A procura por uma alimentação mais saudável para evitar ou combater problemas como sobrepeso e diabetes, as maiores preocupações ambientais e com o sofrimento imposto aos animais de corte e cobaias são fatores que estão impulsionando o mercado vegetariano e vegano no Brasil. As estimativas são de que cerca de 16 milhões de brasileiros já abraçaram alguma dessas correntes, que determinam o que cada um coloca no prato, o que veste e calça e até os produtos de higiene e beleza que utiliza.
É uma quantidade respeitável de consumidores, equivalente à população do Estado do Rio de Janeiro, estimada pelo IBGE em 16,7 milhões de pessoas. Do número total, conforme projeções da Nielsen e da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), 10 milhões a 11 milhões seriam vegetarianos, que em alguns casos admitem ovos e laticínios na dieta. Outros 5 milhões a 6 milhões formariam o público vegano, que não consome produtos de origem animal ou obtidos a partir de processos que provocam sofrimento.
Já em 2012, uma pesquisa do Ibope indicava que 8% da população das principais capitais e regiões metropolitanas brasileiras se declaravam vegetarianos, mas ainda não existem dados precisos sobre quanto dinheiro circula nesse mercado. Quem atua no segmento entende que ele é promissor, até porque o público não se limita aos exclusivamente vegetarianos ou veganos e inclui os consumidores que abrem mão de comer carne um dia ou mais por semana por questões de saúde.
No setor de cosméticos, a proprietária da Alva Brasil, importadora da marca alemã Alva Naturkosmetik, Ananda Boschilia, estima que os produtos veganos correspondam a 0,1% do mercado no país, que somou R$ 45 bilhões em 2016, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). Seriam aproximadamente R$ 45 milhões anuais, mas daqui a uma década a empresária acredita que a participação pode chegar a 0,5%, como já ocorre na Alemanha.
O mesmo apelo já alcançou até a indústria de calçados. De acordo com a consultoria IEMI Inteligência de Mercado, quase 8% da produção brasileira do setor - o equivalente a pouco mais de 70 milhões de pares por ano - utiliza matérias-primas vegetais e recicladas.
Para o analista líder da indústria de alimentos da Nielsen Brasil, Domênico Filho, a expansão do vegetarianismo e do veganismo segue a tendência de crescimento do número de consumidores que buscam uma dieta mais saudável, com alimentos naturais, com baixos teores de sódio e gorduras e sem açúcares. "A saúde está entre as três maiores preocupações dos brasileiros", afirma. Os mais idosos preocupam-se por necessidade e os mais jovens, pelo culto ao corpo, acrescenta.
Uma pesquisa da Nielsen de outubro do ano passado revelou que 5% dos brasileiros declaram-se vegetarianos e 3%, veganos, enquanto 8% são flexitarianos, aqueles que dão preferência a produtos vegetais, mas ocasionalmente também comem proteína animal.
O mesmo levantamento mostrou que pode ser bem lucrativo investir para atender esse pessoal, pois 66% dos consumidores do país estariam dispostos a pagar mais caro por alimentos e bebidas sem ingredientes considerados "indesejáveis".
A pesquisa da Nielsen apurou ainda que 64% dos brasileiros estão apenas parcialmente satisfeitos, ou até mesmo insatisfeitos, com a oferta de produtos saudáveis no mercado, lembra Domênico. Por isso, na opinião dele, uma disponibilidade maior de alimentos vegetarianos e veganos estimularia a ampliação do público que abraça essas dietas.
O presidente da Sociedade Vegetariana Brasileira, Ricardo Laurino, entende que o número de adeptos e de "simpatizantes" desse tipo de alimentação cresce por três motivos. Primeiro, porque as redes sociais revelam as crueldades cometidas contra os animais. Além disso, mais e mais pesquisas atestam as vantagens de se consumir vegetais e as pessoas começam a perceber que a produção de alimentos de origem animal é ambientalmente insustentável, seja pelo elevado consumo de água, seja pelo volume de emissões de gases do efeito estufa, explica.
A procura pelo "selo vegano" emitido pela entidade reflete essa tendência, diz Laurino. Segundo ele, o número de produtos certificados saltou de 24 em 2013 para 330 em agosto deste ano e deve chegar a 400 até dezembro. São itens de mais de 40 marcas de todo o país, principalmente alimentos e cosméticos. Pelas estimativas da SVB, o Brasil tem 16 milhões de vegetarianos e dentro deste universo estariam 5 milhões de veganos.
Conforme a professora da Faculdade de Farmácia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Temis Furlanetto Corte, os cosméticos veganos não perdem em qualidade e eficácia para os concorrentes convencionais, graças ao aumento da oferta de matérias-primas de origem vegetal. Segundo ela, os produtos ainda entram em um nicho formado por consumidores mais conscientes e, em geral, de maior poder aquisitivo, mas tendem a ganhar mercado com o aumento gradual da escala de produção e a provável queda de preços no futuro.