Embora a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa tenha permitido um aumento na participação do segmento nas compras públicas, ainda há um enorme potencial a descoberto. E principalmente nas esferas de governo estadual e municipal, já que boa parte dos Estados e municípios ainda não implementaram por completo as regras definidas pelo governo federal.
No ano passado, o governo adquiriu R$ 15 bilhões das MPEs, segundo dados do Ministério do Planejamento com base no portal de compras do governo federal (Comprasnet). "Foram 29% dos R$ 48 bilhões passíveis de contratação junto às pequenas empresas", diz Loreni Foresti, secretária de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, responsável pelo Comprasnet.
O volume multiplicou por mais de sete desde que a lei foi implantada. Em 2006, foram R$ 2 bilhões. No ano seguinte, R$ 9,5 bilhões. Mas um levantamento realizado pelo Sebrae em conjunto com a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) indica que, só no âmbito municipal, R$ 55,3 bilhões poderiam ser destinados ao segmento das menores, caso o capítulo V da Lei Geral das MPEs, que trata do uso do poder de compras, fosse aplicado adequadamente.
O estudo cruzou dados do relatório Finanças do Brasil (Finbra), do Ministério da Fazenda, que traz despesas e receitas de cada município brasileiro, com informações extraídas pelo Sistema de Monitoramento da lei. Em 2011, dos 5,5 mil municípios do país, os 851 municípios da amostra em que foram verificadas e mensuradas as compras de pequenos negócios já haviam gasto R$ 12,7 bilhões.
"Outro detalhe é que a compra de MPEs estimula o desenvolvimento das cadeias de valor locais na razão de 1 para 1,7", destaca o gerente de unidade de desenvolvimento territorial do Sebrae, André Spínola. "O que quer dizer que o volume total movimentado entre os pequenos negócios chegou a R$ 21,6 bilhões", estima.
A questão é que há dificuldades nas duas pontas. Tanto governos quanto as pequenas empresas ainda tropeçam na relação comercial mútua. De um lado, falta a aplicação completa da lei, que prevê tratamento diferenciado aos pequenos negócios nas licitações públicas de até R$ 80 mil e lotes de 25% nas contratações e na subcontratação - de até 30% - dos grandes contratos.
O Sebrae se empenha em ações educativas e fez convênio com a Associação Nacional dos Membros dos Tribunais de Contas para intensificar a fiscalização e checar a aplicação da lei por Estados e municípios. "Multas são pedagógicas. O empresariado também pode impugnar licitações que não cumpram os itens", diz Spínola.
Para Loreni, entre as barreiras para o crescimento estão dificuldades dos próprios fornecedores. "O governo é um cliente exigente", diz. Ela acredita que uma parte do empresariado ainda é afastada pelo medo de não receber. Outra questão é que vender para o governo dá trabalho - e muito. Só que, ao contrário da iniciativa privada, onde a qualidade da entrega pode ser garantia de longevidade contratual, o fornecimento ao governo tem prazos limitados e exige renovação constante.
A agência de comunicação corporativa RP1, de São Paulo, está participando mais uma vez de licitação para tentar reconquistar a conta do Sebrae-DF, que começou a atender em 2010, sua primeira conta pública, então no valor de R$ 200 mil ao ano - agora está em jogo um total de até R$ 2,5 milhões em 60 meses de contrato.
O setor é composto por empresas de pequeno porte e começou a atender o governo em 2006. Até então, o serviço era contratado como parte do escopo das agências de propaganda, que subcontratavam as demais. Para buscar espaço, a RP1 se estruturou com unidade em Brasília e consultoria jurídica e, além do Sebrae-DF, ganhou também licitação do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Somadas, as duas representam 20% do faturamento da agência. Mas o segmento é instável. "Não há fidelidade e a movimentação política é grande", diz a presidente da agência, Claudia Rondon.
Segundo ela, além da documentação em ordem, a participação em licitação exige estrutura comercial afinada e apoio jurídico. No caso do Sebrae-DF, por exemplo, a desclassificação das vencedoras fez a RP1 subir do terceiro para o primeiro lugar do processo.
A contratação de agência especializada foi a saída de Edison Watanabe, da Edikasa, fornecedora de refeições de Londrina (PR), para apoiar sua participação em licitações. A empresa fornece lanches para a prefeitura e refeições para o Hospital Universitário e para o restaurante da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Com pagamento de uma participação ao longo do contrato, o serviço se encarrega de providenciar a documentação e de acompanhar pregões e processos. Só com o Hospital Universitário o contrato chega a R$ 1 milhão ao ano. "A vantagem é fortalecer o giro com atendimento contínuo", diz Watanabe.