O segredo da transformação digital
29/09/2017
A transformação digital avança aceleradamente pelo mundo globalizado, onde países buscam mais eficiência, produtividade e transparência para governos e economia. Muitos países têm sido bem sucedidos nessa transição, onde as tecnologias digitais tornam serviços públicos mais eficientes e empresas mais competitivas, gerando mais produtividade para a economia. Uma pergunta que interessa de perto a nós brasileiros é: quais são as estratégias adotadas por outros países para avançarem na modernização digital? Quais são seus segredos?

Um relatório recente, publicado pelo Fórum Econômico Mundial, analisa as estratégicas adotadas por 17 países para a construção de suas economias digitais, cobrindo desde pequenos países como CIngapura, Suíça e Estônia, até grandes economias, como Alemanha, Reino Unido e Japão. Afinal, quais são as receitas seguidas por esses países, que hoje brilham com serviços públicos de qualidade, menos burocracia, economias competitivas e governos eficientes?

Antes de analisarmos as condições de outros países, cabe ressaltar que a transição digital produz melhores resultados quando ocorre em países com ambientes de negócios atraentes para empresas e adequados à inovação. Para aproveitar ao máximo a transformação digital, são necessárias estruturas regulatórias adequadas, instituições ágeis e recursos humanos qualificados.

A condição mais marcante encontrada nos países que avançaram com sucesso na transformação digital é a existência de lideranças políticas comprometidas com o processo de modernização do país. O comprometimento político implica também compromissos de investimentos de médio prazo por parte do governo. Outra condição encontrada em vários países é a existência de uma estratégia clara de desenvolvimento digital, acompanhada de uma estrutura de alto nível no governo para sua coordenação. Em geral as estratégias de desenvolvimento digital transcendem os setores de tecnologia e abarcam diferentes setores da sociedade e da economia. No caso da Alemanha por exemplo, parte da estratégia digital tem o foco nas pequenas e médias empresas através da agenda "indústria 4.0''.

Um terceiro ponto comum a quase todos países é o desenvolvimento de parcerias público-privadas, capazes de acelerar resultados sócio econômicos positivos e atacar problemas de infraestrutura de acesso à internet. Isso ocorreu não só em países em desenvolvimento como Colômbia, Quênia e Ruanda, mas também em economias avançadas, como Cingapura, Reino Unido e Japão.

Embora sejam países pequenos em termos populacionais, Estônia e Cingapura são dois exemplos notáveis. A Estônia começou a implementar as tecnologias digitais no final da década de 1990 na prestação de serviços governamentais. Ao longo do tempo, o uso das tecnologias digitais tornou-se um diferenciador chave e um pilar central da economia e da estratégia nacional da Estônia.

Um dos principais fatores de sucesso da Estônia para acelerar os serviços governamentais foi a adoção da concepção de governo como uma plataforma comum para toda a economia. Isso se traduz na adoção de serviços seguros e dados compartilhados por todos os setores nacionais, públicos e privados. Outro exemplo que chama a atenção é a identidade digital nacional, construída através de um modelo de parceria com o setor privado.

A identidade, segura e autenticada, é direito fundamental de todos os cidadãos da Estônia. Os hospitais emitem certificados de nascimento digitais antes que os recém-nascidos cheguem em casa e seu seguro de saúde começa automaticamente. Todos os residentes da Estônia de 15 anos ou mais possuem cartões de identificação eletrônica, que são usados em serviços de saúde, bancos e compras. Com a identificação digital nacional da Estônia, os indivíduos podem assinar contratos, criptografar e-mails e até mesmo votar.

Tudo isso leva a uma redução drástica de burocracia e do custo do governo. Por exemplo, a declaração de impostos anuais pode ser preenchida em menos de uma hora e o pagamento da restituição ocorre dentro de 48 horas.

Grandes países populacionais também buscam o desenvolvimento digital. No final de 2009, a Índia criou o Aadhaar, seu programa de identificação, que fornece identidade única para cada cidadão. O governo já emitiu identidades para mais de 1,15 bilhão de residentes na Índia. Aadhaar é um sistema de identidade digital baseada em dados biométricos. Com isso o governo, criou uma infraestrutura de identidade digital de modo que o próprio governo e setor privado transformem os serviços e benefícios voltados para o cidadão e proporcionem plataformas inovadoras para transações digitais. A coordenação do programa foi colocada no gabinete do Primeiro Ministro, que lidera o processo de transformação digital da Índia.

Investimentos em ciência e tecnologia acompanham as estratégias de vários países, como Quênia, Costa Rica, Austrália, Reino Unido e Alemanha. Israel tem uma estratégia avançada e ambiciosa para a segurança do ciberespaço e para seu aproveitamento econômico, através da pesquisa, desenvolvimento tecnológico e formação de recursos humanos. Isso tanto atende as necessidades operacionais de defesa de Israel, quanto cria oportunidades para as empresas de segurança do país.

O Brasil, por sua vez, não apresenta o conjunto de condições apropriadas para uma acelerada transformação digital. Mas precisa começar já essa jornada. O governo e os políticos podem certamente se beneficiar das experiências de países bem sucedidos, para lançar uma estratégia digital ambiciosa, factível e duradoura, com foco nos serviços aos cidadãos e na modernização da economia. É o ingresso necessário para competir no século 21.

Virgilio Almeida é professor associado ao Berkman Klein Center na Universidade de Harvard e foi secretário de política de informática no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação de 2011-2015.
Fonte: Valor




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