O aumento do desemprego, que levou 1,9 milhão de brasileiros a perder a cobertura de planos de saúde, as dificuldades que os consumidores enfrentam para usar os convênios e a precarização do atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS) impulsionaram a expansão de redes de clínicas populares no país. Com preços acessíveis para a realização de consultas e exames, pelo menos sete empresas foram criadas para prestar serviços médicos de baixa e média complexidade.
O advogado Daniel Cardone, especialista no mercado de saúde, explica que o conceito de clínicas populares surgiu nos Estados Unidos, em varejistas como a CVS, uma das maiores redes de farmácia do mundo, e no Walmart. Os norte-americanos não possuem um sistema público de saúde e as duas companhias faturam com a venda de medicamentos. Com isso, criaram suas próprias clínicas, com preços de consultas inferiores aos de hospitais, para atender pacientes com dores de cabeça, alergias e pequenos desconfortos. “O país tem uma população enorme sem recursos para buscar atendimento em hospitais privados e as empresas viram uma oportunidade”, detalha.
Cardone comenta que, em qualquer lugar do mundo, as pessoas não veem barreiras para gastar quando o assunto é saúde. Vendem os bens, usam as economias ou tomam financiamentos para custear tratamentos. Diante de uma demanda semelhante, os brasileiros adaptaram o conceito norte-americano para a realidade brasileira. “No Brasil a legislação não permite que uma farmácia ou uma rede varejista tenha médicos prescrevendo medicamentos. Mas as clínicas podem ser criadas por investidores e médicos”, afirma.
Tendência
O especialista destaca que o modelo deu certo no Brasil diante da carência de hospitais públicos e dos custos elevados para tratamento em unidades privadas para quem não tem plano de saúde. Uma consulta varia de
R$ 89 a R$ 120. Exames são realizados a partir de R$ 3,50. O investimento para montar uma unidade varia de R$ 500 mil a R$ 1 milhão. O custo do projeto é determinado pelo gasto com equipamentos. “O cidadão brasileiro que hoje está desempregado não tem dinheiro para pegar táxi ou ônibus e percorrer vários hospitais em busca de atendimento. Logo, ele vai a uma clínica popular, gasta menos e tem a certeza de que será atendido”, relata.
O presidente do Conselho de Administração da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), Francisco Balestrin, ressalta que, somente no ano passado, 150 mil consultas deixaram de ser realizadas em prontos-socorros privados na cidade de São Paulo com a redução do número de beneficiários de planos de saúde. Ele explica que essa demanda passou a ser atendida por clínicas populares, consultórios particulares ou pelo próprio SUS.
Na opinião de Balestrin, as clínicas populares são uma tendência de mercado e a perenidade dessas empresas será testada quando a economia voltar a crescer e os brasileiros voltarem a ter emprego, planos de saúde e usar os hospitais privados. “Quem faz um atendimento profissional participará do processo de consolidação. Quem entrou na onda pode perder a clientela”, comenta. O presidente do conselho de administração da Anahp ressalta que os atendimentos de média e alta complexidade continuam a ser realizados pelos hospitais e a tendência é que o movimento aumente diante do envelhecimento populacional.
"O país tem uma população enorme sem recursos para buscar atendimento em hospitais privados e as empresas viram uma oportunidade"