Líder no mercado de anestesias na América Latina, o laboratório brasileiro Cristália elegeu uma nova área em que pretende ser protagonista nos próximos anos, a oncologia. Para tanto, investiu R$ 150 milhões na implantação da primeira fábrica na região de insumos farmacêuticos ativos (ou IFAs) de alta potência usados em medicamentos que tratam de adenomas, câncer de mama, de pulmão, medula, ossos e cérebro. A unidade produtiva, que fica dentro do complexo industrial de Itapira (SP), vai atender às necessidades do laboratório argentino Ima, comprado pelo Cristália e especializado em oncologia, e possibilitará a produção de terapias contra a doença também no Brasil.
Hoje, o país importa praticamente 100% dos princípios ativos para medicamentos contra o câncer e mais de 90% dos insumos usados pela indústria farmacêutica em geral. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Insumos Farmacêuticos (Abiquifi), foram US$ 10 bilhões em importações de medicamentos e IFAs em 2018, contra exportações de apenas US$ 1,8 bilhão. "A farmoquímica oncológica vai nos dar uma autonomia inexistente na concorrência e melhores condições de competitividade, entre outras razões porque teremos de comprar muito pouca coisa em dólares", disse o cofundador do laboratório, Ogari de Castro Pacheco.
O Cristália, que já produz 53% dos princípios ativos que utiliza na fabricação de um amplo portfólio de medicamentos, utilizou recursos próprios para construir a nova unidade, de 3 mil metros quadrados. A escolha dos insumos que serão produzidos em Itapira, conforme o empresário, levou em conta o grau de dificuldade de acesso ao ingrediente no mercado. "Vamos fabricar o que é mais difícil de se encontrar no mercado", contou.
A meta é alcançar produção em escala industrial ainda em 2019 de pelo menos seis IFAs, entre os quais o bortezomibe (indicado para o tratamento de mieloma múltiplo), anastrozol (para o tratamento do câncer de mama pós-menopausa), pemetrexede (para o tratamento de mesotelioma pleural e câncer de pulmão) e temozolomida (tratamento de cânceres cerebrais e glioblastoma multiforme). No total, porém, o plano é produzir 18 diferentes insumos.
O Cristália estreou no mercado de oncologia justamente com a compra do Ima, em 2011, e segundo Pacheco, tem como filosofia buscar a liderança em nichos de mercado.
Assim, além da área de anestesia, o laboratório tem posição de destaque em oftalmologia. Agora, vai buscar se destacar nas terapias para tratamento do câncer. "No que depender do nosso esforço, a meta é chegar em três anos a essa posição", disse Pacheco.
No ano passado, o grupo Cristália teve vendas líquidas de R$ 2,44 bilhões, com alta de 7% na comparação com o exercício anterior. Para 2019, a previsão é de faturamento de R$ 2,816 bilhões e, até o momento, o laboratório está dentro do orçamento que prevê expansão de 15%. Parte da expansão será proveniente do lançamento do primeiro biossimilar 100% brasileiro do hormônio do crescimento humano, ou somatropina.
Nos últimos dez anos, conta o cofundador, o Cristália investiu ao menos R$ 400 milhões para viabilizar o projeto, que exigiu a formação de profissionais especializados. Indicado para crianças com baixa estatura, o hormônio já está disponível no mercado e, no Brasil, é importado. Agora, o Cristália produzirá a somatropina nacional em escala industrial, com capacidade de atendimento de 100% da demanda local. O laboratório tem produto pronto em estoque e aguarda a definição de preço pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed) para ir a mercado - a maior procura está na saúde pública.
O Cristália também está a caminho de colocar no mercado uma forma inovadora de terapia, que hoje exige a aplicação diária de injeções. Está em fase final de desenvolvimento, em parceria com uma empresa coreana, a somatropina de longa duração, que vai requerer uma aplicação semanal. Pelo acordo firmado, o laboratório atenderá o mercado latino-americano, enquanto Estados Unidos e Europa ficarão sob responsabilidade do parceiro asiático.