A resolução 2.227/2018 do Conselho Federal de Medicina (CFM) que regulamenta a prática da telemedicina - aquela que permite fazer consultas médicas, diagnósticos e até cirurgias a distância - causou forte reação entre os médicos de diversas partes do país. As críticas levaram o CFM a declarar que vai continuar debatendo o assunto e aperfeiçoar a norma.
Conselhos Regionais de Medicina do Rio Grande do Sul, de São Paulo e do Rio de Janeiro declararam que não haviam participado das discussões e que tinham críticas e sugestões a apresentar. E, de forma conjunta, presidentes de conselhos regionais prepararam uma nota pedindo que o CFM não publicasse a resolução no Diário Oficial da União (DOU) nesta semana, como previsto.
Os sindicatos dos médicos do Ceará e da Paraíba chegaram a pedir a suspensão imediata da resolução. Disseram que os critérios adotados em uma consulta com médico e paciente no mesmo lugar garantem segurança aos dois. Compreendem a importância da tecnologia na área da saúde, mas pedem que seu uso seja feito de maneira democrática e transparente.
O cardiologista Iran Gonçalves, colunista sobre assuntos de saúde do Valor, disse que a tecnologia não pode ser usada para afastar o médico do paciente. "Nos Estados Unidos e na Europa temos visto movimento no sentido contrário, de aproximar médicos e pacientes".
Uma consulta médica, ou mesmo uma cirurgia, a distância deveria ser feita em casos excepcionais, quando o paciente de fato está em uma área remota e precisa ser atendido de forma urgente. Gonçalves sentiu falta na resolução de um capítulo que trate de responsabilidades na prática da telemedicina. "Se algo der errado, quem se responsabiliza?".
O presidente da Associação Médica Brasileira, Lincoln Lopes Ferreira, informou, em nota, que recebeu críticas e dúvidas sobre a resolução do CFM. Por isso, decidiu convocar o Conselho Científico da AMB para discutir as novas regras e suas implicações.
Ferreira disse que também já havia conversado sobre o assunto com o presidente do CFM, com o vice-presidente Mauro Ribeiro e com o conselheiro Aldemir Soares. Estes, segundo Ferreira, se mostraram dispostos a participar da discussão a ser realizada pela AMB.
O CFM repudiou as "críticas infundadas". O texto aprovado, declarou, é resultado de dois anos de discussões, durante os quais especialistas e representantes da comunidade médica foram convidados a participar. As novas regras, segundo o CFM, "garantem parâmetros técnicos, legais e éticos, como a preservação do sigilo e da confidencialidade". Também observou que a primeira consulta deve ser presencial e só depois, se ambos médico e paciente concordarem, as consultas seguintes seriam feitas remotamente.
O CFM informou ainda que "a relação médico-paciente de modo virtual é permitida na cobertura assistencial em ÁREAS GEOGRAFICAMENTE REMOTAS [sic], desde que existam as condições físicas e técnicas recomendadas e profissional de saúde". O destaque em letras maiúsculas dá a entender que consultas médicas a distância não seriam feitas, então, em larga escala. Mas, isso já vem ocorrendo no país.
A Hapvida, maior operadora de planos de saúde do Nordeste, está fazendo 8 mil consultas virtuais por mês em cidades como Belém (PA) e São Luis (MA), conforme publicou o Valor ontem.
O Hospital Sírio-Libanês atua na telemedicina há oito meses, apoiando médicos que atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). A nova resolução do CFM acelera os planos para oferecer a telemedicina a clientes corporativos do hospital como Votorantim e Santander.