A Desenvolve SP, agência de fomento à inovação ligada ao governo do Estado de São Paulo, vai passar a subsidiar o pagamento de juros vinculados a linhas de crédito oferecidas a startups. Batizado de Juro Zero Inovação, o programa foi lançado ontem e já está em funcionamento. Serão empregados recursos de R$ 8 milhões, que virão do Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcet).
"Esse dinheiro é só para os juros; não é o volume total dos empréstimos, que pode ser muito maior", diz Eduardo Saggiorato, diretor de negócios e fomento da Desenvolve SP, ao Valor. O programa se aplica a duas linhas de crédito oferecidas pela agência. A primeira é a Linha de Incentivo à Tecnologia, que conta com recursos próprios e é destinada a empresas com faturamento anual entre R$ 360 mil e R$ 300 milhões; a segunda é a Inovacred, cujos recursos vêm da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e visa apoiar companhias com receita de até R$ 90 milhões por ano.
O prazo para pagamento dos empréstimos pode chegar a dez anos, já incluso período de carência de até dois anos.
Inicialmente, o programa Juro Zero Inovação vai se restringir a empresas que já tenham concluído o Pipe, uma iniciativa de apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). É um universo de 192 companhias, cujos projetos poderão ser financiados em até 100%. As empresas não precisam, obrigatoriamente, ter base tecnológica. Podem ser de outros setores, mas têm de comprovar que os projetos apresentados estão voltados à criação de produtos, serviços ou processos inovadores. "É um conceito mais abrangente", diz Saggiorato.
Por intermédio do Pipe, a Fapesp apoia empresas em fases iniciais - a maior parte nas etapas I e II, de demonstração de uma ideia ou desenvolvimento de um projeto de pesquisa. Entre 2014 e 2017, o número de projetos aprovados pela Fapesp sob o âmbito do Pipe aumentou de 119 para 237. O volume de recursos subiu de R$ 22 milhões para R$ 79,8 milhões.
Ao escolher empresas que já passaram pelo crivo da Fapesp, a Desenvolve SP pretende apoiar companhias um pouco mais maduras, que estão próximas de lançar produtos ou expandir operações. É uma espécie de última milha da inovação.
"Existe uma dificuldade muito grande por parte das empresas para ganhar escala e chegar ao mercado", diz Carlos Américo Pacheco, diretor-presidente da Fapesp.
As áreas de atuação da empresas aprovadas são muito diversas, mas alguns segmentos têm mostrado "crescimento explosivo", afirma Pacheco. Em especial, aplicações de inteligência artificial, robótica e manufatura avançada. Outro conjunto expressivo é o das chamadas agrotechs - companhias de inovação voltadas ao agronegócio.
Para a Desenvolve SP, a Linha de Incentivo à Tecnologia e a Inovacred tornaram-se as principais fontes de financiamento para projetos de inovação. Juntas, essas duas fontes somam o montante de R$ 153 milhões, ou 89% do volume total de R$ 171,9 milhões investido desde 2012, quando a agência começou a oferecer esse tipo de crédito.
Ao facilitar o pagamento dos empréstimos, a Desenvolve SP espera estimular a tomada de crédito e aumentar a competitividade do Estado como polo de inovação.
São Paulo é, de longe, o principal centro de startups do país - reúne 2.995 dessas empresas, o equivalente a 30% das 9.922 companhias novatas de tecnologia cadastradas no Brasil pela ABStartups, a associação do setor. A estimativa da organização é que, ao todo, existam entre 10 mil e 15 mil startups no país.
A cidade de São Paulo, onde estão 2.059 startups, já chegou a integrar a lista dos 20 melhores lugares para se abrir um negócio desse tipo no mundo. Em 2015, ficou em 12º lugar no estudo "Ranking Global de Ecossistemas de Startups". No ano passado, porém, saiu da lista, em meio às dificuldades econômicas do país e à ascensão de outros polos internacionais como Estocolmo, na Suécia, e a China.
No ranking mais recente, divulgado no primeiro semestre deste ano, a Startup Genome, organização responsável pelo estudo, compara São Paulo com outros oito "ecossistemas" de inovação no mundo, como o Vale do Silício, na Califórnia; Nova York e Londres.
O levantamento mostra que, de maneira geral, as startups paulistas ainda estão pouco preparadas para atuar no exterior. Esse é um problema considerando que no setor de tecnologia ganhar escala internacional costuma ser um apelo fundamental para ser bem-sucedido.
São Paulo apresenta o terceiro pior índice no quesito "desenvolvimento de produtos concentrado em clientes globais", à frente apenas da Cidade do Cabo, na África do Sul, e Chicago. A cidade aparece em último lugar sob outro critério - a manutenção de um time distribuído globalmente para obter novos clientes.
"Vemos muita pesquisa científica que acaba não virando inovação", diz Saggiorato, sobre o cenário atual das startups brasileiros.
A expectativa é que os primeiros projetos sob o programa Juro Zero Inovação sejam aprovados a partir de janeiro. Se todo o orçamento for consumido na primeira etapa, a Desenvolve SP pode vir a negociar mais verba para a próxima fase. "O primeiro trimestre de 2019 será um balizador do andamento do consumo dos recursos", afirma Saggiorato.