Convencer empregados e gestores de que a transformação digital vale a pena e que, no fim, ela vem para facilitar e não complicar ainda mais o dia a dia no trabalho, é hoje uma das principais missões dos executivos da área de recursos humanos das maiores empresas do mundo. A tarefa não é simples, mas é preciso tentar, uma vez que a falta de engajamento dos profissionais na adoção de novas ferramentas pode colocar em risco todo o processo. A compra dos mais avançados recursos tecnológicos, sozinha, não garante resultados e a desejada redução de custos.

Esse foi um dos temas abordados na edição 2017 do Success Connect, evento promovido pela SAP, que reuniu 3,4 mil executivos da área de gestão de recursos humanos em Las Vegas, nos EUA, para ouvir especialistas, professores e trocar experiências. "Você não força as pessoas a se engajarem, os líderes é que precisam dar condições para que esse comprometimento aconteça", diz Ray Wang, fundador e CEO da Constellation Research, consultoria do Vale do Silício, e autor do livro "Disrupting Digital Business", publicado pela Harvard Business Review Press.

A principal barreira para as transformações digitais, segundo o consultor, é o medo. "As pessoas temem que seus empregos desapareçam em dois ou três anos, por isso elas precisam de um bom líder no topo para guiá-las e um conselho de administração que apoie as ações dele", afirma. O trabalho, segundo Wang, deve ser orquestrado com a presença de um diretor digital no conselho que olhe para o futuro, um financeiro que dê suporte aos novos modelos de negócio, um de tecnologia que adapte e promova conexões na empresa, um de marketing que entenda de design e de novos produtos e um de recursos humanos que saiba contratar as pessoas certas e que promova um ambiente de inclusão. "O processo dá certo quando o digital nos permite sermos nós mesmos", diz.

"É preciso criar uma conexão verdadeira, antecipar o que as pessoas precisam", disse em sua apresentação Jennifer Morgan, copresidente da área global de operações para clientes e membro do conselho executivo da SAP, que hoje emprega 87 mil pessoas, com atuação em mais de 130 países. Ela lembrou que a implementação de uma nova cultura leva tempo e que o processo exige foco. "É preciso cuidar do lado humano e da tecnologia ao mesmo tempo."

A professora da Harvard Business School Frances Frei acredita que para poder promover transformações como a digital nas organizações é preciso construir relações de confiança. "Se conseguirmos mudar a maneira como as pessoas pensam podemos influenciar o seu comportamento", afirma. A habilidade de influenciar, para ela, é o que diferencia os bons gestores de equipes.

Em sua apresentação, Frances falou sobre sua chegada ao Uber este ano. A professora assumiu o cargo de vice-presidente sênior de liderança e estratégia, após a grave crise de reputação da empresa que culminou com a renúncia e a substituição do seu fundador e presidente. Em um ambiente onde as relações de confiança tinham sido abaladas, ela conta que foi preciso reconectar os mais de três mil gestores para que eles passassem a atuar em sintonia. "A empresa cresceu rápido, as pessoas foram promovidas mas nunca tinham sido treinadas para assumir cargos de liderança."

Treinar os gestores para que eles possam replicar com clareza a estratégia de uma mudança digital é necessário para que outros níveis da organização comecem a aderir ao processo. "É o mais importante", afirma Henry Albrecht, CEO da consultoria Limeade, especializada em engajamento.

Um estudo conduzido pela Oxford Economics e o SAP Center for Business Insight com 3,1 mil empresas, de 17 países, mostra que as 100 que conseguiram ser mais bem sucedidas na condução de sua transformação digital - 37% com faturamento acima de US$ 10 bilhões - gastaram mais que as demais oferecendo treinamentos para reciclar o conhecimento de funcionários, gestores e executivos. Elas também contrataram mais pessoas e criaram funções como a do "Chief Automation Officer", algo como um diretor de automação. A maior parte dessas 100 companhias afirma que a gestão de talentos já foi impactada pela digitalização e 80% esperam que ela mude ainda mais nos próximos dois anos.

Jana Kanyadan, diretor de tecnologia da Mohawk Industries, uma das maiores empresas de pisos e laminados, que emprega 35 mil funcionários, conta como completou com sucesso seu processo de implementação de soluções digitais para a área de gestão de pessoas. A companhia adotou todos os módulos da plataforma SAP SuccessFactors, que faz a gestão de RH na nuvem. "O segredo é oferecer para o empregado soluções fáceis e que façam sentido para o trabalho que ele faz", diz. Foram 18 meses de treinamento até adotar o sistema. "Hoje vejo que o engajamento do empregados, no geral, até aumentou", diz.

Para o responsável pela área de engenharia e operações na nuvem na SAP SucessFactors, James Harvey, os aplicativos hoje têm que ser simples para atingir todas as gerações que atuam nas empresas, mas precisam ter um design que seja atraente para os mais jovens. "Eles esperam por isso", afirma.

Não há dúvida de que a entrada dos mais jovens nas empresas têm impulsionado as companhias a iniciarem ou a acelerarem seus processos de transformação digital. Penny Stoker, líder global de serviços de RH na EY, diz que 75% dos quase dois milhões de candidatos que disputam uma vaga por ano na empresa no mundo são da nova geração e têm uma alta expectativa sobre o que vão encontrar em termos de avanços digitais. "Contratamos 6,5 mil pessoas anualmente, uma a cada 8 minutos. É muita gente", afirma.

Penny conta que para atender a esse contingente a empresa adotou soluções digitais para o processo de "onboarding". Um assistente virtual chamado "Buddy", que pode ser acionado via mobile, tira dúvidas e mostra para o novo funcionário os treinamentos disponíveis, o mapa do escritório, as pessoas que vão fornecer o equipamento do dia a dia, enfim, ensina todos os passos para que ele entenda como tudo funciona, antes mesmo de pisar no novo emprego.

Esse é apenas um exemplo das mudanças que vão transformar o trabalho no futuro. "Não precisamos mais nos desesperar com a quantidade de informação da era digital, a tecnologia vai conectar tudo para a gente", diz.