As operadoras de planos de saúde reclamam dos altos gastos com internações, consultas e do excesso de procedimentos realizados. Do outro lado, os clientes se dizem insatisfeitos com a qualidade dos atendimentos médicos e do alto custo das mensalidades. Para a solução do impasse, uma série de iniciativas está sendo executada pelas empresas do segmento. A principal delas é o foco na qualidade do atendimento ao paciente, com a redução no volume de procedimentos realizados.
“A ideia é que, por meio de uma avaliação mais atenciosa na primeira consulta e diagnóstico correto do problema do paciente, haverá o encaminhamento adequado dele a um especialista médico, sem desperdício de seu tempo e de recursos”, explica Marcio Coriolano, presidente da Bradesco Saúde e da Mediservice.
Um encontro, realizado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em maio passado, com gestores e especialistas em saúde, apontou como medida imprescindível e urgente a adoção de novos modelos de pagamento dos prestadores, que tenham o usuário como centro das ações de saúde (patient centered), em vez do foco no pagamento por volume de procedimentos ou serviços (fee-for-service).
A partir dessa recente linha de raciocínio, as operadoras de planos de saúde terão que encontrar o caminho para combinar a satisfação do cliente com o equilíbrio das contas. Dados do primeiro trimestre de 2016 mostram que para cada R$ 100 recebidos, o setor de planos de saúde gastou R$ 99,3, incluindo despesas assistenciais, impostos, comercialização e taxas administrativas. Os custos altos são um desafio para a gestão das empresas do setor”, afirma José Cechin, diretor-executivo da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde).
O ponto central é que, para investir em gestão e tecnologia na área da saúde, é preciso ter capacidade financeira. “Com a atual margem em torno de 0,6 de lucro, não dá para o setor de saúde sobreviver”, diz Pedro Ramos, diretor da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge).
A perspectiva é de que a condução correta do problema de saúde de cada paciente também contribua para a redução do número de sinistros. Cada utilização do plano de saúde é contada como um sinistro. Os dados do ranking de Valor 1000 mostram que os sinistros das operadoras aumentaram, em média, 17% no ano passado, ao passar de 23,8 bilhões em 2014 para 28,1 bilhões em 2015.
No mesmo período, a receita (prêmio) das mesmas operadoras cresceu também 17%, por conta do reajuste das mensalidades dos planos, atualizado pela inflação médica do setor, em um momento de queda no número de beneficiários na maior parte das operadoras. O último reajuste anual, com base na inflação médica do setor, ficou em 19%. O aumento exacerbado no preço das mensalidades dos planos desagrada não só as pessoas físicas, mas também as empresas que contratam o produto como benefício para seus funcionários. Os planos coletivos empresariais representam 66,4% do total dos planos de saúde.
No primeiro semestre de 2016, segundo dados da FenaSaúde, mais de 910 mil pessoas tiveram o vínculo encerrado com as operadoras de planos de saúde. Acabaram perdendo mais clientes aquelas operadoras que concentram a sua carteira em planos corporativos contratados por empresas de grande porte. Em dezembro de 2014, havia 50,3 milhões de vínculos de pessoas às operadoras de planos de saúde. Após um ano, 49,3 milhões. Em junho de 2016, o segmento registrava 48,4 milhões. “Espera-se que a saúde suplementar comece a registrar o retorno do equilíbrio em 2017, à medida que os beneficiários recuperem seus empregos e o poder aquisitivo”, explica Cechin, da FenaSaúde.
Por enquanto, com a eliminação de postos de trabalho, mais pessoas estão partindo para a jornada independente, aumentando o número de empresas de pequeno porte. Ainda assim, o crescimento desse segmento não tem sido suficiente para compensar a redução de clientes nas grandes empresas com a demissão de funcionários.
Além da qualidade na avaliação do problema do paciente, outras iniciativas para a redução dos custos internos nas operadoras estão sendo colocadas em prática, de modo independente. Algumas adotaram a coparticipação em que o consumidor paga pequenas taxas ao realizar exames e consultas. E mais uma forma de o beneficiário perceber os custos da atenção à saúde e a usar o plano de forma mais criteriosa e com parcimônia, pois se torna corresponsável, de fato, pelas despesas assistenciais.
Segundo a Abramge, 30% dos resultados dos exames realizados não são retirados ou acessados na internet. De cada dez consultas marcadas, em 3,5 delas não haverá paciente porque eles não aparecem. Sem contar procedimentos cirúrgicos realizados desnecessariamente, como no caso das próteses e órteses, que foi alvo de denúncias em 2015. Para acabar com esse desperdício, programas de acompanhamento que mantêm usuários dos planos no centro das ações de saúde já estão avançando em muitas operadoras.
A Bradesco Saúde está expandindo sua rede de clínicas médicas chamada Nova Med. Cada clínica vai prestar atendimento ambulatorial primário em várias especialidades médicas, consultas, exames de apoio diagnóstico e procedimentos cirúrgicos ambulatoriais. Hoje, são duas unidades em São Paulo, mas o objetivo é ter 40 unidades em todo o Brasil. A intenção é expandir a rede de clínicas para articulá-las com a rede de hospitais.
Em 2015, a Bradesco Saúde e a Mediservice apresentaram, em conjunto, faturamento superior a R$ 18 bilhões, crescimento de 21,9% em relação ao ano anterior. No primeiro semestre de 2016, a alta foi de 17,1% em relação ao mesmo período do ano passado.
Para Maurício Lopes, vice-presidente de Saúde e Odonto da SulAmérica, as iniciativas de acompanhamento e prevenção de doenças têm o objetivo de avaliar o bem- estar do paciente por inteiro: físico, emocional, profissional, social e financeiro. Para isso, em 2015, a SulAmérica anunciou uma parceria com a americana Healthways, maior provedora independente de soluções em saúde e bem-estar do mundo.
Somente em 2015, a SulAmérica investiu R$ 70 milhões em programas para diabetes, colesterol, doenças pulmonares, envelhecimento, emagrecimento. Em 2016, começaram os programas de especialidades artritereumatoide, oncologia, hepatite C e doenças hepáticas.
A carteira de segurados de planos de saúde e odontológicos da SulAmérica cresceu 6,4% em 2015, totalizando 2,8 milhões de clientes, ante 2,6 milhões em 2014. Desse total, 830 mil correspondem ao segmento odontológico.
A Amil, por meio de uma diretoria exclusiva, criou o “Clube Vida de Saúde”. Nesse espaço, são realizados atividades e debates sobre prevenção de doenças. Os clientes ainda contam com um site exclusivo com o histórico de informações pessoais que pode ser acessado pelos agentes de saúde e médico de família que acompanha o paciente. No início deste ano, foram criadas unidades do “Clube Vida de Saúde” no Rio de Janeiro e em São Paulo. Atualmente, funcionam 12.
A Amil registrou aumento da receita (prêmios) em 14% nos planos de saúde, enquanto que o número de beneficiários caiu para 4,8%, tanto no segmento de saúde como no odontológico em 2015. “Por conta da praticidade, as empresas acabam contratando o plano de saúde e o odontológico”, diz Erwin Kleuser, diretor da empresa.
Com foco também no trabalho preventivo, a operadora NotreDame Intermédica acompanha grupos de doenças cardíacas, diabetes, hipertensão, asma, entre outros. Em 2014 e 2015, foram promovidos 9 mil palestras e encontros com grupos terapêuticos. Um trabalho preventivo iniciado há, pelo menos, dois anos com as gestantes do Grupo NotreDame Intermédica já aponta alguns resultados. O volume de internação em UTI neonatal diminuiu em 41%. A expectativa é de crescer na casa de dois dígitos em número de beneficiários em 2016. “Estamos avançando muito nas pequenas empresas, o que tem compensado a perda registrada em algumas empresas”, afirma o presidente do Grupo NotreDame Intermédica, Irlau Machado Filho.
A perspectiva de faturamento para o ramo de planos de saúde na Unimed Seguros em 2016 é de aproximadamente R$ 2,1 bilhões, o que significa empatar com 2014. Segundo o presidente da empresa, Helton Freitas, em 2015 houve a redução na carteira de beneficiários, incluindo planos de saúde e odontológicos. Há a expectativa de aumento de 15% na receita em 2016.
A maior parte das seguradoras também oferece planos odontológicos, segmento que dobrou de tamanho nos últimos quatro a nos com 21,9 milhões de beneficiários, entre clientes corporativos e planos individuais.
Com a retração da economia, o mercado de planos odontológicos perdeu 52 mil beneficiários no primeiro semestre de 2016, conforme dados do Sindicato Nacional das Empresas de Odontologia de Grupo (Sinog). A perspectiva é de voltar a crescer e alcançar 22,2 milhões de beneficiários cobertos (mais de 10% da população brasileira) até o final de 2016.
Uma das principais empresas do segmento é a OdontoPrev, que, em 2015, registrou aumento contínuo de novos clientes para os planos individuais e para pequenas empresas (até 200 funcionários), compensando a perda de usuários registrada nos planos de grandes empresas, explica o diretor de Relações com Investidores do Grupo OdontoPrev José Roberto Pacheco.