Estreitar e desburocratizar a vida de médicos e pacientes é uma das premissas que novos modelos de negócio estão encontrando para se estabelecerem como uma alternativa ao cenário atual de convênios médicos, que seguem tendência de encarecimento, assim como os desafios de eficiência do Sistema Único de Saúde (SUS).
O Brasil tem 50,5 milhões de beneficiários em planos de assistência médica, por volta de 25% da população do País, abastecidos por mais de mil operadoras de saúde. É uma fatia bastante grande a mercê da tendência de alta nos reajustes anuais de planos coletivos, que equivalem a 77% de todos os planos comercializados e que são calculados de maneira autônoma por cada operadora.
Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), os reajustes chegam a subir 25% em 4,1% dos contratos coletivos, o equivalente a cerca de 46,5 mil contratos. Atualmente o benefício saúde ao funcionário já é a segunda maior despesa da área de Recursos Humanos (RH) nas empresas, superada apenas pela folha de pagamento.
Não diferente é o cenário dos custos dos planos individuais e familiares, regulados pela ANS, que apresentaram índice máximo de reajuste em 13,55% em julho deste ano (referente aos planos contratados a partir de janeiro de 1999 ou adaptados à Lei nº 9.656/98).
Outro questionamento do mercado em relação à Saúde Suplementar está na demora para que os profissionais de saúde sejam remunerados. “Quando a gente diz para o médico: quer receber no dia seguinte da consulta? Ele pergunta: onde assino?”, conta Rogério Aleixo, diretor executivo da SOS Consulta, plataforma direta de agendamentos que está entrando no mercado, mais precisamente no Estado de São Paulo, para ser justamente uma alternativa a esta dicotomia (suplementar x público) e falta de agilidade.
“Se um médico costuma receber para um ultrassom cerca de R$40 após 60 dias, aqui ele vai ter cerca de R$70 no dia seguinte, à vista”, completa Aleixo. O percurso de atendimento do cliente na plataforma também prima pela agilidade. Com um cadastro no portal, o usuário pode buscar pela especialidade médica, listar profissionais num raio próximo a sua residência, de acordo com os horários dos médicos disponíveis e pronto: está marcada a consulta, que em geral possui preços abaixo das clínicas particulares. A meta da SOS Consulta é atender 200 mil consultas anuais nos 12 primeiros meses e dobrá-la em até três anos.
Além do preço, a forma de pagamento para o paciente também precisa ser atrativa nesses modelos alternativos, que em geral oferecem possibilidades de parcelamento de exames. Mas se engana quem pensa que serviços como o da SOS Consulta ou até mesmo de clínicas de baixa complexidade como o Dr. Agora se dedicam exclusivamente à população de baixa renda e sem acesso a planos de saúde. Para Guilherme Berardo, CEO do Dr. Agora (que se autointitula como “clínica expressa”), o atendimento é capaz de atrair ambos os públicos.
“Sobre o público sem acesso do ponto de vista financeiro, eu estou trazendo pelo valor da consulta; mas tem paciente com seguro que é atraído pela resolubilidade, ou seja, foi tratado genuinamente bem e saiu com a percepção de que resolveu seu problema rapidamente, sem burocracia. E para quem frequenta o SUS – claro que há lugares em que o SUS funciona muito bem -, em geral estão acostumados com filas enormes, pessoas sentadas há horas, mas aqui podem ter o atendimento do check in ao check out em apenas 20 minutos”, avalia.
Na Clínica Fares, com duas unidades na cidade de São Paulo e uma terceira a ser inaugurada em Osasco, um hemograma pode ser feito por R$10, enquanto uma consulta sai a partir de R$80. O agendamento também chega a ser feito para o próprio dia, mas a filosofia, apesar dos preços acessíveis, é principalmente na forma do atendimento.
“Não focamos em ser uma clínica popular de preço mais baixo possível, mas sim em oferecer ao público de bairros mais periféricos e menor poder aquisitivo um atendimento de mesma qualidade dos grandes centros. Quando a gente pensa no foco do atendimento humanizado – até porque grande parte da nossa população se queixa disso, de ser tratada como número -, a gente acaba atraindo até pacientes da classe A. Os planos de saúde precisam de muito volume e tratam o sistema como linha de produção, então a intenção é fazer com que o paciente se sinta valorizado, que ele acredite que valeu a pena pagar pela consulta”, diz o diretor médico-administrativo da clínica, Hyun Yoon.
Ele conta ainda que os médicos são orientados a chamar o paciente na porta, pelo nome, sem pressa, e a perguntar, para além do atendimento, como estão as demais coisas da própria vida e das outras pessoas da família. “Uma das principais causas de cegueira no Brasil é diabetes, então sabendo o histórico da família do paciente, você já encaminha para um oftalmologista, por exemplo. Num primeiro momento, dá impressão que fica mais oneroso, mas daqui 20 anos, quanto vai custar para o Estado cuidar desse
paciente?”, questiona.
E o futuro? Yoon, como boa parte do setor, acredita que o modelo atual de planos de saúde no Brasil está fadado a se tornar inviável economicamente, com custos operacionais aumentando cada vez mais e a sociedade sentindo a carência de que vários procedimentos não têm cobertura. Além disso, diz o médico, a melhora da qualidade de vida impacta na longevidade da população, e o sistema público não consegue
atender. “Então acho que a busca por modelos de saúde mais ágeis, menos onerosos, e clínicas populares, ou de preço mais acessível como a nossa, se encaixa muito bem”.
Berardo, do Dr. Agora, completa: “Acho que no médio e longo prazo a gente vai acabar naturalmente interagindo mais com as operadoras de saúde, que têm uma coisa muito clara, o copagamento mais alto ou uma franquia muito mais alta. Além disso, podemos ter o incentivo de empresas que, mesmo que ofereçam o seguro saúde, podem se beneficiar usando a nossa estrutura, com vacinas, por exemplo”. O tempo dirá.
*Esta reportagem está na edição de outubro-novembro-dezembro da revista Saúde Business