A contratação de trabalhadores por meio de empresas terceirizadas é tema que há muito se discute na seara trabalhista e que sempre rendeu debates acalorados.
O Projeto de Lei nº 4.330, que tramita no Congresso Nacional desde 2004, e que regula o contrato de prestação de serviço e as relações de trabalho dele decorrentes, poderá eliminar as interpretações subjetivas do Poder Judiciário para estabelecer regras claras com relação à terceirização.
Até agora, os juízes se valem da Súmula nº 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que tem sido a referência para reger essa modalidade de contratação, reconhecendo como legítima a terceirização nos serviços especializados ligados a "atividade-meio" do tomador, tais como vigilância, conservação e limpeza.
A contratação de determinados serviços terceirizados chega a ser mais dispendiosa do que a contratação direta
No entanto, a súmula deixa dúvidas a respeito da chamada terceirização da "atividade-fim" das empresas, já que não há definição objetiva, o que gera intensa discussão acerca de quais serviços poderiam ser ou não terceirizados, especialmente em setores, como o da construção civil, onde existem diversas etapas na realização de uma obra.
Alguns segmentos da sociedade têm demonstrado feroz resistência à aprovação do PL nº 4.330, pois vislumbram que haveria prejuízo aos trabalhadores. Todavia, o assunto deve ser analisado sob a ótica racional, evitando-se especulações exageradas, até mesmo porque a terceirização já é uma realidade praticada há anos em nosso país e no mundo. Porém, necessita de regulamentação.
Na era da globalização é quase impossível estabelecer a fronteira entre o que seria atividade-fim e atividade-meio, vez que dificilmente um produto é concluído por apenas uma empresa. A cadeia produtiva é geralmente complexa, a exemplo do segmento da tecnologia da informação, que conta com a cooperação de companhias de diversos países, cuja dinâmica é movida através de serviços terceirizados. O mesmo ocorre com a indústria automobilística.
Há quem defenda que o objetivo das empresas seria apenas obter mais lucro e, até mesmo, fragmentar os trabalhadores em suas representações sindicais. Contudo, a contratação de determinados serviços terceirizados chega a ser, muitas vezes, mais dispendiosa do que a contratação direta.
Além disso, a terceirização não é bem-vista por aqueles que acreditam que os direitos laborais seriam precarizados. Embora a preocupação seja louvável, ela é geralmente baseada em um mito, eis que a terceirização, por si só, não gera precariedade. Trata-se de um equívoco associar a terceirização à falta de registro ou ao trabalho análogo ao de escravo, por exemplo, pois essas situações degradantes e repudiadas pela sociedade podem ocorrer tanto com trabalhadores diretos ou terceirizados.
Em grande parte, a reação contrária ao PL 4.330 vem das lideranças sindicais. Os trabalhadores terceirizados não ficariam necessariamente sem representação sindical, vez que a formação (se necessária) de novos sindicatos é garantida pela Constituição Federal.
O operário terceirizado possui as mesmas garantias dos empregados diretos, por exemplo, décimo terceiro salário, férias remuneradas, adicional de 1/3 de férias, FGTS, isto é, faz jus a todos os direitos e dispõe de mecanismos legais para ser ressarcido em caso de sofrer prejuízos, uma vez que poderá incluir a empresa tomadora dos serviços na mesma ação (fato corriqueiro na Justiça do Trabalho), buscando sua corresponsabilidade.
No segmento da construção civil, por exemplo, a empresa tomadora dos serviços de empreitada pode ser responsabilizada de forma solidária. Isso significa que a atual legislação já prevê proteção suficiente ao trabalhador, porém o mesmo não ocorre em relação às empresas.
Ao contrário do que alguns profetizam, o PL 4.330 prevê inúmeras proteções ao trabalhador e exige das empresas uma série de requisitos para colocar em prática o serviço terceirizado, como exemplo, possuir capital social compatível com o número de seus empregados, a faculdade de imobilização de 50% do capital social por meio de acordo ou convenção coletiva, garantia de condições de segurança e saúde, responsabilidades subsidiária e solidária, previsão de multa às empresas que descumprirem a lei, dentre outras cautelas.
O que se busca com a aprovação do PL 4.330 é a definição objetiva em relação à terceirização, eis que a falta de legislação propicia um nefasto ambiente de insegurança jurídica e consequente desestímulo a empreendedores. Tanto é que, muitas empresas brasileiras preferem contratar serviços no exterior, deixando de propiciar empregos em solo nacional.
Conclui-se que, ao contrário do terror que alguns setores difundem na mídia, o trabalhador terceirizado não ficará à margem das proteções legais. Logo, não há razão para repelir o PL 4.330, pois enquanto sua aprovação se prolongar, o Brasil perderá mais competividade no mercado global e desperdiçará uma rica oportunidade de aperfeiçoar a legislação trabalhista.
Alexsander Fernandes de Andrade é especialista em relações do trabalho e sócio da Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados
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