Você confiaria em um robô capaz de tomar decisões sobre a sua saúde? A inteligência artificial torna-se, aos poucos, uma realidade na medicina e consegue auxiliar os médicos a diagnosticar, prescrever tratamentos, realizar pesquisas científicas e até mesmo a operar. Mas será que as pessoas estão preparadas para lidar com esse avanço? A resposta é sim. É o que revela um estudo realizado pela consultoria internacional PricewaterhouseCoopers (PwC) e obtido com exclusividade pelo site de VEJA. “Vivemos a Revolução Industrial 4.0. Há uma grande tendência de otimização da tecnologia especializada, que vai criar plataformas e poderá mudar todo o cenário econômico e social daqui para frente – inclusive o da saúde”, projeta Eliane Kihara, sócia da empresa no Brasil. De acordo com o questionário, realizado com 11.000 pessoas de 12 países da Europa, Oriente Médio e África, 55% dos entrevistados estão dispostos a substituir tratamentos convencionais por soluções com tecnologia.
O levantamento da PwC apontou que, para 36% das pessoas esse tipo de tecnologia tornaria os cuidados mais rápidos e acessíveis, 33% acreditam que os robôs garantiriam um diagnóstico mais preciso e 29% apontam que os tratamentos seriam melhores. Os resultados foram ainda mais positivos nos países em desenvolvimento. Por outro lado, os resultados mostraram que o uso da tecnologia deve ter limites. Entre os entrevistados, 47% valorizam o ‘toque humano‘ do médico durante consultas, 41% não confiam na decisão dos robôs em momentos de crises, como erros ou acidentes durante cirurgias e exames, por exemplo. Já 40% dos pacientes acreditam que apenas um médico humano saberá fazer as decisões certas, usando a intuição e a sabedoria além dos dados.
Os robôs
A tecnologia robótica voltada para a saúde é uma área em ascensão no mundo. De acordo com dados da consultoria especializada IDC, o mercado global de robôs tem crescido a uma taxa de 17% por ano, setor liderado por China e o Japão. Estima-se que a robótica focada na área da saúde crescerá 11,4 bilhões de dólares até 2020.
Conceitualmente, um robô pode ser bem diferente do que surge na imaginação da maioria das pessoas. Nem sempre sua estrutura física se assemelha a dos humanos, com um corpo feito de metal como retratam os filmes de ficção científica. Podem ser também sistemas inteligentes, capazes de interpretar e organizar dados.
É o caso do Body Logical, um software que simula o sistema fisiológico humano. Sua função é interpretar como o organismo reage a ação de um determinado remédio. Tem sido utilizado pela indústria farmacêutica na fase de desenvolvimento de medicamentos. Há também o Kaspar, um robô com tamanho e aparência de uma criança desenvolvido para treinar parentes e professores de crianças diagnosticadas com autismo. Ou ainda o Xenex, um pequeno robô que lembra o R2D2, personagem bem conhecido pelos fãs de Star Wars. Utilizado nos hospitais, ele é capaz de eliminar micro-organismos causadores de infecções hospitalares utilizando luz ultra ultravioleta.
No Japão, são comuns os robôs cuidadores de idosos. Conhecidos como Kompai robots, interagem socialmente e monitoram a saúde dos mais velhos, reduzindo a necessidade de hospitalizações. “Eles lembram os idosos de compromissos, como consultas e os horários certos para tomar os medicamentos, e evitam a solidão. Ainda, permitem conexão via vídeo com a família e com os médicos”, conta Eliane.
No Brasil, o uso da tecnologia robótica também é crescente. O país tem mais de 20 equipamentos operando em hospitais, inclusive no Sistema Único de Saúde (SUS), no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), no Instituto Nacional de Câncer (Inca), no Rio de Janeiro, e no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. No Hospital Albert Einstein, em São Paulo, o equipamento foi utilizado em em 5.641 procedimentos – 1.435 em cirurgias gástricas e 2.781 em intervenções urológicas. A técnica utilizada é conhecida como Da Vinci, um robô cirurgião controlado por um médico que maneja uma câmera e instrumentos cirúrgicos.
Desafios
É fato que os robôs conseguem realizar com perfeição as funções programadas, mas o maior desafio da indústria da tecnologia em saúde está na inteligência artificial. Na última década, houve uma explosão de informações sobre saúde, desde novos procedimentos cirúrgicos até tratamentos medicamentosos mais eficazes, dependendo da situação específica de um paciente. O problema é que esses dados não estão organizados. Calcula-se que 90% das informações médicas se perdem por não estarem disponíveis, de forma acessível, em big data. O termo descreve a possibilidade de organizar e consultar, automaticamente, qualquer informação já produzida.
Nos Estados Unidos, segundo dados da IBM, 300 milhões de dólares são desperdiçados por ano em meio a uma imensidão de dados. Essas novas plataformas inteligentes permitiriam, por exemplo, que o conhecimento fosse mais disseminado, ajudando pessoas de diversas partes do mundo.
O Watson for Health, da IBM, utiliza tecnologia cognitiva para ajudar organizações de saúde a desbloquear esses dados, muitos deles com com informações valiosas sobre diagnósticos. A plataforma é alimentada pelos próprios usuários e atua como um grande armazenador de informações coletivas – prontuários médicos, estudos de caso, registro de sintomas e tratamentos – de forma mais rápida e eficaz do que um simples computador. Além de armazenar os dados, o Watson possui inteligência para encontrar significado neles. Diferente de um cérebro humano, todas as decisões são embasadas e livres de preconceitos ou excessos de confiança, permitindo uma análise rápida e reduzindo erros de diagnóstico.
Vida monitorada
A inteligência artificial para os pacientes também é útil. São diversos aplicativos e produtos que conseguem monitorar batimentos cardíacos, a rotina de exercícios ou orientar uma dieta saudável. Há iniciativas mais complexas, como o aplicativo da Pathway Genomics, que promete fornecer “conselhos customizados” baseados nos padrões genéticos dos usuários. O aplicativo ‘Record’, da Under Armour, atua como um orientador de saúde pessoal, ao indicar uma combinação de exercícios e alimentação, que utiliza o sistema Watson for Health, da IBM.
“Em muitas situações, a presença do médico e o contato humano são imprescindíveis. Mas temos um potencial enorme ao integrar todas essas informações dentro de um sistema”, afirma Eliane.