasil e estamos preparando uma publicação no IESS sobre isso, portanto este item que é muito importante nos Estados Unidos também está presente aqui.
Saúde Web: E como saná-lo? Como pode ser resolvido?
Carneiro: O setor como um todo tem de arranjar uma forma de trabalhar com protocolos e seguir os padrões razoáveis ditados pela medicina. O objetivo específico deve ser melhorar a saúde dos pacientes, mas não com a super utilização dos recursos, porque isso encarece demasiadamente o sistema e ao invés de irmos para o caminho do melhor uso dos recursos da infraestrutura de saúde, vamos para o uso exagerado. No final das contas, isso significa o que vemos hoje: o setor de saúde suplementar com a sinistralidade muito alta. No setor como um todo, a despesa com exames, terapias e internações que já chegaram num patamar muito alto e a receita não dá para aumentar tanto, a variação do custo médico hospitalar (medida também pelo IESS ) está em 15%, portanto alguma coisa tem de ser feita para a sustentabilidade do sistema ser mantida a longo prazo.
Saúde Web: A concentração de mercado nos Estados Unidos e a assimetria de informações são outros importantes aspectos relacionados ao desperdício de recursos no setor de saúde, uma vez que garantem as empresas margens de lucro muito superiores as encontradas em outros setores mais transparentes da economia. Como isso acontece? Como isso ocorre no Brasil?
Carneiro: O que pode ocorrer é a concentração de mercado. Por exemplo, às vezes se tem no segmento de materiais médicos da cadeia de saúde alguma indústria que detém o monopólio ou o oligopólio de determinado equipamento. Aqui no Brasil, infelizmente a Anvisa não faz o trabalho de monitoramento constante da concorrência dentro da cadeia de saúde. O Conselho de Administração e Defesa Econômica (Cade) faz isso muito pontualmente com alguma denúncia. A Agência Nacional de Saúde (ANS) regula o plano de saúde, ou seja, não existe no Brasil um monitoramento constante da concorrência e muito provavelmente isso explica porque se tem o custo de materiais de medicamentos com variação anual de 30% ou 70%. As imperfeições concorrenciais na cadeia de saúde levam a esse sobrepreço, por conta da concorrência ou por conta de assimetria de informação, ou seja, quem está comprando não sabe por que o preço está aumentando, se tem um material substituto ou mais barato.
Saúde Web: As falhas de precificação mais marcantes são as órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs). Se os diversos procedimentos e materiais tivessem um preço médio adotado por todos os prestadores de serviço, haveria uma economia de US$ 36 bilhões por ano. No Brasil, o estudo cita que a ANS está atenta para regularizar a prática. Podemos deduzir que a prática no Brasil é prejudicial para as operadoras de saúde do ponto de vista dos gastos?
Carneiro: Os estudos do IESS mostram que nos últimos cinco anos o que mais encareceu foram as internações e dentro delas as OPMEs. Elas subiram o dobro do IPCA no período, e lógico que os planos de saúde não subiram o dobro do IPCA no mesmo período. Isso mostra que existe uma perda de margem dos planos de saúde ao longo dos anos e parte disso vem desse aumento com o custo do OPME.