Poucas semanas atrás, tive o privilégio de ser eleito para a presidência da International Hospital Federation (IHF), a Associação Mundial de Hospitais, organização fundada em 1929 e que congrega instituições hospitalares de mais de 100 países. O Brasil passou a integrar o comitê executivo já formado pelo atual mandatário, norueguês, e também pelo presidente passado da entidade, coreano. E, embora meu mandato tenha início em 2017, tenho programados encontros estratégicos por videoconferência ou presenciais com as lideranças do grupo, durante os próximos dois anos.
Há uma razão simples, porém distinta, pela qual estou contando tudo isso: a oportunidade de falar, novamente e quantas vezes for preciso, sobre governança. E mais: a chance de experimentá-la em níveis profundamente avançados. Refiro-me ao modelo organizacional da IHF, com o qual criei intimidade nos últimos anos. Uma estrutura fundada, entre outros elementos, no princípio de que três cabeças (presidentes passado, em exercício e eleito) pensam melhor do que uma. E, com suas bases fortalecidas por aprendizados e ensinamentos sucessivos, a instituição se perpetua.
Em diversos pontos, as diretrizes de comando da IHF se encontram com as premissas adotadas pela Anahp. Por exemplo, na criação de mecanismos que amortecem as trepidações de uma véspera de eleição. No Brasil, há quase 10 anos, estabelecemos um modelo de governança em que o conselho de administração, constituído por nove representantes das seis regiões segmentadas pela associação (Sul, Nordeste, Norte/Centro-Oeste, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais/Espírito Santo), elegem seu presidente e vice-presidente. Um processo tranquilo, que equaliza interesses e, como prioridade absoluta, privilegia os objetivos e valores institucionais.
Na IHF, a soma dessa mentalidade ao preparo antecipado e colaborativo das lideranças produz um modelo quase à prova de tempestades políticas.
Quando a organização mantém uma governança sadia, visão estratégica e valorização de seus talentos, os ideais e o projeto por ela defendidos não envelhecem junto com seus dirigentes. Em vez disso, perduram. O que frequentemente ocorre, entretanto, é o uso de modelos para perpetuação do poder de pessoas, grupos ou coalizões. A instituição, dessa forma, corre o risco de perder sua representatividade. De perder muitas coisas, aliás – sua causa, credibilidade, razão de existir. Veja, por exemplo, o caso da FIFA.
Qual a proposta, então, da nomeação de um gestor brasileiro para a direção de uma entidade de tamanha relevância mundial? A verdade, meu caro, é que somos, também, o país do “apesar de”: apesar da confusão política e dos maus humores que rondam a Saúde, as instituições de referência no Brasil são fortemente respeitadas no exterior. Recepcionei e acompanhei diversos líderes estrangeiros em congressos e visitas por aqui, e eles se mostraram encantados com nossos hospitais e nossa capacidade de realizar eventos setoriais de altíssima qualidade.
Essa aproximação com a comunidade internacional coloca o Brasil, definitivamente, no circuito mundial de hospitais. E o desejo de crescer é evidente: no 39º Congresso Mundial de Hospitais da IHF, em Chicago (Estados Unidos), a segunda maior delegação presente era a brasileira.
O dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues dizia que brasileiro tem complexo de vira-lata, descrevendo a posição de inferioridade em que nos colocamos em relação ao restante do mundo. Se a família hospitalar nacional precisava de uma recarga em sua autoestima, este é o momento.