Chef leva requinte da gastronomia para o Sul de Minas
18/12/2013 - por Por Rosa Spinelli | Para o Valor, de São Paulo

Foi depois de muitas intempéries em alto mar e várias travessias por cozinhas e cursos de grife no Brasil e no exterior, que o chef Francisco Lélis Capozzoli decidiu abrir seu próprio restaurante na bucólica região do Sul de Minas Gerais. Escolheu sua cidade Natal, Cambuí, e ele mesmo comandou a construção e a decoração da casa, inaugurada em junho deste ano com o nome de Pomodorini. Sete meses depois, o restaurante é referência em comida italiana e acolhimento para os moradores e visitantes das Serras Verdes, região que inclui cidades turísticas como Gonçalves e Monte Verde, além de Cambuí, Extrema e Pouso Alegre.

O sonho de um restaurante próprio foi embalado pelos quase dez anos que o chef Lélis passou no mar comandando cozinhas de iates como dos empresários Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, donos da AB Inbev, e Artur Vicentin, do Grupo Votorantim. "Os donos eram mergulhadores e viviam correndo atrás de peixes", relata.

Ancorado na Cidade do Panamá, o barco se valia do Canal para cruzar do Atlântico ao Pacífico, percorrendo da Baja Califórnia - Mar Cortez - às ilhas do Mar do Caribe. Entre as lembranças caribenhas, uma noite inteira de tempestade com ondas que cobriam o convés e obrigaram o barco a atracar para reparos durante semanas.

Ao longo dos anos de 2009 e 2010, o "chef-marinheiro" também comandou a cozinha de um barco na Europa, percorrendo a região da Sardenha e todo o Sul da Itália. Ele próprio comprava nas feiras os ingredientes para preparar uma autêntica cozinha mediterrânea.

Mas o gosto e o aprendizado da cozinha tinham começado lá atrás, em terra firme, quando em 1999 trocou o curso de psicologia pela gastronomia. Mergulhou por dois anos no curso do Senac, em Águas de São Pedro, interior de São Paulo, e se formou como chef em "pratos quentes". "A gente chega achando que sabe cozinhar, depois aprende que a cozinha é quase um ritual, exige grande disciplina e mesmo esforço físico", explica. Seu primeiro trabalho foi com o chef italiano Giancarlo Marcheggiani, do Terraço Itália, em São Paulo, falecido no ano passado. "Ele me ensinou mais do que preparar pratos, me ensinou a ver a cozinha com o coração. Hoje cozinhar, para mim, é uma forma de doação, de proporcionar prazer às pessoas. Eu diria que gosto mais de cozinhar do que de comer", afirma.

Outra escola foi o trabalho com o chef Laurent. "É uma cozinha exigente, de pratos sofisticados. Foi aí que tive um contato maior com a carta de vinhos", avalia. Ainda em São Paulo, foi primeiro cozinheiro do restaurante François Payard e comandou a cozinha particular de André Esteves, dono do Banco Pactual. Entre seus cursos, está uma passagem pela escola Dante Alighieri, em Siena, na Toscana, em 2007, onde se especializou na cozinha mediterrânea.

Foram as voltas pelo mundo e a passagem por cozinhas de referência que o animaram a começar um negócio próprio. "Com as reservas, fui pagando o terreno e construindo a infraestrutura para o futuro restaurante", relata. "A finalização e o acabamento foram possíveis com um financiamento da Caixa Econômica, o Construcard, com juros de 1,5% ao mês, em média", detalha.

Outra motivação para o negócio próprio vem de sua própria história. A bisavó, italiana, vendia cheiro verde e temperos no mercado de Bragança Paulista, no interior do Estado de São Paulo. Hoje, o chef Lélis tem sua própria horta onde cultiva alecrim, sálvia, tomilho e outras folhas para tempero e decoração dos pratos. Quem passa pelo restaurante, pode ver, pela ampla janela que separa a cozinha do salão, os potes de temperos verdes que o próprio chef manuseia. O nome Pomodorini vem do tomate cereja que ele colhe no quintal. "Quando você volta às origens, descobre que há muitos traços em comum com nossos avós. É um código que vem do passado", ele diz, referindo-se aos avós e bisavós italianos.

Conhecido na cidade de Cambuí, o chef Lélis transformou seu restaurante em um ponto de encontro das pessoas que moram ou passam finais de semana na região. "Os amigos foram trazendo os amigos e o círculo foi se ampliando", relata.

O público já mistura amantes da comida italiana de passagem pela região, com moradores locais que buscam uma cozinha e um local mais refinado. "A região vem atraindo muita gente que busca uma melhor qualidade de vida. E o restaurante está sendo uma resposta a essa demanda", afirma o chef.

Em terra firme, Lélis tem se defrontado com problemas que se agravam por todo país que é a falta de mão de obra especializada. "É difícil encontrar gente disposta a ser treinada", diz, lembrando que, depois de meses, a equipe começa a engrenar. Para contornar essa dificuldade, foi preciso limitar os dias de abertura do restaurante, numa espécie de "teste-drive" com os funcionários. O Pomodorini, que se limitava ao jantar das sextas e sábados, se prepara para abrir um salão maior e estender o atendimento por mais dias. "Já temos vários eventos marcados para o próximo ano", ele diz.

Enquanto Lélis comanda a cozinha, sua mulher, Valdirene Bertolacini Ribeiro, assume múltiplas funções no salão, da decoração à escolha dos vinhos. Assistente executiva da BRZ Investimentos durante a semana, Valdirene se dedica a cuidar da imagem do restaurante e a receber pessoalmente os clientes nos jantares de sexta e sábado, além de treinar os novos funcionários. Ela própria aponta os pratos mais requisitados, entre eles o spaghetti ao limone com salmão - com limão siciliano -, o ravióli de abóbora e o medalhão ao poivre com batatas Anna, batata laminada ao molho bechamel com queijo parmesão. Entre os vinhos, há tintos chilenos, argentinos, italianos e espanhóis. "O Marquês Casa Concha y Toro é um dos vinhos mais pedidos", conta o chef e proprietário do restaurante.

"O Pomodorini é resultado de vários sonhos", diz Valdirene. Um deles é compartilhar com o marido um projeto de restaurante próprio acalentado há anos. "Outro é o prazer de poder oferecer uma boa comida e um bom vinho em um lugar acolhedor, numa região que ainda proporciona poucas opções", afirma.

Para o casal, o restaurante é também uma forma de, aos poucos, trocar a correria de São Paulo pelo ritmo mais pacato das pequenas cidades, ganhando em qualidade de vida.


 




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