Em dez anos, programas de promoção saltaram de 68 para 1.868 e já atendem a mais de 2,3 milhões de pessoas
O crescimento do custo de saúde em patamares que chegam a três vezes a inflação geral da economia e a crise, que retirou cerca de três milhões de pessoas da saúde suplementar , levaram operadoras e empresas a investirem em prevenção. Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em uma década o número de programas de promoção de saúde saltou de 68 para 1.868. Só nos últimos cinco anos, o número de beneficiários incluídos nesses programas cresceu cerca de 50%, somando, atualmente, 2,3 milhões de pessoas. O resultado desse cuidado com os usuários de planos de saúde resulta em reduções significativas de interações, idas ao pronto socorro, cirurgias, o que significa dizer que há casos em que o aumento dos custos já caminha a par e passo ao da inflação na casa dos 3% e 3,5%.
Não à toa, em 601 empresas, pesquisadas pela Mercer Marsh Benefícios, houve um aumento de 19% do gasto per capita em promoção de saúde por funcionário de 2017 para 2019. O levantamento aponta ainda que 64% das companhias que mantinham programas de saúde e bem estar têm planos de ampliar o ainda mais esse investimento até 2021. E 78% das que ainda não desenvolvem esse tipo de ação, planejam implementá-la nos próximos 12 meses.
— Finalmente, os programas de prevenção foram parar na mesa dos CEOs, que entenderam que tratar custo de saúde vai além de discutir o preço do contrato com a operadora anualmente, mas investir em gestão e promoção.
Isso resulta em mais saúde para o funcionário, mais produtivadade e menor absenteísmo. A evolução do custo per capita das empresas gira em torno de 16%, em um ano, nas que adotam essas práticas, essa curva de crescimento é menor, chega a ser a metade — diz Mariana Dias Lucon, diretora de produtos da Mercer Marsh Benefícios.
Segundo Thais Jorge de Oliveira e Silva, diretora de Serviços ao Segurado e Gestão Médica da Bradesco Saúde , a alavancagem de custos dos planos de saúde nos últimos anos, aumentou não sóo foco nos programas de prevenção, mas ampliou as iniciativas para além de doenças crônicas.
— Hoje, pela utilização do plano pelo usuário, com fisioterapia e consultas a especialistas conseguimos identificar que ele precisa de um direcionamento, antes que ele entre com um pedido de cirurgia de coluna. Ou seja, identificamos o problema antes que ele se agrave. A tendência é a criação de modelos preditivos, já estamos trabalhando em relação a patologias de joelho e ombro. Nas empresas que vêm investindo na gestão dos doentes crônicos e na prevenção, já temos casos de evolução da variação do custo médico hospitalar (VCMH) na casa de 3%, 3,5%, acompanhando a variação da inflação, o que é o sonho dourado — ressalta Thais, informando que a operadora tem 600 mil dos seus 3,6 milhões de beneficiários envolvidos em programas de prevenção.
O interesse das empresas contratantes de planos em programas de prevenção e o uso de redes sociais para divulgação, fez a Assim Saúde , em um ano, quase dobrar o número de beneficiários envolvidos nessas ações, diz Evelyn Mosqueira, diretora médica da operadora. Há um ano e meio no programa de emagrecimento saudável da operadora, Denise Lacerda, de 54 anos, assistente administrativa, diz se sentir melhor cuidada:
— Passo por um período grande de estresse, a equipe do programa me passa dietas, exercícios de relaxamento, que me ajudam muito. Comecei em janeiro do ano passado e precisei parar em junho, por causa de problemas pessoais. Pouco tempo depois a equipe me ligou para saber o que tinha acontecido e isso me fez bem, senti que alguém se importava comigo.
Ganho financeiro também para o consumidor
O ganho de saúde também não é o único benefício que os usuários que aderem aos programas. Em muitos casos, como no plano de autogestão da Fundação Copel, no Paraná, consultas e exames feitas por orientação do programa são isentos da coparticipação, que é de 30% do valor do procedimento. A falta de dados suficientes que permitam mensurar o resultado econômico dos programas de prevenção para a autogestão, Carlos Machado, gerente do Departamento de Gestão e Negociação em Saúde da fundação, mostra um exemplo do impacto dessas ações:
— O programa de check up, por exemplo, custa R$ 130 mil. No entanto, um tratamento de câncer pode custar R$ 500 mil. A prevenção, sem dúvida, sai mais barata e é mais eficaz para a saúde do usuário.
Que o diga Isabel de Souza, 64 anos, aposentada, usuário do plano da Fundação, que descobriu ao participar do programa de check up um câncer de intestino em fase inicial:
— Eu sempre me cuidei e fiz exames de rotina. Até que uma amiga falou sobre o programa de prevenção do plano de saúde e comecei a fazer acompanhamento por lá. Uma vez o resultado do meu exame deu alteração e tive que investigar. E em agosto de 2017, descobri o câncer no intestino em fase inicial. Em seguida comecei o tratamento e em março do ano passado já tinha finalizado todo o processo. Acho que se eu tivesse descoberto junto com os sintomas, seria tarde demais. Porque até então, eu não sentia nada.
Dos cerca de dois milhões de usuários da SulAmerica Saúde , cerca de cem mil frequentam atualmente um dos programas de prevenção de doenças da operadora. E a expectativa para os próximos dois, três anos é de investimento pesado nesse segmento que a empresa chama de gestão do bem-estar e qualidade de vida. Uma das novidades é o programa de prevenção de câncer de mama que vai convocar as mulheres que não fizeram o exame.
— Com os programas, reduzimos em 16% a ida de doentes oncológicos ao pronto-atendimento, e em 21% a de idosos, além disso, o cuidado com pacientes de alto risco, diminui em 34% as reinternações, e e diminuímos em 47% as cirurgias de coluna. Coloca tudo isso na ponto do lápis e veremos que não á toa a sinistralidade da carteira da empresa é até 8% mais baixa a de outras operadoras do setor — Tereza Veloso, diretora Técnica Médica e Rede Credenciada na SulAmerica Saúde.
Análise de efetividade dos programas
Atualmente, 68% dos beneficiários da saúde suplementar estão vinculados a planos coletivos empresariais. A meta da ANS é fazer com que as empresas contratantes participem mais da gestão da saúde de seus funcionários, incrementando programas que promovam prevenção.
—Queremos que as empresas participem com a consciência de que essa gestão afeta o custo sim, mas também gera valor em saúde. E temos visto experiências muito interessantes em todo o país. A empresa é quem mais próxima desse beneficiário e o básico nesse tipo de programa é conhecer a sua população — diz Rogério Scarabel, diretor de Normas e Habilitação dos Produtos da ANS, que firmou um acordo de cooperação para realização de estudos sobre o tema com o Sesi.
Atualmente, 53% das 743 operadoras que atuam no mercado brasileiro desenvolvem programas de promoção de saúde e prevenção de doenças e recebem, para tanto, um incentivo financeiro da ANS, com a liberação de 10% da sua margem de solvência. A ANS, no entanto, está em fase de aprimoramento desse instrumento, para que o foco dos programas seja baseado no resultado em saúde dos beneficiários. A agência já está realizando levantamento das evidências e resultados obtidos em cada operadora.
Se, por um lado, os programas se multiplicam, um dos desafios das operadoras é o engajamento dos usuários. Em alguns casos, a média de adesão é baixa, de 20%, da população elegível para aquela atividade. O maior engajamento, normalmente, é identificado nos projetos voltados a idosos, onde chega a 80% do grupo alvo.
— Esse é um caminho em que todos ganham, operadoras, empresas e usuários da saúde suplementar. É preciso sair do modelo hospitalocentrico atual, de doença para melhorar o cuidado. No entanto, não é um caminho fácil, pois está relacionado a mudança de comportamento, alimentação, exercícios, parar de fumar, e é uma tarefa árdua conseguir esse engajamento — diz Vera Valente, diretora excutiva da FenaSaúde.