Os sistemas de informação de saúde não permitem estimar quantas internações hospitalares foram feitas em hospitais públicos e privados brasileiros em 2016.
Também não é possível saber sobre reações adversas associadas ao uso de medicamentos ou lesões causadas por acidentes de trânsito.
Embora múltiplas, as bases de dados em saúde não possuem mecanismos de integração, exigindo análises que só podem ser obtidas mediante estratégias computacionais complexas, o que dificulta a transparência, a aplicabilidade e a identificação das prioridades para prevenção e tratamento.
Para Fernando Cupertino, 58, assessor técnico do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde, há muitos dados em saúde no Brasil, mas estes nem sempre podem ser diretamente utilizados pelos gestores.
Cupertino diz que, embora o SUS tenha gestão compartilhada entre União, Estados e municípios, há sempre uma tendência do gestor federal em subordinar as demais esferas na organização do sistema, o que se reflete na falta de disponibilidade e de utilidade dos sistemas de informação.
Ainda que disponíveis na internet, os sistemas não permitem calcular a taxa de mortalidade ou o tempo de permanência nos hospitais. O público tem acesso a esses dados nos EUA e na Inglaterra, por exemplo.
Criados para o pagamento das internações e dos procedimentos médicos, os sistemas nem mesmo permitem conhecer o número de internações, pois um mesmo paciente pode ter dois ou mais registros durante um único tratamento. Essa falta de transparência dificulta a gestão dos leitos e a torna suscetível à fraude.
Segundo Armando de Negri Filho, 55, gestor do Laboratório de Inovações em Planejamento e Gestão do Hospital do Coração de São Paulo, a ausência de dados sobre número de leitos, desempenho e porte dos hospitais públicos e privados impede adequada avaliação da assistência prestada no Brasil.
A análise de grandes volumes de dados (“big data”) podem ser alternativas à falta de integração entre os sistemas de informação e a gestão na saúde. Essa é a proposta do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs), da Fundação Oswaldo Cruz na Bahia, criado em dezembro de 2016.
Segundo o pesquisador Maurício Lima Barreto, 62, coordenador do Cidacs, estratégias de “big data” oferecerem respostas confiáveis na avaliação do impacto de políticas públicas.
Barreto cita o estudo associando, entre 2004 e 2009, a implantação do Programa Bolsa Família com a redução dos óbitos em crianças de até cinco anos de idade.
A pesquisa reuniu dados do Cadastro Único para programas sociais do governo federal e de mortalidade e apontou que o programa resultou na redução em 65% dos casos de morte de crianças por desnutrição e em 53% por diarreia.
O Cidacs quer, agora, usando a base de dados da Anvisa, investigar os efeitos de longo prazo da infecção pelo vírus zika e as reações adversas a medicamentos.
Barreto discorda quanto à má qualidade dos dados em saúde no Brasil. Para ele, o sistema melhorou muito nos últimos 20 anos e não deixa a desejar em relação a outros países. Mas precisa ser melhor compreendido.
Já Cupertino sustenta que o SUS foi “muito bem pensado” quando da sua criação, mas necessita atualizações.
Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até a conclusão desta edição.