Em sua carreira, o britânico Mark Britnell se especializou em administração na área de saúde. Ele trabalhou no setor público, foi diretor-geral do National Health Service (uma espécie de SUS do Reino Unido) e também dirigiu hospitais. Nos últimos oito anos, Britnell lidera a área de saúde da consultoria KPMG no mundo e auxilia empresas e governos a melhorar a gestão de hospitais e o atendimento a pacientes. Em entrevista a EXAME, ele falou sobre as medidas que o Brasil pode tomar para ter um sistema de saúde mais eficiente e de qualidade.
1) O senhor escreveu um livro com o título Em Busca do Sistema de Saúde Perfeito.
É possível construir um sistema de saúde assim?
Não existe um sistema de saúde perfeito. Mas acredito que cada país tem algo a ensinar e algo a aprender. Por isso, no livro descrevo 12 características dos melhores sistemas de saúde do mundo que servem de modelo. Inclusive, o Brasil tem características que são modelos para o mundo.
2) Quais são elas?
São o Programa de Saúde da Família e o Sistema Único de Saúde, o SUS. Eles ajudaram a melhorar a saúde das famílias mais pobres e até hoje são um modelo que inspira os demais países em desenvolvimento. Sei que há problemas, mas esses programas são preciosos e devem ser protegidos.
3) Apesar de o modelo ser bom, na prática a saúde pública é muito ruim. Como lidar com essa situação?
Na minha opinião, o que o Brasil precisa fazer com urgência é criar um sistema nacional de avaliação da qualidade dos hospitais públicos e privados. Ao medir a qualidade, é possível definir metas para melhorar o atendimento.
4) Cabe ao governo definir o padrão de qualidade?
Sim. O setor privado e os médicos devem ser consultados para definir quais são os padrões de qualidade. Mas o governo deve ser o principal mantenedor.
5) Algum país já teve êxito com uma medida assim?
Sim, o Reino Unido. Lá existe uma agência independente chamada National Institute for Health and Care Excellence, que monitora os hospitais e busca padronizar a qualidade do atendimento em todo o país. É algo que pode ser adaptado e aplicado no Brasil também.
6) Quais são as barreiras para adotar esse sistema?
Muitos diriam que é a falta de financiamento público. É verdade. Fica difícil atingir altos níveis de qualidade quando falta dinheiro para a compra de remédios ou de material. Mas, para mim, a falta de recurso não deve ser um impedimento para melhorar a qualidade. O foco na qualidade ajuda inclusive a tornar os gastos públicos mais eficientes.
7) O que mais pode ser feito para aprimorar o sistema de saúde brasileiro?
É preciso abraçar a tecnologia e permitir consultas médicas a distância, via computador ou smartphone. Ainda há regulações que impedem o Brasil de avançar nesse campo, por causa de uma resistência dos médicos. Isso tem de acabar. É uma medida que ajudaria muito as comunidades distantes dos grandes centros, no Norte ou no Nordeste. Na índia, por exemplo, existem até call centers com médicos e enfermeiros especializados que orientam pacientes por telefone e receitam remédios. A prescrição é enviada à farmácia, e não é preciso ir a um consultório ou a um hospital. Isso reduz os custos. O Brasil poderia ter algo semelhante.