Uma pesquisa inédita revelou uma dúvida importante enfrentada pela maioria dos trabalhadores no Brasil. O brasileiro não tem a menor ideia sobre quando vai se aposentar. Um levantamento feito pelo HSBC ao qual o Valor teve acesso antecipadamente mostra que 82% das pessoas afirmaram que não sabem com que idade vão poder ou querer se aposentar. É o maior percentual entre os 15 países pesquisados pelo banco. A média internacional ficou em 43%.
Os motivos para essa falta de previsibilidade podem ser vários, segundo Alfredo Lalia Neto, diretor da HSBC Seguros no Brasil. Pode ser a vontade de continuar ativo e produzindo depois dos 58 anos, idade média com que a geração anterior se aposentava, segundo a pesquisa. E também pode ser a dificuldade de projetar a renda total na aposentadoria em razão do fator previdenciário.
Conforme a pesquisa, a questão financeira é ponto relevante no debate sobre a vida pós-trabalho. Mais da metade (56%) das pessoas que já se aposentaram diz que sua remuneração caiu em relação ao salário recebido no último emprego. Nesse grupo, 16% revelam que sua renda caiu mais que a metade; 19% afirmam que a redução ficou entre 25% e 50%; e 21% dizem que a remuneração encolheu até 25%. Somente 11% afirmam que ficou maior.
Apesar de afetar a maior parte dos aposentados, a redução na renda não é prevista pela maioria dos entrevistados que ainda estão trabalhando. Somente 31% dos pré-aposentados esperam que sua remuneração seja menor na aposentadoria e, nesse grupo, apenas 4% das pessoas projetam que ela fique abaixo de 50%.
Os menores ganhos como aposentado se transformam em um problema ainda maior quando o ex-trabalhador descobre que seus gastos não diminuíram quando ele passou a ficar em casa. "A pesquisa mostra que esse custo não cai tanto quanto se imagina", diz Lalia, do HSBC. "As pessoas acreditam que vão reduzir os gastos, que não vão precisar mais comprar paletó. Mas algumas despesas, como as médicas ou com viagens, podem crescer bastante", afirma o diretor e responsável, no país, pelo estudo "Vida Após Trabalho", nono relatório da pesquisa internacional "O Futuro da Aposentadoria", realizada anualmente pelo banco desde 2005.
Na pesquisa, 71% dos aposentados dizem que os seus gastos são os mesmos ou maiores que antes. Para aqueles que viram o custo de vida baixar, também não houve uma redução drástica. Uma parcela muito pequena (3%) diminuiu suas despesas pela metade.
Entre aqueles que ganham menos que o esperado na aposentadoria, o motivo mais frequente é o fato de não terem planejado suficientemente a aposentadoria (47%).
A falta de preparação para a vida sem um trabalho remunerado é outra descoberta relevante da pesquisa do HSBC - e que também ajuda a entender por que o brasileiro não sabe com que idade conseguirá se aposentar. De acordo com o levantamento, dois terços dos aposentados no Brasil (67%) dizem não ter se preparado para uma aposentadoria confortável. No grupo dos aposentados que não se planejaram adequadamente, somente 17% perceberam que os preparativos haviam sido insuficientes antes de parar de trabalhar.
Pelo que indica a pesquisa, a realidade dos futuros aposentados não será muito diferente disso. Cerca de 59% das pessoas em idade ativa dizem que não estão se planejando adequadamente ou sequer estão pensando no assunto.
Para Lalia, do HSBC, a adequação do planejamento para a aposentadoria é algo complexo. O que pode ser considerado suficiente hoje, pode não ser amanhã. O resultado vai depender de uma série de fatores, como a saúde e as despesas médicas do futuro aposentado, os planos e desejos de consumo, os gastos imprevistos com dependentes e a própria longevidade. "Os aposentados atuais viveram [o ápice de] um período de transição. Viram seus pais morrerem mais cedo, aos 70 e poucos anos, e perceberam que eles devem viver mais. Alguns perceberam [esse aumento da longevidade] tarde demais", diz.
Em razão disso, o diretor afirma que, para ser adequado e eficiente, o planejamento para a aposentadoria deve ser revisado de tempos em tempos. É preciso projetar os prováveis gastos e a renda futura tendo em vista o possível tempo de vida - três elementos que tendem a mudar com o envelhecimento e a mudança de prioridades.
Entre as 15 nacionalidades pesquisadas no levantamento do HSBC, os aposentados brasileiros estão no grupo que estima que a poupança para o futuro sem trabalho vai durar menos. Eles calculam que a poupança vai durar apenas nove anos, enquanto a média dos países é de 12. É como se o cidadão se aposentasse aos 60 anos e tivesse dinheiro para se sustentar somente até os 69. Levando em consideração a expectativa de vida de homens e mulheres no Brasil, essa projeção não parece nada boa. Segundo a referência do mercado segurador brasileiro, a expectativa de vida dos homens é de 86,4 anos. As mulheres chegam, em média, aos 89,7 anos, pela tábua atuarial BR-EMS de 2010.
Uma forma que os brasileiros encontraram para driblar a preparação inadequada para a aposentadoria é continuar trabalhando - mas em um ritmo menos acelerado. É o que o relatório do HSBC chama de semiaposentadoria. Segundo o levantamento, praticamente metade daqueles que ainda trabalham já planeja uma semiaposentadoria (48%) ou já é semiaposentado (5%). Além disso, 29% das pessoas entre 55 e 64 anos já estão semiaposentadas e metade (50%) das pessoas entre 25 e 34 anos espera mudar para a semiaposentadoria antes de se aposentar integralmente.
A opção pela semiaposentadoria tem uma série de motivações e a questão financeira é apenas uma delas. Na pesquisa, 19% das pessoas afirmaram que trabalhar em tempo parcial antes de parar totalmente é uma forma de resolver a diferença na renda como aposentado. Outros 14% disseram que precisam quitar dívidas, 7% ainda têm de terminar de pagar o financiamento da casa onde moram e 6% afirmaram que precisam sustentar familiares.
Quando perguntados sobre o motivo para optar pela semiaposentadoria, a maioria dos entrevistados respondeu que gosta de trabalhar, que quer continuar com uma posição no mercado de trabalho (43%) e que quer se manter ativa (41%). "Leio esses resultados de forma muito positiva", diz Lalia, do HSBC. "O aposentado percebeu que passar a receber um benefício do INSS não significa que ele não pode continuar produzindo e colaborando para a sociedade."