Quem diria que um dia o Google iria produzir carros? Quem diria que em apenas três anos o WhatsApp alteraria de forma tão significativa a maneira das pessoas se comunicarem pelos celulares, a ponto de reduzir fortemente as receitas das grandes empresas de telefonia oriundas da utilização do celular via voz?
Essas foram algumas das perguntas feitas pela vice-presidente da empresa de pesquisas Gartner, Belkis Toledo, e pelo advogado e jornalista Ronaldo Lemos - também apresentador do programa Navegador da GloboNews, no painel “Inovação – Uma perspectiva para o Mercado”, mediado pelo presidente da FenaCap, Marco Barros, durante o “21º Encontro de Líderes do Mercado Segurador”, na Bahia.
E entre as muitas perguntas e poucas respostas a respeito do futuro, uma certeza é que ele será muito mais transformador do que nosso presente foi para o passado recente, afetando de forma significativa, além da maneira das pessoas se relacionarem, todos os ramos de negócio existentes, inclusive o segurador.
E para continuarem relevantes, afirma Belkis, as seguradoras precisam “quebrar os modelos tradicionais de negócio”, contando com líderes que enxerguem a necessidade de mudança e estejam preparados e dispostos a isso. Mesmo porque, se não o fizerem, outros o farão, como se evidencia ao se observar os US$ 2,1 bilhões já investidos em startups de tecnologia da área de seguro.
Quando a internet surgiu, ela servia para conectar computadores. Posteriormente, passou a conectar pessoas, como nas redes sociais. Agora, entramos na era da internet das coisas, ou seja, da conexão de todo e qualquer objeto utilizado pelo homem. “Vamos imaginar uma cadeira”, disse Ronaldo. “Qual a vantagem dela ser conectada à internet?”. Colocada em uma recepção, pode identificar quantas pessoas sentaram nela ao longo de um período, medindo o fluxo de pessoas. Com uma balança embutida, poderia identificar, pelo peso e postura, quem a sentou, podendo substituir, por exemplo, a chamada em sala de aula.
Reafirmando o impacto que essas inovações trarão à indústria de seguros, Ronaldo deu mais um exemplo: o da empresa Drive Like a Girl, que instala um dispositivo de monitoramento em seu carro, avaliando o modo de dirigir e oferecendo descontos aos bons motoristas no preço do seguro.
Para quem pensa que essas mudanças ainda estão longe no horizonte, Ronaldo lembra do Uber, que em pouco mais de um ano consolidou-se no Brasil como um forte concorrente aos táxis e serviços de transporte em geral. E, aproveitando-se do modelo de avaliação dos motoristas do Uber, feito pelos passageiros, Ronaldo citou a cidade de Washington, que tem todos os seus serviços públicos abertos à avaliação da população. Essa, inclusive, é outra grande tendência, que ele chamou de “sistemas de reputação objetivos”, ou seja, o mapeamento de informações sobre a maneira com que as pessoas utilizam os sistemas e das avaliações dadas a estes por terceiros.
Outra forte tendência apresentada é a do “eu quantitativo”, ou seja, a utilização de dispositivos que monitorem uma infinidade de informações pessoais, tais como a frequência cardíaca, a quantidade diária de atividade física, o tempo de sono, o consumo de calorias, etc. Tendência que pode ser muito útil, por exemplo, para a Saúde Suplementar, que pode oferecer descontos a quem melhor se cuida.
Quando o debate foi aberto ao público, o superintendente da Susep, Roberto Westenberger, presente na plateia, afirmou que o órgão estuda a utilização de novas tecnologias, mas ainda enfrenta muitas resistências, tanto pela incredulidade como pelo receio de se tornar muito invasivo na vida das empresas e segurados. Em resposta à questão, Ronaldo afirmou que o Brasil está mais de 30 anos atrasado na definição de uma lei de proteção de dados pessoais, que poderia, além de proteger os cidadãos, permitir que os reguladores atuassem com tranquilidade dentro das definições da lei.
Outro ponto importante levantado pela plateia- no caso, pela nova presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz- foi o do impacto das novas tecnologias médicas nos custos assistenciais da saúde, um dos mais significativos atualmente. Em resposta, Ronaldo utilizou o exemplo do Obamacare, o plano do presidente americano para ampliar a assistência à saúde no seu país. “Inicialmente, o Obamacare foi um desastre”, tendo sido contratada uma empresa caríssima para cuidar de todos os dados, mas que logo nos primeiros dias mostrou-se cheia de falhas no sistema. Preocupado com o fracasso de um dos projetos que pretendia deixar como legado, Obama contratou uma equipe de seis profissionais que utilizaram uma série de códigos abertos já existentes, bem como outras tecnologias já existentes e baratas, que foram aproveitadas, em vez de se reinventar a roda. “Muitas vezes a solução mais cara não é a mais adequada. Mais importante é trabalhar com uma equipe motivada”, finalizou.