No dia 1º de junho foi publicada a Lei Complementar nº 157/16, que alterou a Lei Complementar nº 116/03, a "Lei Geral do ISS", e também outros normativos. Dentre os pontos modificados na legislação desse Imposto, merece destaque a regulação a respeito de onde se consideram prestados os serviços de planos de saúde, leasing e administração de cartão de crédito ou débito e outros "produtos financeiros".
A legislação nacional, neste aspecto sob a forma de lei complementar, em cumprimento ao quanto determinado pelo artigo 146, I, da Constituição, procura prevenir possíveis conflitos entre os municípios, dispondo como regra que os serviços alcançáveis pelo ISS são considerados prestados e, este imposto, devido, no local onde se situe o estabelecimento prestador ou, na falta deste, no município de domicílio do prestador. Ao lado dessa regra geral, eram previstas exceções como a da construção civil, da limpeza, do estacionamento etc., em que é possível identificar com mais segurança o local da realização efetiva das atividades e de incidência do Imposto, e do ISS sobre importação de serviços, que deve ser recolhido ao município de domicílio do tomador.
Por muitos anos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), erroneamente, diga-se, foi no sentido de afastar a mencionada regra geral, para determinar que o ISS seria devido ao município onde se desse efetivamente a realização das atividades tributáveis, em detrimento de onde fosse localizado o estabelecimento prestador, orientação que mudou nos últimos anos para, ao amparo da Lei Complementar nº 116/03, confirmar a legitimidade da regra geral de que o ISS é devido onde esteja estabelecido o prestador.
Ao longo do trâmite do Projeto de Lei nº 386, que culminou na Lei Complementar nº 157/16, o rol de exceções à regra geral sobre a qual município é devido o ISS foi acrescido das atividades indicadas anteriormente, acréscimo este vetado pelo presidente da República quando levado à sua sanção, mas depois derrubado pelo Congresso Nacional.
Na redação atual da Lei Complementar nº 116/03, nos serviços de planos de saúde, leasing e de administração de cartões e outras atividades financeiras, o ISS passa a ser devido ao município de domicílio do tomador.
Na nossa visão, o Congresso praticou um terrível equívoco com tal alteração legislativa, posto que dará lugar a um cenário de extrema insegurança jurídica para os contribuintes, a uma verdadeira batalha entre os municípios por arrecadação e, em especial quanto aos planos de saúde, absoluta inviabilidade de cumprimento das obrigações tributárias.
Especificamente no caso dos planos de saúde, diversos problemas se revelarão para viabilizar a incidência do ISS no local de domicílio do tomador dos serviços, como: Quem são os tomadores no caso dos chamados planos coletivos? De que forma se dará a verificação da base de cálculo do imposto, a qual é apurada mediante abatimento das despesas incorridas com a cobertura dos beneficiários? Enfim, uma série de problemas que não só causarão insegurança jurídica, mas que também impactarão negativamente a sociedade, seja por prováveis aumentos de custos dos planos, seja por redução das áreas de cobertura.
Sem prejuízo das questões acima, das quais voltaremos a tratar futuramente, admitindo-se que se mantenha o tratamento voltado aos planos de saúde recém-instituído, é importante comentarmos a respeito de dois outros aspectos, quais sejam, a necessidade de lei local refletindo a alteração na legislação nacional e de plena observância ao princípio da anterioridade.
A lei complementar de caráter nacional, como a que regula o ISS, tem como destinatários os legisladores das pessoas políticas, e não os jurisdicionados nem muito menos os agentes administrativos de cada uma delas. Por força do princípio da legalidade e do pacto federativo, a nova regra de localização do fato gerador do ISS direcionada a planos de saúde e às outras atividades que mencionamos anteriormente somente surtirá efeitos com relação aos jurisdicionados e agentes administrativos quando for editada lei "local" dela cuidando.
O princípio da anterioridade, quanto ao ISS, determina que a lei que o institua ou o majore não vigerá e tampouco surtirá efeitos no mesmo exercício de sua publicação nem antes de noventa dias de tal providência, a fim de evitar "surpresas" aos contribuintes.
Apesar de não se tratar de instituição do ISS sobre uma nova atividade, fato é que, até a edição de lei local instituindo o novo critério de localização do fato gerador de tal imposto, a relação das pessoas que exercem as atividades de planos de saúde e as outras sujeitas a esse novo regramento se dá com as municipalidades onde estejam estabelecidas e passará a se dar com os municípios de domicílio dos tomadores. Quanto a estes últimos, isto é, municípios de domicílio, é nítido que os prestadores aqui tratados sofrerão uma majoração de tributação, posto que esta inexistia.
Em benefício da sociedade brasileira, nosso desejo é que a matéria seja rediscutida pelo Congresso e os planos de saúde e as outras atividades alcançadas pelas mudanças aqui tratadas voltem a se sujeitar ao regramento anterior, que trazia maior segurança jurídica e já estava referendado pela jurisprudência.
Caso isto não se dê, entendemos, com convicção, que a alteração promovida pela legislação nacional somente surtirá efeitos se instituída localmente pelas leis municipais e mediante a observância do princípio da anterioridade.