Paciente do SUS tem três vezes menos médicos que o de plano de saúde
01/12/2015
Desigualdade se repete na distribuição de especialistas, mostra pesquisa

Há três vezes mais médicos no setor privado do que no Sistema Único de Saúde (SUS) em relação ao público que é atendido em cada uma dessas redes. A conclusão é da pesquisa Demografia Médica no Brasil 2015, divulgada nesta segunda-feira e contabiliza que 73,1% dos profissionais no país atuam na rede pública, que cobre 150 milhões de pessoas. Já na rede privada, que conta com 78,4% da força de trabalho, a clientela é bem menor, de 50 milhões de pessoas. As proporções são semelhantes porque 51,5% dos médicos brasileiros trabalham nas duas esferas, 21,6% apenas no SUS, e 26,9% exclusivamente na iniciativa privada.

- Esse dado significa que o paciente do SUS tem três vezes mais dificuldades do que na rede privada. Isso pode melhorar com políticas públicas, com mais investimentos. Nos últimos 13 anos, perdemos R$ 171 bilhões que estavam disponíveis, mas não foram usados. Isso é inaceitável num orçamento que já é pequeno - disse o presidente do Conselho Federal de Medicina Carlos Vital Tavares Côrrea Lima.

Os dados revelam ainda que, do total de 399.692 médicos no país, 33.178 (7,6%) têm mais de um registro, o que pode indicar atuação em dois estados ou mais. O total de registros ativos, considerados na pesquisa para analisar determinadas variáveis, como indicadores regionais, é de 432.870. Para dados de perfil, como sexo, idade e outros, a base é o número de profissionais. O estudo foi feito pela Faculdade de Medicina da USP com apoio do Conselho Federal de Medicina e do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp).

A desigualdade na distribuição de médicos pelo país se repete quando se verifica onde estão os especialistas. Embora quase 60% dos profissionais brasileiros tenham alguma especialização, Sul e Sudeste concentram 71,63% deles. O Distrito Federal tem a melhor situação, com 2,72 especialistas para cada médico generalista (sem título de especialista emitido por sociedade médica ou obtido via residência) -- acima da média nacional de 1,41. Na outra ponta, estão os seis estados em que o número de generalistas é maior, entre eles o Rio de Janeiro, acompanhado de Pará, Maranhão, Pernambuco, Tocantins e Rondônia.

Quase 50% dos médicos especialistas no Brasil estão concentrados em seis das 53 áreas reconhecidas. O campeão é a clínica médica, com 35.060 médicos titulados, ou 10,6% de todos os especialistas do país. Em seguida vêm pediatria, cirurgia geral, ginecologia e obstetrícia, anestesiologia e cardiologia. Nove áreas têm menos de 1.000 médicos, entre elas a radioterapia, cirurgia de cabeça e pescoço, medicina legal e perícia médica, e cirurgia da mão. Mulheres são maioria em campos como dermatologia e pediatria. Homens se sobressaem na cirurgia geral. Mas, em termos gerais, o percentual de médicos e médicas com especialização é semelhante: 59%.

O estudo aponta que a classe médica cresceu mais que a população nos últimos anos. De 2000 a 2010, o número de profissionais subiu 24,95%, contra aumento populacional de 12,48%. Mesmo assim, o país, que tem 2,11 médicos por mil habitantes, ainda está abaixo do índice de nações que são referência, como Estados Unidos (2,5) e Canadá (2,4). A meta do governo é chegar a 2,7 profissionais a cada mil habitantes em 2026. Além de aumentar o contingente, será preciso também reduzir a concentração geográfica, com estratégias para levar o médico a localidades distantes. Capitais e regiões metropolitanas do país concentram 23,8% da população, mas têm 55,2% dos médicos, com uma relação de 4,84 profissionais por mil habitantes. No interior, essa proporção é de 1,23, já que 76,2% da população são atendidos por 44,7% dos médicos.

- O médico é um profissional que demora pelo menos 12 anos para se formar. Ele não vai trabalhar em qualquer cidadezinha caso não tenha perspectiva de vida para a família dele. Porque, até então, o governo não desenvolveu um projeto para levar os médicos até aquele lugar. Abrir escolas da maneira com que o governo vem fazendo não vai resolver o problema. A maioria desses indivíduos vai continuar trabalhando em grandes cidades, que são as que têm melhores condições de vida - afirmou Bráulio Luna Filho, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo.

- Mesmo com 400 mil médicos no país, ainda temos áreas que são verdadeiros desertos, ou seja, falta localizada de profissionais em determinadas regiões - complementou o professor Mário Scheffer, da Faculdade de Medicina da USP, coordenador da pesquisa.

Sobre os fatores que levariam o profissional a se fixar em um local de trabalho, as respostas mais mencionadas por uma amostra de médicos entrevistados foram “salário/remuneração” e “condição de trabalho”, com 98% de menções.

Consultórios E Plantões

Já entre os médicos que atuam no setor privado, a pesquisa mostra que o lugar de trabalho principal é o consultório particular (40,1%). A segunda opção é o hospital privado (38,1%). Os outros locais são a clínica ou ambulatório privado (31,1%), universidade privada (5,3%), serviço médico de empresa (4,8%) e laboratórios e serviços de diagnósticos e terapia (1,8%). Há ainda uma parcela de 2,2%, tanto no setor público quanto no privado, que citou outros locais, como cargo em indústria farmacêutica ou auditoria do INSS.

O plantão em hospitais ou unidades de pronto-atendimento é realizado por 44,6% dos médicos. Entre os médicos formados há menos de 10 anos, 45,1% são plantonistas, já entre os que se formaram há 30 anos ou mais, apenas 16,4% fazem plantão. No grupo das pessoas com mais de 60 anos, apenas 9% são plantonistas.

Fonte: O Globo  - 01.12.2015




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