A Decolagem do Mobile Health
09/05/2016

Segundo um recente relatório do analista de indústria Juniper Research o número de usuários de “Mobile Health” (ou “mHealth”) [1] vai aumentar para 157 milhões em 2020 [2]. A adoção de serviços de informação de “mHealth” irá aumentar significativamente à medida que os provedores de serviços lançam iniciativas para abordar questões como a mortalidade infantil e as doenças infecciosas. Serviços de SMS, Aplicativos Móveis e URA (Unidade de Resposta Audível) estão fornecendo informações vitais para aqueles que não podem acessar aos serviços gerais de saúde [2.1].

A Organização Mundial de Saúde (OMS) entrou na “onda” do “mHealth” e publicou recentemente um “checklist” para estimular a tendência que será cada vez mais presente [2.2] e [2.3].

O uso de aplicações de mHealth [3] está se relevando benéfico para a maioria dos pacientes. Por exemplo, simples lembretes via o telefone celular pode ajudar as pessoas a se tornarem mais ativas. Além disso, recursos de lembretes, incentivos financeiros e de “gamificação” (“gamification” [4]) podem promover mudanças de comportamento de acordo com consultoria alemã Research2Guidance. A utilização de “gamificação” tem progredido muito nos últimos anos no setor de Saúde [5].

Atualmente existem hoje cerca de 165.000 aplicativos (“apps”) relacionados com a saúde que se deslocam sobre um ou outro dos dois sistemas operacionais de smartphones principais, o iOS da Apple e o Android do Google. A consultoria PwC estima que até 2017 esses aplicativos terão sido “baixados” 1,7 bilhões de vezes. No entanto, o mercado das “apps” de saúde é altamente fragmentado. Muitos provedores ainda são pequenos, e a maioria dos aplicativos são raramente, ou nunca, utilizados. As “apps” bem-sucedidas são altamente populares. Como os aplicativos e os dispositivos “wearables” tornaram-se cada vez mais capazes e úteis, os smartphones continuam a sua marcha de dominância, proporcionando ao “Mobile Health” um futuro promissor. A consultoria BCC Research [6], que estuda os mercados de tecnologia, estima que as receitas globais de “mHealth” chegarão a 21,5 BUS$ em 2018, com a Europa sendo o maior mercado de “mHealth” mundial.

Existe hoje no mercado uma boa expectativa de mercado sobre a “decolagem” do negócio de “Mobile Health” embora nem sempre haja concordância sobre quando esse mercado vai “explodir” [7] e [8].

Até agora, a grande maioria dos aplicativos de saúde de smartphones se encaixam na categoria de “bem-estar” (“wellness”). Junto com sensores portáteis, como a pulseira Fitbit, esses aplicativos ajudam as pessoas a gerenciar e monitorar seus níveis de exercícios físicos, dieta e estresse. Outros tipos de aplicação, tais como WebMD [9] e iTriage [10], “reempacotam” as informações médicas já disponíveis de forma “on-line”, e oferecem-nas sobre sintomas e tratamentos médicos. Alguns outros, como a “app” ZocDoc [11], permite que os usuários agendem consultas com os médicos.

No entanto, a tecnologia de “mHealth” promete cada vez mais – com a sua evolução – fazer o trabalho pesado na medicina. Em primeiro lugar, nos EUA, existe uma gama crescente de aplicações (de telemedicina) através das quais os usuários podem conversar diretamente com médicos e terapeutas. Entre alguns exemplos de “apps” temos: o Doctor On Demand [12], HealthTap [13] e Pingmd [14] e [15-17]. Desde o final de 2014, a cadeia de farmácias americana Walgreens, está oferecendo um aplicativo chamado MDLive, que fornece acesso 24 horas a um médico para uma consulta de 49 dólares. Os pacientes em breve serão capazes de conversar via chat com os conselheiros de saúde de “inteligência artificial” através da utilização de aplicativos de mensagens. Em segundo lugar, e com potencial de maior efeito de longo alcance sobre a qualidade dos cuidados de saúde, existe uma “família” emergente de aplicativos que monitoram e diagnosticam pacientes considerando uma variedade de doenças, e em alguns casos, fazendo previsões e, assim, ajudando a evitar crises de saúde. A “inteligência artificial” terá um papel muito importante nas nossas vidas e na saúde em “breve” futuro [17.1].

No Brasil, a legislação médica estabelece uma série de “ponderações restritivas” sobre a utilização de processos de telemedicina o que pode limitar a utilização de “apps” nesse segmento [18-20]. Recentemente, o Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Sul (SIMERS) recomendou que os médicos não façam nenhum atendimento a distância [20.1] e [20.2]. Os Órgãos que legislam esse tema no Brasil têm que entender que o “momento atual de evolução tecnológica vai exigir um novo pensar”! Veja que teremos muito mais inovações vindo na “cola” dessa nova tecnologia na medicina, a saber: genética, nanotecnologia, robótica, edição de gene, realidade virtual, realidade aumentada, bio-impressão 3D, e muito, muito mais”. Precisamos nos adaptar aos novos tempos! [20.3] e [20.4].

A “startup” Cerora [21] da Pensilvânia nos EUA, criou um aparelho eletrônico para a cabeça, com um aplicativo de smartphone associado, que monitora a saúde do cérebro (sic!). O aparelho mede as “ondas cerebrais” e rastreia os movimentos dos olhos; a “app” utiliza sensores internos do smartphone para testar o equilíbrio dos pacientes e o tempo de reação. A Cerora planeja lançar o produto este ano, sujeita ainda a autorização da Agência FDA (a “Anvisa” dos EUA). Esse dispositivo poderia ajudar a diagnosticar concussão e outras doenças “neurodegenerativas”. A Cellscope [22], de San Francisco, oferece um dispositivo conectado a um smartphone que permite aos pais vejam o interior do ouvido de uma criança, tirar fotografias ou vídeo e enviá-los a um médico.

Um pequeno número de pacientes, principalmente os doentes crônicos, são desproporcionalmente onerosos para qualquer sistema de saúde! As “apps” de “Mobile Health” oferecem, um meio contínuo a longo prazo de monitorá-los, com o potencial de melhorar as condições de monitoração de como doenças (como p. ex., distúrbio cardiovascular, epilepsia, asma e diabetes) são geridas [23].

Pacientes com diabetes constantemente têm que tomar decisões sobre medicação, alimentação e atividade física e passam meses entre consultas médicas para “ajudar” nessas decisões. A Medtronic [24] – em parceria com a empresa IBM Watson de análise cognitiva – criou um aplicativo para prever, com três horas de antecedência, quando um paciente vai experimentar níveis altos ou baixos de açúcar no sangue. A “app” reúne os dados das bombas de insulina da Medtronic e monitores de glicose, usados pelo paciente, e combina-os com informações sobre a dieta do usuário e os dados dos rastreadores de atividades físicas. Essa aplicação trabalha com os princípios de “big data” (tipo análise preditiva). Uma bela sacada! [25]. Entre outros fornecedores de serviços de “Mobile Health” relacionados com a diabetes é Diabetes+Me [26], cuja aplicação já está mostrando que ela pode melhorar os resultados dos pacientes e também reduzir custos. A grande farmacêutica suíça Novartis, está testando uma lente de contato para monitoração do nível de glicose, desenvolvida pelo Google [27].

A monitoração constante dos pacientes através de sensores sem fio pode poupá-los de muito sofrimento, através da identificação de sinais incipientes de que a sua condição de saúde está deteriorando-se. Essa monitoração pode poupar os profissionais de saúde e as seguradoras de internações hospitalares muito caras. O famoso serviço de saúde britânico NHS testou a relação custo-eficácia da monitoração remota dos pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DOPC), verificou-se que um tablet eletrônico combinado com sensores de medição de sinais vitais podem resultar em um melhor atendimento e uma enorme economia, permitindo uma intervenção precoce [28]. Alguns produtos de “mHealth” podem revelar-se tão eficaz que os médicos começam a fornecê-los mediante receita médica.

Até agora, as grandes companhias farmacêuticas têm sido lentas em aderir à revolução do mHealth, embora existam algumas exceções. A Pfizer tem o HemMobile [29] e a Baxter tem o Beat Bleeds [30], que ajudam os pacientes a gerir a hemofilia. A Bayer, fabricante do Claritin [31], uma droga anti-histamínica, tem um “app” popular para predição de pólen. A GSK, uma empresa farmacêutica com vários tratamentos de asma, oferece para os asmáticos o aplicativo MyAsthma [32], para ajudá-los a gerir a sua condição de saúde.

A GSK, fez parceria com a empresa Propeller Health [33], para desenvolver sensores “customizados” para o inalador de asma Ellipta [34] da GSK, para o qual a empresa farmacêutica quer reunir informações sobre como os pacientes usam o dispositivo [35].
A GSK quer saber o quão bem os pacientes cumprem com as instruções sobre quando usá-lo, e ver como a conformidade diz respeito à segurança, eficácia e benefícios econômicos do medicamento.

A grandes farmacêuticas (como p. ex. Novartis, Roche, Novo Nordisk, GSK, entre outras) não estão alheias ao movimento de saúde digital e desenvolvendo inovadoras parcerias estratégicas com empresas de tecnologia [35.1].

Todas as empresas farmacêuticas estão sob pressão de reguladores e seguradoras de saúde para fazer mais para demonstrar o valor de seus medicamentos, e o “Mobile Health” pode ser uma grande ajuda nessa tarefa. Os ensaios clínicos de um novo medicamento proposto serão capazes de utilizar aplicações de “mHealth” para medir a progressão da doença com mais precisão, e assim demonstrar a eficácia do tratamento. Depois que um medicamento é aprovado para comercialização e talvez muitos milhares de pacientes já estão tomando-o, o uso de “apps” para monitorar sua condição constituirá uma enorme prova de benefícios a longo prazo para o produto. Mas também poderia acontecer um desastre para as farmacêuticas, se tais testes pós-aprovação mostram que os medicamentos não na prática não fornecem os benefícios esperados, ou mostram efeitos colaterais indesejáveis. A farmacêutica Roche começou a utilizar “app” para testar um medicamento para a Doença de Parkinson [35.2].

A medida que os aplicativos de “mHealth” assumem um papel mais representativo na saúde – o que sem dúvida vai acontecer mais dia menos dia – eles vão exigir uma regulamentação mais séria. Os Órgãos Reguladores vão ter que assumir essa responsabilidade … done! A imprecisão de um pedômetro não é muito crítica, mas não podemos dizer o mesmo de um monitor de frequência cardíaca. Em agosto de 2015, um produto popular, Instant Blood Pressure, foi removido da Apple Store, após que sérias preocupações foram levantadas em relação a sua precisão [36]. Em 2011, um desenvolvedor que reivindicou sua AcneApp poderia tratar espinhas com luz a partir de uma tela do iPhone e foi multado [37].

No ano passado, o Órgão Regulador americano FDA terminou de elaborar o seu regime regulamentar para o “Mobile Health”, indicando que adaptará a sua abordagem, dando pouca atenção às aplicações de baixo risco, como aquelas que apenas promovem um estilo de vida saudável; e examinará aquelas em áreas onde qualquer informação errada poderia ser perigosa. Esta abordagem “sensível” poderá ser seguida por reguladores noutros países [38] e [39]. No Brasil – aparentemente – não temos nenhuma de movimentação da ANVISA na direção dessa regulação de aplicações móveis. Em meados de 2013 sinalizamos a necessidade de termos algo na linha regulatória de “apps” de saúde e não tivemos nenhum eco! [39.1]

Em fevereiro desse ano, o Senado americano começou a alterar o cenário de controle das “apps” de saúde nos EUA e aprovou um Projeto que será submetido a votação naquela casa [40] e [41].

Mas outras questões regulatórias são mais difíceis de responder. A medida que os aplicativos de saúde tornam-se mais populares, as preocupações sobre como os dados dos pacientes são armazenados, usados e compartilhados se tornarão mais preocupantes. Um estudo recente publicado no “Journal of the American Medical Association” descobriu que muitos aplicativos de saúde podem estar compartilhando os dados de saúde dos pacientes sem o seu conhecimento [42]. Quatro quintos dos 211 aplicativos de diabetes que foram examinadas não tinham políticas de privacidade!

As regras dos EUA sobre o armazenamento e transmissão de dados de saúde pessoais não foram alteradas desde o advento do iPhone. Assim, os médicos e hospitais podem estar relutantes em abraçar os aplicativos de saúde até que as regras sejam atualizados para tornar claro que eles podem fazê-los sem violar as normas rigorosas em matéria de segurança dos dados. E a consciência dos provedores e daqueles que prescrevem as “apps” de “mHealth” ficarão expostas pela associação com qualquer utilização fraudulenta dos dados dos pacientes que as promovem.

O mercado nascente e fragmentado de “mHealth” parece provável consolidar-se no tempo, com suas “startups” mais promissoras talvez sendo compradas ou fazendo em alianças com marcas de saúde confiáveis. Isso iria ajudá-las a realizar o seu potencial substancial para ajudar aos pacientes, médicos, seguradoras de saúde e, também, aos pesquisadores.

Apesar da aposta crescente de um mercado promissor, um estudo de mercado do 2o semestre mostrou que a maioria das apps de “Mobile Health” permanecem sem grande tração na sua evolução [43]. Como vimos aqui 2 grandes influências podem fazer com que a consolidação do mercado tome um pouco mais de tempo: (1) um papel de maior visão estratégica dos Órgãos Reguladores (como o FDA nos EUA) e Organizações Médicas e (2) uma maior preocupação com a privacidade dos dados dos pacientes pelos desenvolvedores das aplicações.





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