Aparelhos controlados só pela mente ganham aplicações da medicina aos games
05/02/2018
Imagine conseguir que uma máquina siga os seus comandos apenas com seu pensamento - sem apertar botões, digitar ou mexer em controles remotos. Bem, esse cenário de ficção científica pode estar mais perto da realidade do que você pensa.

A vida de Bill Kochevar mudou para sempre depois de sofrer um acidente de bicicleta, há oito anos. Pedalando em alta velocidade, ele se chocou com um caminhão que havia acabado de frear.

Ficou paralisado do pescoço para baixo, passando a depender de terceiros para beber água ou se virar, por exemplo.

Mas um experimento, iniciado no ano passado, tem lhe dado mais autonomia: ele recebeu uma interface cérebro-computador, ou BCI, na sigla em inglês, que lhe permitiu mover seu braço e sua mão pela primeira vez desde o acidente.

Primeiro, sensores foram implantados em seu cérebro. Em seguida, por quatro meses Kochevar deu um "treinamento" ao sistema, pensando em movimentos específicos, como girar o pulso ou agarrar um objeto.

Os sensores aprenderam quais pedaços do cérebro se "acendiam" - e em qual sequência - para cada movimento desses.

Depois, quando 36 eletrodos de estímulo muscular foram implantados em seu braço e sua mão, Kochevar conseguiu controlar seus movimentos simplesmente pensando no que ele queria fazer.

"Essa pesquisa aumentou minha habilidade para fazer muitas coisas", ele contou à BBC no ano passado.

Essa mesma tecnologia está sendo usada no desenvolvimento de cadeiras de roda controladas pela mente e sensores que permitam a pessoas completamente paralisadas dar respostas "sim" ou "não" pelo poder do pensamento.

Transportes e jogos

Mais além das aplicações em bem-estar de pessoas com deficiência, há empresas testando o controle da mente como interface.

Um exemplo vem da montadora Nissan, que recentemente anunciou um headset "cérebro-para-veículo" que monitora o que o motorista está prestes a fazer - antes que ele o faça.

O objetivo é fazer com que o veículo responda centésimos de segundo mais rápido do que o motorista responde naturalmente.

Em uma estrada de curvas perigosas, por exemplo, essa tecnologia pode facilitar o controle do carro, diz a Nissan. Em testes, até mesmo motoristas experientes se saíram melhor usando o sistema "cérebro-para-veículo", segundo a empresa.

Enquanto isso, a empresa de realidade virtual Neurable desenvolveu um jogo de computador controlado pela mente que, segundo seus criadores, deve chegar ao público ainda neste ano. Usando um headset de realidade virtual equipado de sensores, os jogadores precisarão apenas focar seus pensamentos em um objeto para conseguir manipulá-lo, sem nenhum controle manual.

No campo das brincadeiras, a empresa EmojiMe criou fones de ouvido com leitura cerebral que exibem o estado emocional do usuário na forma de emojis animados. A invenção nasceu como uma gozação, dizem seus criadores.

E há diversos outros aparelhos de controle mental sendo desenvolvidos.

A força motriz por trás dessas pesquisas é a medicina, campo em que grandes avanços estão sendo feitos no uso do BCI.

O funcionamento dessa tecnologia se baseia na medição da atividade cerebral por meio de um eletroencefalograma quase tão sofisticado quanto o aplicado em hospitais. O aparelho identifica os minúsculos sinais elétricos produzidos quando os neurônios no cérebro se comunicam entre si.

Esses sinais incluem ondas alfa, beta, delta, teta e gama, bem como sinais variados desencadeados por estímulos visuais. Certos padrões de atividade podem ser associados a pensamentos específicos, permitindo ao sistema prever os desejos do usuário.

No caso do sistema "cérebro-para-veículo" da Nissan, isso significa monitorar os sinais associados às atividades cerebrais de preparação para os movimentos. Essas informações são, por sua vez, correlacionadas com dados colhidos do próprio veículo.

"O headset leria essa atividade preparatória e a combinaria com a informação que o veículo fornece através de sensores e mapas - por exemplo, 'há uma curva em 200 metros'", diz o porta-voz da empresa, Nick Maxfield.

"A inteligência artificial usa essa combinação entre as ondas cerebrais e o sensor de informação que entende o que precisa ser feito - por exemplo, 'há uma curva à frente e o motorista começou a pensar em dobrar - nesse ritmo, ele fará a manobra com um pouco de atraso, então vamos começar a curva agora'", completa.

Por isso, ele defende, não há chance de que um acidente seja causado simplesmente porque alguém pensa em mudar de direção ou em frear.

A Neurable, que desenvolveu o primeiro jogo do tipo arcade controlado pela mente, afirma que seu sistema é a plataforma de BCI mais rápida e não invasiva e a mais precisa em descobrir o que o usuário deseja fazer, graças ao sistema de aprendizado automático usado na máquina.

Seu headset interpreta diferentes padrões das ondas cerebrais, análise conhecida como "potenciais de eventos relacionados" (ERP, na sigla em inglês), para prever quando o jogador quer agir.

"O ERP é uma resposta do cérebro que ocorre em situações em que há seleção de alvos, como um botão, um objeto, por exemplo", diz o fundador e presidente da companhia, Ramses Alcaide, acrescentando que essa resposta se aplica a qualquer mudança, esteja o objeto em movimento, piscando ou emitindo sons.

"Nós potencializamos essa resposta para dar aos usuários controle equivalente ao que ele teria se usasse um mouse de computador controlado pela mente".

A empresa apresentou o sistema ao mercado através do "Awakening", um jogo de realidade virtual desenvolvido em parceria com a eStudiofuture. O game, à semelhança da série do Netflix Stranger Things, envolve crianças com poderes telepáticos que escapam de situações de perigo manipulando objetos e lutando contra inimigos apenas com os pensamentos.

A Neurable lançou um kit que permite que outros desenvolvedores de jogos usem a tecnologia, e diz esperar que sensores cerebrais eventualmente se tornem um padrão nos headsets de realidade virtual.

O que vem pela frente

Quando se fala de controle de máquinas e aparelhos pela mente, as companhias de tecnologia estão pensando grande para o futuro.

O Facebook e outras empresas estão no estágio inicial de desenvolvimento do que seria a "linguagem silenciosa", que permitiria aos usuários digitar palavras apenas pensando nelas.

A Microsoft, enquanto isso, entrou recentemente com pedido de patente para um sistema de aprendizado de máquinas que utilizaria ondas de eletroencefalograma para iniciar e controlar programas no computador.

Um aspecto que está contendo usos ainda mais sofisticados da tecnologia é a necessidade do uso de eletrodos externos, sobre a cabeça. Implantes cerebrais são caros e arriscados, o que os faz com que eles sejam mais adequados às aplicações relacionadas à saúde.

"Interfaces cérebro-computador mais invasivas são usadas em experimentos com pessoas com deficiências graves", diz Alcaide, "e há ainda um longo caminho antes que possamos chegar ao futuro em que as pessoas usarão esses dispositivos para se divertir."
Fonte: BBC




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