Entre as necessidades mais críticas enfrentadas atualmente pelas organizações provedoras de saúde estão encontrar mecanismos para viabilizar a saúde baseada em valor e personalizar cada vez mais a experiência e satisfação do paciente. Ambas abordagens incluem algumas quebras de paradigmas, e somente através de uma mudança de cultura setorial que habilitem a adoção de tecnologia e estabeleçam a inovação como parte estratégica, terão êxito –não no futuro distante- mas em um curto espaço de tempo.
Historicamente, o setor de saúde tem demorado em relação a outros mercados, a adotar novas tecnologias, especialmente aquelas digitais que transformam a operação. Por exemplo, foi somente nos últimos anos que hospitais e consultórios médicos começaram a abandonar o antigo armazenamento em papel para registros eletrônicos de saúde (EHRs).
Em geral, há um reconhecimento de que o fornecimento de uma experiência simplificada e consistente é necessário para oferecer valor. Médicos entendem o papel cada vez mais importante da tecnologia na assistência. No entanto, mais de 75% dos médicos, segundo pesquisa americana, dizem que os registros eletrônicos de saúde aumentam os custos de prática e reduzem sua produtividade. Junto com esses obstáculos, os desafios com a implementação e os fluxos de trabalho médico muitas vezes levam a uma adoção de tecnologia de cuidados de saúde abaixo do ideal.
Se, de um lado temos idolatrada a inovação por idealizadores com mentes nas nuvens, por outro temos aqueles que a enxergam como uma verdadeira corda bamba de riscos. Isso é especialmente verdadeiro neste setor, uma vez que testar novos modelos e “falhar rápido” precisa, ironicamente, ser realizado com muita cautela, dado que o core dos provedores é manter seus usuários seguros e saudáveis.
Para dar emoção, nessa corrida existem os “Early Adopters”. Os primeiros adeptos a qualquer tecnologia provavelmente enfrentarão muito mais obstáculos, mas sairão na frente. Os retardatários, em contrapartida, podem descobrir que, à medida que novos modelos de pagamento e entrega se consolidam, eles não podem mais competir no mesmo nível, pois ficaram muito tempo “vivendo no presente” e arriscam a extinção de seus negócios.
Um estudo da Harvard Business Review Analytic Services e Verizon mostrou que os early adopters têm colhido frutos: “Apenas 27% das organizações de saúde proativamente procuram obter a inovação como vantagem, em comparação com 36% que compram novas tecnologias depois que outros provaram seus benefícios e 35% que esperam até se tornar bem estabelecido”. Segundo a pesquisa, as organizações que adotam tecnologia mais cedo têm taxas de crescimentos significantemente maiores, ano a ano, do que os seus seguidores.
A nível de organização, os CIOs das instituições são responsáveis pela avaliação da eficiência operacional de tecnologias emergentes e pelo desenho de integração da mesma desde os colaboradores até o atendimento ao paciente. Mas fica a pergunta: será que precisamos mesmo de um Chief Innovation Officer, ou podemos mudar a cultura para um Chief Integration Officer? Há indícios de que Steve Jobs concordaria com isso.
A inovação em saúde não apenas economiza dinheiro no sistema – por exemplo, a cada dólar gasto em medicamentos inovadores, há uma redução de gastos totais com saúde em US$ 7,20, mas também tem o poder de salvar vidas ou aumentar a sua expectativa. Para citar, entre 1980 e 2010, os avanços tecnológicos na medicina ajudaram a adicionar 5 anos à expectativa de vida dos americanos. É por isso que várias instituições de saúde estão planejando construir centros de inovação para impulsionar mudanças, de fato, significativas.
Um alerta importante: deve-se tomar um enorme cuidado para não desenvolver a inovação tecnológica em silos. Grandes empresas, como a Sony, Xerox e Nokia, por exemplo, já sentiram na pele as consequências. Engajamento dos colaboradores seria a palavra chave. As novidades vêm a passos largos e é necessário, ainda que de difícil prática, o acompanhamento tecnológico e horizontalizado de todos na empresa. Não há razão para se atribuir a uma só pessoa o peso de carregar a inovação de uma empresa inteira. É claro que deve-se existir um certo nível de coordenação, mas a inovação é de responsabilidade e voz de todos.
Um bom primeiro passo é engajar de forma holística os colaboradores. Um grupo técnico e clínico multidisciplinar ajuda a colocar na mesa diferentes perspectivas e prioridades no processo de brainstorming tecnológico ou mesmo adoção. Além disso, a proximidade fortalece o senso de evangelização no processo de implementação e cria um vínculo entre estratégia, objetivo e métrica.
No setor clínico, médicos, enfermeiros e outros membros da equipe de atendimento têm suas responsabilidades. Normalmente confortáveis com seus processos e rotinas, a figura do “Integrador” deve surgir como aquele que entenda a importância da qualidade e consistência no atendimento ao paciente, e ao mesmo tempo saiba como minimizar os impactos na produtividade, receita e custos, no início da curva de adoção. Se não houver essa preocupação, provedores podem enxergar a otimização com um fardo adicional (e não queremos colaboradores desmotivados, não é?)
Aliás, há uma diferença entre adoção e implementação. Muitas vezes os recursos alocados em um projeto são desproporcionais ao desafios a serem enfrentados. Se engana quem pensa que uma implementação bem sucedida é a solução. Além de não ser, ela não é isolada e nem o final do processo. A implementação é um marco centrado na tecnologia que tem pouco a ver com alcançar os resultados específicos centrados no paciente que inspiraram o projeto em primeiro lugar. Embora a implementação de novos processos, equipamentos ou cultura tecnológica, seja muito inspiradora e excitante para seus idealizadores, apenas os colaboradores podem inspirar uma verdadeira adoção na instituição. A implementação e a adoção representam dois pontos diferentes, sendo assim, eles também precisam de métricas independentes.
Se cabe aqui um conselho, cultive relacionamentos externos, que se estendam além da sua instituição e setor. É inestimável o valor para a construção do conhecimento. A exposição a novas formas de trabalho e pensamento desperta a curiosidade, o instinto de promover mudanças e translações que agreguem para a melhora setorial. É impressionante a quantidade de “zonas cinzas” que podemos ganhar com um pouco de criatividade.
O quadro geral é que podemos nos beneficiar de um sistema de saúde mais inteligente, ágil e tecnológico, um sistema que aprenda e melhore constantemente. Estamos dependentes da cultura: já temos pessoas que valorizam a mudança e, se ainda não temos a tecnologia, estamos no processo de desenvolvimento. Já dizia Peter Drucker, “a cultura come a estratégia no café”, se há o desejo de mudança, comece agora.