É preciso focar no que realmente importa
17/02/2014 - por Por Edson Valente | De São Paulo

"O bom CEO é aquele que traz simplicidade e foco para a organização. A complexidade mata o crescimento". Essa é a teoria de James Allen, sócio da consultoria Bain & Company em Londres, segundo a qual as empresas têm de concentrar esforços estratégicos e a atuação dos talentos em seu "core business", ou negócio essencial.

De acordo com o consultor, distanciar-se desse centro é o grande problema enfrentado hoje pelas companhias - e a culpa é dos líderes. Cabe a eles não ceder à pressão para se desviar do 'core'. Ideias para investimentos alternativos vêm "do conselho, dos gestores, dos consultores, dos bancos" e são potencializadas por informações que chegam de todos os lados.

Allen, cujo livro "O Poder dos Modelos Replicáveis", em coautoria com Chris Zook, foi lançado no Brasil em 2012 pela Elsevier Editora, esteve em São Paulo na semana passada para palestras e eventos com CEOs de grandes grupos empresariais. Em entrevista exclusiva ao Valor, destacou a responsabilidade dos executivos de prolificar e acompanhar práticas de gestão que, ao permearem a estrutura organizacional, reforçam a missão, os valores e a estratégia da empresa em todos os níveis hierárquicos.

O que define o "core business", diz o consultor, não é a linha de produtos ou o cardápio de serviços comercializados no presente momento, e sim um conceito um tanto mais sutil, que vai determinar até mesmo as expansões futuras: a promessa que é feita ao cliente - as atividades que vão mantê-lo fiel à sua marca em relação ao que a concorrência oferece.

Sob esse ponto de vista, exemplifica ele, o negócio da Apple é design, e a Nike não é uma fabricante de tênis, e sim de tênis de alta performance para atletas. "Já a Starbucks tem retomado o foco, que durante um tempo havia perdido, sobre o cerne de suas operações: o barista."

Assim, conhecer bem o público-alvo e identificar seu grau de satisfação em tempo real com a entrega da companhia são os elementos fundamentais para obter bons resultados corporativos. Quem tem mais intimidade no dia a dia com as demandas e opiniões do consumidor, no entanto, são os funcionários da linha de frente. Por essa razão, "eles são os reis do negócio", define Allen.

Desse modo, a comunicação desse "staff" com a alta direção tem de ser aberta e constante. Um bom exemplo de gestor brasileiro que consegue manter esse fluxo, em sua opinião, é Luiza Helena Trajano, dona da rede de lojas Magazine Luiza. Uma das competências que marcam o perfil dos CEOs que fazem o simples com propósitos bem definidos em mente é o repúdio à burocracia. "O diálogo com o cliente não pode ter de passar por 27 níveis hierárquicos para chegar à cúpula", afirma o consultor.

Ele diz desconfiar das estratégias que se baseiam apenas na personalidade do consumidor médio, traçada por cruzamentos de dados. Em contraposição à frieza das estatísticas do big data, cita o estratagema, adotado por alguns gestores, de usar exemplos de problemas enfrentados por clientes "de carne e osso" - inclusive mencionando seus nomes - para corrigir erros de rota e orientar as equipes. "Os melhores líderes criam estratégias para definir rotinas e comportamentos nas linhas de frente, não criam estratégias que vivem apenas no PowerPoint. Execução, para eles, é tudo", enfatiza. Propiciar frequentes "loops" de feedback que retroalimentam a cadeia de procedimentos é outra habilidade exigida desses executivos.

Ser ágil nas decisões se torna fundamental em uma economia turbulenta na qual é mais importante adaptar-se rapidamente às mudanças frequentes do que estabelecer previsões para o cenário futuro dentro de um período de dez anos, diz Allen. Identificar por meio de pesquisas uma perda de fatia de mercado, exemplifica, é atentar-se para algo que já vem acontecendo paulatinamente há tempos. É uma conclusão que chega atrasada.

Uma barreira à implementação e à replicação de métodos de trabalho norteados pela satisfação do cliente passa pela escassez de bons profissionais, fato que Allen aponta como um grande desafio para o mercado brasileiro. "No geral, as receitas crescem mais rapidamente que os talentos, e esse é um grande problema". A saída que enxerga é a do investimento nos pratas da casa, por meio do treinamento de jovens talentos. "É preciso dar chance às pessoas de aprenderem na prática, a partir dos erros que cometem."

Os departamentos de recursos humanos têm, a seu ver, a incumbência de identificar - e recrutar - profissionais que se encaixem nas culturas das empresas. "A retenção deles também passa pela definição clara dos propósitos das organizações e pelo reforço constante da 'nobre missão' corporativa", ressalta.


 


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