60% das vagas para pessoas com deficiência ficam vazias
01/07/2016
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Lei completa 25 anos sem atingir mínimo de até 5% dos postos em empresas com mais de 100 funcionários. Justiça do Trabalho já exime de multas firmas que tentaram, sem sucesso, achar mão de obra para cumprir cota.
Por Filipe Oliveira

Com 25 anos, a Lei de Cotas para a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho conseguiu preencher menos da metade dos postos por ela criados.
A lei define que empresas com a partir de cem funcionários tenham um percentual de profissionais com deficiência que varia entre 2% e 5% (quanto mais contratados, maior a cota).
As 39.260 empresas que se enquadram nessa regra teriam que reservar cerca de 828 mil vagas para pessoas com deficiência. Mas só 327.215 (39,5%) dessas vagas estavam preenchidas em 2014, ano de que são os últimos dados disponíveis.
No último ano, a situação foi agravada pela crise, diz a consultora Carolina Ignarra, sócia da Talento Incluir, especializada em inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Segundo ela, com a crise financeira pela qual o Brasil atravessa, muitos profissionais com deficiência foram demitidos, fato que não é comum neste segmento, devido a necessidade do preenchimento das cotas.
Mais demissões

Primeiro, foram dispensados os de melhores salários, e, neste ano, os desligamentos se generalizaram. “Muitos profissionais que estavam em uma empresa há dez anos estão consultando a gente com dificuldades para se recolocar”, diz.
Segundo o Ministério do Trabalho, foram aplicadas 4.363 multas por descumprimento das cotas em 2015,com valor total de R$ 159,3 milhões. O número representa acréscimo de 61% em relação ao total de multas aplicadas no ano anterior. Em 2014, foram 2.696 multas, com valor total de R$ 113,6 milhões.

 
Multas flexíveis

Se, por um lado, a fiscalização está mais intensa, de outro decisões judiciais apontam para uma aplicação de multas mais flexível.
Em maio, a Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (TST) retirou multas aplicadas à American Glass Products do Brasil por descumprimento da cota, em ação movida pelo MPT (Ministério Público do Trabalho) do Paraná.
Em decisão anterior, a companhia havia sido condenada a pagar R$ 10 mil por profissional que faltasse para completar a cota, mais R$ 200 mil por danos morais coletivos. Em sua defesa, a empresa argumentou que havia feito os esforços necessários para contratar os profissionais: fez anúncios de suas vagas na Agência do Trabalhador (Sine) e na internet.
O relator do processo, o ministro João Batista Brito Pereira, disse na decisão que uma empresa não pode ser responsabilizada por seu insucesso após ter feito esforços para preencher a cota.
José Alberto Couto Maciel, advogado da companhia, critica a falta de exceções na lei.
“Muitas empresas fazem todo o necessário para conseguir os empregados, mas eles não aparecem. Você não pode ser condenado por algo alheio a sua vontade”, diz.
Embora a maioria dos recrutadores argumente que faltam profissionais qualificados, consultorias que atuam no setor dizem que o principal problema é que as vagas oferecidas são ruins.
O fato de a decisão que beneficiou a American Glass ter sido tomada em um órgão colegiado do principal tribunal trabalhista do país indica o modo como outros casos serão julgados, avalia Carlos Eduardo Vianna Cardoso, sócio do setor trabalhista do escritório Siqueira Castro.
Em outras instâncias, já se discute uma aplicação diferente das cotas em empresas cuja maioria das vagas são em áreas de risco, como na construção civil e no setor de óleo e gás, e que teriam poucos postos adequados a pessoas com deficiência, diz José Carlos Wahle, sócio da área trabalhista do Veirano.
Segundo essa interpretação, a porcentagem mínima deveria ser aplicada apenas nas funções que não envolvem riscos físicos.
No setor de óleo e gás, ações movidas pelo MPT por descumprimento da cota contra as empresas Pride e Ensco foram julgadas improcedentes pela Justiça, em decisões de primeira e segunda instância, respectivamente.
“A constitucionalidade da lei não é discutível. Mas há uma tendência do Judiciário de relativizar a aplicação da penalidade quando há justificativa para isso”, afirma Carlos Wahle.
Precedente

Uma aplicação mais branda da lei pode ser danosa à inserção social das pessoas com deficiência, na opinião do procurador Sandoval Alves da Silva, coordenador nacional de Promoção de Igualdade de oportunidade e eliminação da discriminação no trabalho do MPT.
Segundo ele, a flexibilização da lei pode se tornar um precedente para que outras empresas deixem de cumprir suas obrigações.
Bastaria seguir o mesmo protocolo de empresas absolvidas anteriormente, fazendo alguns anúncios em sites e jornais, e dizer que fez o que era necessário para se livrar de penas, diz.
Engajamento

Para Silva, isso é pouco. Segundo ele, as empresas deveriam se engajar com o tema, participando de iniciativas junto ao setor público e à organizações da sociedade para promover a capacitação de mais pessoas.
“É muito incoerente olhar para o Brasil de desempregados, de milhões de pessoas com deficiência, e dizer que se fez tudo o que poderia ser feito para cumprir a lei.”
O procurador afirma que o Ministério Público irá recorrer da decisão referente a American Glass, com o objetivo de levar a ação ao Supremo Tribunal Federal.
Com a crise econômica, a possibilidade de trabalhadores com deficiência encontrarem postos de trabalho também foi reduzida pelo fato de que as grandes companhias, que são as que precisam reservar uma porcentagem a eles, reduziram suas equipes.

Fonte: Abramge




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