Os países que somam 70% dos infectados no mundo têm adotado medidas de combate à doença viral, segundo a OMS
“Eliminar a hepatite” foi o tema escolhido este ano para o dia internacional de combate à enfermidade, uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS). E a agência das Nações Unidas aproveitou a data de hoje para mostrar que há um comprometimento cada vez maior dos governos com a ideia. Dados globais mostram que 28 países — que representam aproximadamente 70% da carga global da doença — têm adotado medidas que podem ajudar a diminuir os altos índices de infecção. Campanhas educativas, estabelecimento de metas e o investimento no acesso universal de tratamentos são as principais ações adotadas pelas nações, incluindo o Brasil.
Segundo o levantamento, quase todos os 28 países estabeleceram comitês nacionais voltados à eliminação de hepatite — com planos e metas — e mais da metade alocou recursos financeiros para serem usados em ações voltadas ao extermínio da infecção. Além disso, quase metade das nações visa a eliminação da hepatite por meio do acesso universal ao tratamento da doença — um dos pontos ressaltados pela OMS, que reforça a importância de redução do preço dos medicamentos.
“É encorajador ver os países transformando o compromisso em ação para combater a hepatite. Identificar intervenções que têm um alto impacto é um passo fundamental para eliminar essa doença devastadora. Muitas nações conseguiram adotar a vacinação contra a hepatite B. Agora, precisamos aumentar o acesso ao diagnóstico e ao tratamento”, destaca, em comunicado, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.
Segundo Gottfried Hirnschall, diretor do Departamento de HIV e do Programa Global de Hepatite da OMS, “na melhor das hipóteses”, uma em cada 10 pessoas que vivem com hepatite sabe que está infectada e, por isso, pode recorrer ao apoio clínico. “Isso é inaceitável”, ressaltou. “Para a eliminação dessa doença se tornar uma realidade, os países precisam acelerar seus esforços e aumentar os investimentos em cuidados vitais. Simplesmente não há motivo para que milhões de pessoas ainda não tenham sido testadas para a hepatite e não possam acessar o tratamento do qual necessitam extremamente.”
Genéricos
Há cinco tipos de hepatite viral, sendo que a C — transmitida pelo vírus HCV, responsável pela inflamação do fígado — pode ser completamente curada com o uso de antivirais de ação direta durante três meses. No entanto, segundo a OMS, apenas 7% das 71 milhões de pessoas com hepatite C crônica tinham acesso aos medicamentos em 2015.
Para ampliar a quantidade de assistidos, a agência defende, além da redução do preço dos remédios, a introdução de versões genéricas dos fármacos. Nesta semana, a OMS anunciou a pré-qualificação de uma versão genérica do sofosbuvir, utilizado para o tratamento da hepatite C. Essa ação garante a qualidade e a segurança de um produto, o que permite que ele seja adquirido pela ONU.
José Ribamar Branco, infectologista da rede de hospitais São Camilo, de São Paulo, avalia que medidas que melhorem o acesso ao medicamento amenizarão um dos maiores problemas enfrentados no combate à hepatite. “O custo dos remédios ainda é alto, e isso prejudica países mais pobres. É fundamental que existam políticas que ajudem a mudar isso, com acordo entre laboratórios, por exemplo. Sabemos também que hoje é possível baratear essas fórmulas, as tecnologias têm avançado nesse sentido. Os Estados Unidos têm evoluído muito nessa área de pesquisa, por exemplo. Hoje, eles conseguem guardar remédios por muito mais tempo, sempre mantendo a eficácia”, diz.
Branco também ressalta que o Brasil tem feito sua parte no combate à doença viral, mas, para ele, muito ainda pode ser conquistado. “Temos remédios que são disponibilizados gratuitamente, assim como ocorre com o HIV, mas o atendimento e o tratamento não são os mesmos em todas regiões do país, existe uma grande desigualdade”, lamenta. “Outro ponto importante é aumentar a vacinação contra a hepatite B em crianças e também o diagnóstico de hepatite C, devido ao alto nível de contágio. Essas duas medidas juntas podem reduzir consideravelmente o número de casos. Outro ponto crucial é acabar com a reutilização de agulhas, prática que ainda ocorre em alguns locais e que a OMS tem combatido.”
“Simplesmente não há motivo para que milhões de pessoas ainda não tenham sido testadas para a hepatite e não possam acessar o tratamento do qual necessitam extremamente”, Gottfried Hirnschall, diretor do Departamento de HIV e do Programa Global de Hepatite da OMS
Para saber mais
Brasil vai ampliar tratamento
O Ministério da Saúde anunciou ontem que vai ampliar o acesso ao tratamento da hepatite viral, oferecendo o chamado tratamento inovador para todos os infectados com hepatite C, independentemente do grau de comprometimento do fígado. Isso será possível com a adoção de um modelo de compra, adotado em países como Portugal e Austrália, em que o pagamento à indústria farmacêutica é condicionado à comprovação da cura do paciente. O objetivo principal é que o valor por tratamento caia de U$ 6,9 mil para U$ 3 mil, o que possibilitará a inclusão de até três vezes mais pessoas que as atualmente atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS).
A chamada combinação 3D (ombitasvir, paritaprevir, ritonavir e dasabuvir) possibilita chance de cura superior a 90% e estará disponível nas unidades básicas de saúde, conforme solicitado pelos estados. Em 2016, o Brasil registrou 42.830 casos de hepatites virais. Dessas, 14.199 eram de hepatite B e 27.358, de hepatite C. No mesmo ano, foram registrados 2.541 óbitos em decorrência da doença, sendo 79,8% (2.028) relacionadas à hepatite C.