Quando discutimos sobre formas de apresentação de contas hospitalares do Modelo GFACH, a melhor forma de fazer as pessoas entenderem porque pacotes sempre serão interessantes para operadoras e médicos, e nunca serão interessantes para hospitais, é comparar hospitais com restaurantes.
O Modelo descreve em detalhes diversos aspectos conflitantes na relação entre hospitais e operadoras. Vamos ficar com este conflito e esquecer o médico: se existe algo que podemos chamar de “suprassumo do conflito entre hospitais e operadoras” é a questão “conta aberta x pacote”.
Vamos exemplificar os tipos de restaurantes que conhecemos.
Existe o restaurante que vende comida por quilo. Dependendo da fome do cliente, vai pagar mais ou menos … tão simples quanto isso: come mais, paga mais – come menos, paga menos.
No restaurante “à la carte”, um cardápio indica previamente o preço da refeição – não pesamos o prato porque teoricamente foi feito o cálculo do valor total da “escolha do freguês”. Se comer menos (se sobrar) não tem desconto. Se quiser comer mais, vai ter que pagar outro prato.
Existe o restaurante tipo “rodízio” onde o glutão pode comer à vontade, também pagando preço fixo. Também não se pesa a comida – se quiser “encher o bucho”, ou se quiser comer pouquinho, vai pagar o mesmo preço. Existem 2 tipos de rodízio:
É fácil associar a comida por quilo com a conta aberta hospitalar. E é a forma mais justa de remunerar os serviços hospitalares. Paga-se exatamente o que se utiliza – tão simples quanto isso.
Para o hospital o pacote só é viável quando comparamos a conta ao “à la carte”. Somente para procedimentos padronizados. Se o paciente necessitar consumir mais, deve comprar outro prato. Se comprou bife com arroz, ficou com fome e quer uma porção de fritas, deve pagar o adicional da porção.
Não existe hipótese do pacote ser rodízio para o hospital. A explicação está na comparação: o cliente do restaurante tem limite para consumir (o tamanho do estomago), o paciente não. O que vemos no mercado quando o pacote se enquadra em rodízio:
Alguns hospitais de pedigree dizem que vendem rodízio, mas quando você olha o termo que assina é o mais puro “à la carte”. Você paga pela marca por um prato feito pensando que vai comer tudo que quiser, até ver a conta;
A operadora impõe um pacote inviável, mas o hospital aceita em troca da oportunidade de “fisgar o cliente” para procedimentos de maior complexidade. Por exemplo: um pacote global em pronto socorro de urgência obstétrica, que acaba trazendo para a mãe para o futuro parto;
O hospital tem um serviço de baixíssima qualidade e/ou baixa ocupação e qualquer coisa que aparece serve para reduzir o custo fixo. O resultado do pacote no médio e longo prazo acaba piorando ainda mais sua agonia.
Nas aulas sempre escuto uma ou outra pessoa citando que o pacote é bom porque simplifica o processo de formação e auditoria das contas:
Esta “brincadeira” que vivemos hoje, que equipou a saúde com uma estrutura gigantesca para faturar e auditar contas, encarece o sistema de saúde. No cenário que vivemos ainda é muito necessário alguém que fique olhando as bobagens que os hospitais fazem no faturamento, alguém que fique analisando as peripécias que as operadoras fazem na auditoria. Quem está no sistema e não se especializa para lidar com isso perde muito dinheiro.
O paradoxo que existe no interesse das operadoras e dos hospitais só tem uma chance de acabar: quando todos os hospitais forem de rede própria de operadoras, e prestarem serviço exclusivamente para sua mantenedora. Quando, inclusive, os médicos forem funcionários das operadoras. Embora acreditando ser a tendência natural da saúde suplementar, não creio que estarei vivo para ver.
Enquanto isso vamos continuar assistindo os hospitais vendendo comida por quilo, as operadoras querendo comprar rodízio, e o “à la carte” sendo o “fiel da balança” .