As companhias aéreas precisam acelerar os ganhos de eficiência para melhorar as margens operacionais e, assim, proporcionar maiores taxas de retorno aos aplicadores de ações e de bônus se quiserem acessar os mais de US$ 4 trilhões que o setor vai demandar em investimentos nos próximos 20 anos. Apenas no Brasil, a necessidade de recursos atinge R$ 36 bilhões até 2020, apontam executivos de empresas, analistas financeiros e consultores especialistas.
Segundo estudo feito pela McKinsey para a Associação Internacional do Transporte Aéreo (Iata), o grupo das 61 maiores companhias aéreas no mundo apresentou entre 2004 e 2011 a menor taxa média de retorno a donos de ações e títulos de dívida de empresas aéreas, em um universo composto por 29 setores da transformação industrial. As aéreas deram um retorno líquido de 4,1%; o setor de software e as farmacêuticas, 20%, as produtoras de bebidas, 18%, e os fabricantes de aviões, 11,5%.
"Entre 2004 e 2001, a taxa do setor evoluiu em relação ao período entre 1996 e 2004, mas ainda é pouco se levarmos em conta que precisamos atrair capital para investimentos necessários nos próximos anos", afirmou, recentemente, o presidente mundial da IATA, Tony Tyler.
As aéreas dão menor retorno a investidores porque as margens estão comprimidas. Em 2012, aponta a Iata, as 60 maiores empresas do mundo tiveram por passageiro receitas de US$ 228,26 e despesas de US$ 225,70 por assento - gerando lucro líquido de US$ 2,56, ou 1,1% de margem.
Dados da Economática focados nas Américas demonstram que as margens líquidas da Latam cederam de 5,15% para 0,25% entre 2002 e 2012; as da Gol, desabaram de 8% para 18,7% negativos.
E as margens recuaram porque as tarifas cederam, entre 2003 e 2012, em valores reais mais de 25%; no Brasil, 58%. "A abertura dos céus aumentou a concorrência", diz o consultor Fulvio Delicato, da Delicado Consultoria, que atende companhias como Embraer, Gol e TAM. "Nos anos de Varig, Vasp e Transbrasil as margens variavam na casa de 8%. Mas havia mercados protegidos".
Mas no mundo sem subsídios nem proteção governamental, o caminho para as empresas aéreas é assegurar ganhos de eficiência que elevem as margens operacionais, diz o sócio da KPMG, Marcelo Gonçalves. "O desafio é que parte dessas despesas não depende do gestor", diz.
O consultor técnico da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Adalberto Febeliano, estima que 50% em média representam itens da despesas que são externas ao gestor de uma companhia de aviação, citando tributos, infraestrutura aeroportuária, combustíveis e câmbio. "Esses custos são paredes removíveis pela empresa, mas que demandam muito mais esforço".
O consultor enxerga fatias de eficiência a serem capturadas no controle do tráfego aéreo e até nos processos de importação, que chegam a 5% das atuais despesas em cada um desses segmentos. "Como nossa aduana é mais lenta, temos que manter estoques mais elevados".
O consultor Fulvio Delicato diz que de 10% a 12% das despesas são passíveis de corte na manutenção. O diretor da Iata no Brasil, Carlos Ebner, observa que há ganhos de eficiência no país se os investimentos projetados pelo governo nos aeroportos, superiores a R$ 7,2 bilhões até 2015, se confirmarem. O executivo acredita ainda que há ganhos de eficiência que virão de consolidação, como sinalizam as operações entre Azul e Trip, ou entre Gol e Webjet.
O vice presidente comercial e de marketing da Avianca, Tarcisio Gargioni, diz que os ganhos estão no solo. "O aperfeiçoamento de rotas faz com que o avião não precise ficar dando voltas por falta de espaço no pátio, economizando combustível".
É que o querosene de aviação (QAV) responde por cerca de 40% das despesas de uma aérea. Por isso, o analista do setor aéreo do Banco do Brasil Investimentos (BB Investimentos), Mário Bernardes Jr. duvida que o horizonte mude para o setor no médio prazo em termos de rentabilidade. "Não vejo companhia aérea alcançando margem líquida maior que 4% se não houver mudança no cenário do preço do petróleo", diz, referindo-se à commoditie que se valorizou 150% desde 2003.
As aéreas dão menor retorno a investidores porque as margens estão comprimidas; a eficiência, então, precisa crescer
"As empresas então buscam reduzir custos por meio do corte da oferta para elevar a taxa de ocupação", diz o analista do BB Investimentos. Para este ano, a Gol projeta melhorar a margem à uma faixa entre 1% e 3%, enquanto a Latam fechou o primeiro trimestre com ganho líquido de 3,4%. Mas ambas estão reduzindo a disponibilidade de assentos, em até 11% neste ano, na comparação com a oferta de 2012.
O ponto é que essa estratégia é incompatível com os planos de longo prazo do setor. A Iata promete ao menos triplicar a oferta de rotas mundiais - hoje em mais de 15 mil destinos - para atender à necessidade global por viagens aéreas, especialmente por causa da demanda de mercados emergentes. O que vai gerar compras de 20 mil aeronaves até 2031, incluindo aquelas unidades de substituição.
No Brasil, a Abear calcula em 526 aviões a mais na atual frota de 450 unidades a demanda estimada para atender os 211 milhões de passageiros a serem transportados em 2020.
O setor conta com as linhas de financiamento abertas pelas fabricantes e provedoras de leasing como parte relevante de fontes de recursos que vão bancar essa expansão, ao lado das linhas de crédito de bancos de desenvolvimento, como o BNDES. Mas as emissões de ações e de títulos de dívida terão que responder por mais de um terço da demanda de financiamento.
"O investidor vai olhar cada caso, cada empresa na hora de escolher comprar uma ação ou bond", diz Gargioni, da Avianca, que promete investir R$ 2,7 bilhões entre 2010 e 2015.
Neste ano, a Latam vai captar US$ 1 bilhão nos mercados acionários do Chile, dos Estados Unidos e do Brasil. A oferta será feita neste trimestre. A Azul está em meio ao processo de abertura de capital e anuncia, no começo de junho, a precificação da oferta inicial de ações por meio da qual espera captar cerca de R$ 1 bilhão. E a Gol recebeu neste ano parte do capital levantado pela gestora de programa de bonificações, a Smiles, que atingiu R$ 1,3 bilhão.
"A companhia aérea vai ter que gerar caixa para deixar o investidor confortável na hora de captar recursos", diz o analista do BB Investimentos. "Sem gerar caixa, o desafio será maior ainda".
O diretor da Iata no Brasil, Carlos Ebner, chama atenção ainda para dois vetores que vão influenciar o acesso à recurso e os custos de captação das aéreas: liquidez e consolidação do setor.
Para Ebner, se os bancos centrais nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia não radicalizarem na retirada dos programas de estímulo financeiro hoje em vigor, haverá dinheiro em busca de ativos que rendam mais que os juros soberanos de renda fixa. "E hoje esse é o cenário que enxergamos. Então haverá sim investidor interessado em comprar ação ou títulos de aéreas".
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