Poucas coisas são tão imutáveis no Brasil quanto o tamanho da grande fatia que os 1% mais ricos da população concentram da renda nacional, indica estudo do pesquisador Pedro Ferreira de Souza, doutor em Sociologia e pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) na área de desigualdade e pobreza, na sua tese de doutorado publicada no ano passado.
Nos anos 30, o grupo já abocanhava 24,3% da renda nacional; nos anos 70, continuavam a se apropriar de 24,6%. Pouco mudou no período de 2010-2015, quando a fração média recebida pelo 1% mais rico no Brasil continua em 23,2%. "As comparações corroboram que o Brasil é um dos países com maior concentração no topo", afirma Souza no trabalho "A desigualdade vista do topo: a concentração de renda entre os ricos no Brasil, 1926-2013", sua tese de doutorado publicada em 2016.
Dados levantados por Souza indicam que o 1% mais rico recebe em torno de 23% da renda total, parcela maior até mesmo que a apropriada pelo topo em países muito desiguais, como Estados Unidos e Colômbia, onde esse percentual fica em torno de 20%. Em países mais igualitários, como França e Japão, tal fatia não ultrapassa os 10%.
Os dados mostram também que o grupo mais rico do Brasil é bem heterogêneo, abrangendo desde a "classe média assalariada" até os muito privilegiados. No que diz respeito à renda média, em 2013, o segmento 0,1% mais rico da população brasileira recebia pouco mais de R$ 2,8 milhões anuais, o que equivale a uma renda média mensal de quase R$ 235 mil. "Esses valores são quase 4,5 vezes maiores do que os observados para o 1% mais rico como um todo, que no entanto, também teve rendimentos muito elevados: R$ 636 mil por ano ou R$ 53 mil
mensais", afirma o estudo.
A distância entre o topo 0,1% e os 10% mais ricos também é enorme. Quando se olha para o décimo mais rico, próprios valores médios se tornam mais próximos da experiência cotidiana do que muitas vezes se chama de "classe média assalariada". Pedro Souza também destaca em seu levantamento que, no país, há muita diferença em definir os "ricos" como o 0,01% ou os 15% mais ricos da população adulta. Em 2013, o 0,01% mais rico representava 140 mil pessoas; já os 15% mais ricos eram mais de 21 milhões.
As médias de R$ 230 mil anuais (R$ 19 mil mensais) para os 5% e de R$ 140 mil anuais (R$ 12 mil mensais) para os 10% mais ricos são compatíveis com os salários de grandes contingentes do funcionalismo público federal, exemplifica o estudo. "Grosso modo, o centésimo mais rico vive em condições muito diferentes dos estratos mais abaixo e, mesmo dentro desse estrato, o 0,1% desfruta de uma situação ainda mais privilegiada".
O nível de concentração da renda nas mãos dos mais ricos brasileiros é definida como "impressionante" também pelo economista e pesquisador Marc Morgan, do World Wealth and Income Database, que também fez suas estimativas para a fração mais rica. "A concentração de renda no topo é impressionante, com a fração do 1% chegando a 28% em 2015, de uma fatia de 25% em 2001", diz.