A recuperação judicial da Brasil Pharma, maior rede de farmácias do país em número de lojas, deve se transformar nos próximos dias em um litígio entre a atual controladora, a Lyon Capital, e o veículo de investimento dos principais sócios do banco BTG Pactual, a holding PPLA Participations - praticamente único credor financeiro e ex-dono do negócio.
Desde janeiro em recuperação judicial, a varejista levou à Justiça R$ 1,3 bilhão em compromissos, dos quais R$ 1 bilhão são dívidas com a PPLA Participations, que até abril de 2017 era sua controladora. Há R$ 120 milhões em pendências com fornecedores, em sua maioria, fabricantes de medicamentos.
A fonte central da disputa, na prática, é que ninguém parece querer ser o dono da Brasil Pharma. Após um ano como proprietária, a Lyon Capital, de Paulo Remy, ex-presidente da WTorre, quer entregar o negócio de volta à PPLA Participations, conforme fato relevante divulgado na sexta-feira.
O Valor apurou que, na própria sexta-feira, a PPLA se preparava para ir à 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais para esclarecer a situação e alegar que não vai reassumir a empresa.
A Lyon Capital, por sua vez, também deve ir ao juiz para se posicionar sobre o tema, em especial, porque vence amanhã o prazo para a apresentação de um plano de recuperação judicial para a BR Pharma.
Criada em 2010, a BR Pharma é um projeto idealizado pelo BTG Pactual e seus principais acionistas para ser uma grande consolidadora do varejo de farmácias no país. É dona das redes Sant'Ana e Big Ben, no Norte e Nordeste, e da cadeia de franquia Farmais, com unidades no Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Oito anos depois a história é bem diferente, resultando em um dos maiores fracassos recentes de gestão de negócios no país.
No fim de 2016, a PPLA decidiu que era chegado o momento de não mais colocar recursos na BR Pharma, após seis anos de tentativas de valorização da companhia. Iniciou, então, um processo competitivo para entregar a empresa a um reestruturador, oferecendo suporte financeiro. Remy saiu vitorioso das conversas, que envolveram dois outros interessados.
Antes de passar o negócio à frente, a PPLA resolveu a dívida que a companhia já detinha com bancos comerciais brasileiros e tornou-se a única credora de R$ 511 milhões em compromissos. A dívida deveria ser paga pela BR Pharma em 11 parcelas anuais, entre 2022 e 2032.
Como parte da negociação com a Lyon Capital, a PPLA também subscreveu R$ 400 milhões de uma emissão de debêntures, com a finalidade de fornecer capital de giro para que Remy tocasse a reestruturação. A Lyon assumiu a BR Pharma pelo valor simbólico de R$ 1 mil.
Formalmente, a Lyon Capital alegou, no fato relevante de sexta-feira, que o motivo para entregar a BR Pharma à PPLA é o fato desta holding ter declarado vencimento antecipado das dívidas da empresa, após o pedido de recuperação judicial. Os créditos da PPLA são garantidos por ativos da rede e pelas próprias ações da companhia. A declaração de vencimento, segundo a Lyon, levou à "consolidação da propriedade fiduciária em favor dos credores".
A holding dos sócios sêniores do BTG Pactual, por sua vez, pretende esclarecer à Justiça que a declaração de vencimento antecipado foi feita conforme as cláusulas da dívida, mas sem o pedido de execução das garantias.
Conforme fontes próximas ao caso, a disputa teria como motivação principal a tentativa da Lyon de obter mais recursos da PPLA ou do BTG Pactual. Desde o fim do ano passado, Remy tem transparecido sua frustração com a situação operacional do negócio, considerada muito pior do que supunha quando assumiu. Somente a operação cotidiana da rede consumiu, no ano passado, R$ 330 milhões, conforme o fluxo de caixa apresentado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Em janeiro, logo após as dívidas serem levadas à Justiça, a PPLA forneceu R$ 48 milhões em uma nova linha à BR Pharma - dentro do processo de recuperação - para serem usados para compromissos trabalhistas. O objetivo era que o dinheiro permitisse o encerramento de lojas para reduzir o consumo acelerado de recursos em unidades ineficientes e, desde então, 163 foram fechadas.
Quando Remy assumiu a BR Pharma, no início do ano passado, a rede da companhia abrigava 820 lojas, sendo 373 próprias, e as vendas totais somavam R$ 1,6 bilhão. O ano de 2017 foi dramático para as vendas, que totalizaram R$ 540 milhões, a despeito de a companhia ainda somar uma rede com 737 lojas - sendo 287 lojas próprias.
Listada na bolsa há quase sete anos, a BR Pharma captou mais de R$ 800 milhões em duas ofertas públicas de ações - com a abertura de capital, em 2011, e com uma colocação subsequente, no ano seguinte. Em 2013, obteve mais R$ 290 milhões, mas desta vez com emissão de debêntures.
No ano em que o BTG Pactual levou a companhia à bolsa, a BR Pharma tinha uma rede de 737 lojas, com 378 unidades próprias e receita bruta de R$ 1,14 bilhão. Exceto nos anos em que obteve dinheiro na bolsa (2011 e 2012), a varejista nunca registrou lucro com suas operações.
Na sexta-feira, a companhia fechou o pregão avaliada em pouco mais de R$ 200 milhões. Em sua estreia na bolsa, foi avaliada em R$ 1,3 bilhão. Consultados, Remy, PPLA e BTG Pactual não comentaram o assunto.