Quanto ganham os conselheiros no Brasil
11/02/2014 - por Por Edson Valente | De São Paulo

O ditado popular que diz que "se conselho fosse bom, ninguém dava de graça" tem lá seu respaldo no mundo corporativo. Isso porque, se por um lado as empresas acham, sim, que conselho é bom, por outro precisam pagar caro por ele. Um presidente de "board" no país ganha, em média, R$ 400 mil anuais, de acordo com levantamento realizado pela consultoria global Hay Group. Membros independentes, por sua vez, recebem honorários anuais de R$ 240 mil - nos Estados Unidos, o valor chega a R$ 190 mil.

O estudo considerou 854 membros de conselhos administrativos de 32 empresas de capital aberto listadas na BM&F Bovespa. Foram analisadas informações públicas e outras apuradas pela consultoria. Os dados da realidade americana foram obtidos no banco de dados do Hay Group nos EUA, constituído por cerca de 300 companhias.

Uma comparação mais acurada entre os rendimentos de lá e daqui, porém, revela que, no fim das contas, os conselheiros americanos ganham mais que seus pares no Brasil. Isso porque, em geral, seus honorários correspondem a 40% de seu pacote de remuneração - os outros 60% provêm de incentivos de longo prazo, por meio da outorga de ações ao profissional. Se incluídos esses benefícios, seus ganhos médios anuais saltam para R$ 470 mil.

Esse método de pagamento com um componente variável, segundo Henri Barochel, líder da área de remuneração executiva do Hay Group, favorece o olhar do conselho para a perenidade e a sustentabilidade da empresa. "Faz com que haja o interesse em que a companhia tenha bons resultados no longo prazo, pois a remuneração está atrelada à performance das ações", diz ele.

No Brasil, essa prática se restringe à minoria. "Em 99% dos conselhos, os membros só recebem mesmo o honorário", afirma Barochel. Aos poucos, porém, esse quadro tem mudado, especialmente nas empresas do setor financeiro, que começam a adotar a outorga.

 

 

Outra transformação em curso no país é o próprio papel exercido pelos conselhos, afirma o líder do Hay Group. Embora a principal atribuição deles ainda seja o controle e monitoramento de resultados, atualemnte esses grupos têm se concentrado cada vez mais no apoio estratégico aos negócios. Para cumprir essa função, adquirem o perfil de uma equipe multidisciplinar, mesclando experiências em áreas como as de finanças, marketing e recursos humanos. "Não adianta haver só ex-CEOs", afirma Barochel.

Pelo levantamento, 88% dos conselheiros são oriundos de quatro formações no Brasil: engenharia, administração, economia e direito. A maioria possui vivência em cargos executivos, sendo que, entre os presidentes dos conselhos, 32% são ou foram CEOs. Já os principais assuntos em discussão nas reuniões de conselho - além da análise do desempenho dos negócios e a apuração de resultados - são investimentos em novos negócios e definição de estratégias futuras. Temas relacionados à gestão de pessoas, especialmente remuneração executiva e sucessão, governança corporativa e, por último, análise de riscos, completam a lista.

Estados Unidos e Brasil diferem também quanto a restrições sobre a quantidade de conselhos de que um mesmo profissional pode participar. Nos EUA, segundo dados do Hay Group, 41% das empresas limitam esse número a quatro, 30% a três, 5% a dois, e 24% não impõem qualquer tipo de limite. Enquanto isso, no Brasil, 84% das companhias não determinam um teto de participações.

Mas há quem estabeleça, para si mesmo, um máximo de comprometimentos. Paulo Nigro, além de ocupar o cargo de presidente da empresa de embalagens Tetra Pak, foi anunciado no fim do mês passado como membro do sexto conselho de que faz parte, o da produtora de celulose Eldorado Brasil. "Cada um sabe o seu limite. Por aqui eu paro", enfatiza o executivo.

Nigro conta que sua primeira experiência como conselheiro se deu em 1999, quando trabalhava pela Tetra Pak no Canadá. Naquele ano, foi convidado, junto com presidentes de empresas como Procter & Gamble e Nestlé, para integrar um grupo com o objetivo de encontrar destinação para 50% dos resíduos da província de Ontário. "Na época, aprendi mais do que contribui", afirma.

Depois, na Itália, foi chamado para fazer parte de uma associação industrial na região de Emília-Romanha para redefinir parâmetros e processos empresariais. Atualmente, além da Eldorado Brasil, participa dos "boards" do Instituto Ethos, Fundação SOS Mata Atlântica, Câmara de Comércio Sueco-Brasileira, Lide e do próprio grupo Tetra Pak.

Muitos desses conselhos possuem atividades alinhadas com seu interesse na área de sustentabilidade. Isso faz com que ele tenha motivação suficiente para "qualquer tipo de sacrifício em relação a tempo" e consiga conciliar sua atuação nos grupos com o expediente "das 8h às 20h" que a gestão executiva à frente da Tetra Pak lhe demanda.

Mesmo assim, Nigro ressalta que precisa se organizar muito bem para programar as reuniões - em outubro ou novembro, o planejamento dos encontros do ano seguinte já tem de estar fechado. Em sua opinião, no que tange a rotinas desse tipo nos conselhos, o Brasil ainda tem muito a evoluir na comparação com o que percebeu no Canadá.

Pelo estudo do Hay Group, o número total de reuniões, ordinárias e extraordinárias, realizadas pelos conselhos de administração no país em um ano variam de 4 a 20, sendo 12 a quantidade mais frequente. Dentre as empresas pesquisadas, 39% estabelecem 4 encontros ordinários anuais. Para dar conta desses compromissos, Nigro recorre à tecnologia: "Fazemos muita coisa remotamente".

Embora a maioria dos conselheiros possua experiência como executivo, um excelente CEO não necessariamente será um membro de conselho brilhante. A mudança de cadeira exige flexibilidade e adaptação do profissional. "Quem foi treinado e educado para ser executivo tende a querer assumir a operação. No conselho, é preciso usar a experiência para dar um direcionamento às decisões dos diretores", explica Nigro. Assim, segundo Barochel, o caminho é o do desapego, ou seja, dar autonomia para o CEO trabalhar em vez de tentar "colocar a mão na massa".

Até 2009, Álvaro Pereira Novis era vice-presidente financeiro do grupo Odebrecht. Foi por conta dos conhecimentos adquiridos na área que iniciou, na própria corporação, sua carreira de conselheiro. Hoje é atuante em três "boards" - um como presidente na Valora Gestão de Investimentos, empresa da qual é acionista, e dois como membro independente, na Amcham Brasil e na companhia de logística JSL.

Novis reconhece que existem executivos que não se acostumam com o papel e a postura de um conselheiro. Segundo ele, dentre as habilidades exigidas está a de arbitrar crises e conflitos de interesse entre acionistas, mais comuns quando não existe um controlador majoritário na companhia. "O indivíduo precisa demonstrar um espírito de querer servir e se dedica à empresa. Não se pode simplesmente aceitar um convite para preencher uma vaga ou formar currículo."

O estudo do Hay Group indica que conselheiros independentes não passam por um processo formal de recrutamento e seleção nas corporações brasileiras. Geralmente eles são indicados pelos acionistas ou pelo presidente do "board". Outra questão analisada se refere à avaliação formal dos membros do conselho, verificada em 48% das empresas consultadas. "Não vejo como um hábito tão difundido", diz Novis. Entre os métodos utilizados para esse fim, prevalece a autoavaliação, em 36% dos casos. Uma consultoria especializada é contratada em 14% das vezes.



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