A felicidade está ganhando cada vez mais importância nos debates sobre medidas de bem-estar pelo mundo. Afinal, será que o bem-estar da população de um país deve ser medido somente pela sua produção anual de bens e serviços (PIB) ou devemos levar em conta outros fatores? Quando começamos a pensar sobre essa questão, algumas perguntas surgem naturalmente. Como medir bem-estar? Qual a relação entre dinheiro e felicidade? Como se comporta a felicidade ao longo da vida? Divórcios e separações aliviam o estresse? Economistas e outros cientistas sociais vêm se debruçando com bastante frequência sobre essas questões. O que mostram as pesquisas recentes?
A questão que surge logo de início é como (e se) podemos medir felicidade. Grande parte dos estudos sobre felicidade usa medidas subjetivas (autodeclaradas) de bem-estar para mensurar a felicidade de uma pessoa. Mas, será que podemos comparar a felicidade de pessoas diferentes? Há evidências cada vez mais seguras de que há muita informação relevante nas medidas subjetivas de felicidade. Por exemplo, pessoas que se dizem mais felizes tendem a cometer menos suicídios, são consideradas mais felizes pelos seus pares e tem menos reações físicas (mensuráveis) a situações de estresse. Assim, podemos usar medidas subjetivas de bem-estar para analisar os determinantes da felicidade.
Um primeiro ponto importante é que existem diferentes conceitos de felicidade. Pesquisadores tem buscado diferenciar pelo menos dois aspectos. Um deles é a alegria com que uma pessoa vive no seu dia a dia, ou seja, os seus "momentos felizes", em contraposição aos momentos de estresse, raiva e tristeza. Outro conceito de felicidade é o de "satisfação com a vida", que reflete mais a avaliação da pessoa com relação à sua vida como um todo, com o que ela conseguiu atingir até aquele momento. Mas, afinal, o dinheiro compra que tipo de felicidade?
Aumentos a partir de US$ 75 mil anuais aumentam a satisfação, mas não alteram os momentos felizes
Um estudo recente tentou separar os efeitos da renda sobre diferentes aspectos da felicidade. A partir de pesquisas com 450 mil residentes nos EUA que medem o número de momentos felizes no dia anterior à entrevista e também a sua satisfação com a vida, os pesquisadores detectaram vários resultados interessantes. Em particular, pessoas com renda mais baixa são mais infelizes em todos os sentidos, tanto em termos de situações de estresse, preocupação e infelicidade no dia a dia, como em termos de satisfação com a vida. Entretanto, aumentos proporcionais de renda familiar a partir de US$ 75 mil anuais aumentam a satisfação com a vida, mas não alteram os momentos felizes (ou bem-estar emocional) dos cidadãos americanos.
Qual a explicação para esse resultado? Pode ser que acréscimos de renda acima de determinado nível não aumentem a probabilidade das pessoas desfrutarem dos momentos que trazem mais prazer, como estar com os amigos e desfrutar do lazer. Pode ser também que os aumentos de renda, apesar de provocarem o aumento de satisfação pessoal associada ao status, tragam consigo situações de estresse e incapacidade de saborear os pequenos prazeres da vida. Desse modo, é importante separar o que as pessoas pensam a respeito de sua própria vida do quanto elas realmente aproveitam os momentos felizes.
E com relação aos outros determinantes da felicidade? Um resultado que sempre emerge dos estudos sobre felicidade é a relação em formato de U entre idade e felicidade. Ou seja, a felicidade tende a diminuir à medida que ficamos mais velhos, até alcançarmos os 50 anos de idade e depois aumenta novamente. Estudos recentes usando o consumo de antidepressivos (em vez de medidas subjetivas de felicidade) confirmaram essa relação não linear entre idade e felicidade. Por exemplo, os dados mostram que 1 em cada 13 europeus usaram antidepressivos em 2010 (com destaque para os portugueses) e que as pessoas na meia-idade tem uma probabilidade duas vezes maior de tomarem esses remédios do que as com 26 ou 65 anos de idade com as mesmas características. O mais impressionante é que estudos recentes com chimpanzés também detectaram um padrão muito parecido de bem-estar ao logo da vida. Mas, ainda não está claro para os pesquisadores porque humanos e chimpanzés sofrem a crise de meia idade.
Outra questão importante é a relação entre estado civil e felicidade. As pesquisas mostram claramente que as pessoas casadas têm mais momentos felizes e são mais satisfeitas com a vida do que as solteiras, viúvas e divorciadas (mas, a presença de filhos em casa tende a aumentar os momentos de estresse e preocupação). Mas, será que vale a pena manter um casamento infeliz? Claro que não. Estudos que seguem as mesmas pessoas ao longo do tempo mostram que a dissolução do casamento, apesar de traumática no período de transição, reduz significativamente os níveis de estresse dois anos após a separação, com relação à situação inicial (que era pior que a média). Além disso, há evidências de que os filhos não sofrem muito com a separação dos pais.
Por fim, os fumantes e as pessoas que vivem sozinhas são as que têm menos momentos felizes, sofrem mais estresse e estão menos satisfeitas com a vida, mesmo após controlarmos por várias outras características socioeconômicas. Em suma, se a pessoa tem 50 anos de idade, mora sozinha, fuma, e tem uma renda familiar baixa, a probabilidade de que ela tenha uma vida feliz é bastante baixa. Mas, a boa notícia é que as coisas melhoram um pouco aos 60 anos.
Naercio Menezes Filho, professor titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, é professor associado da FEA-USP e escreve mensalmente às sextas-feiras. naercioamf@insper.edu.br
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