Nos últimos meses, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem conduzido um debate essencial sobre a política de preços e reajustes dos planos de saúde suplementar no Brasil. A questão dos reajustes sempre foi um ponto delicado, afetando tanto as operadoras quanto os milhões de beneficiários que dependem desses serviços para garantir cuidados médicos de qualidade. Em 2023, essa discussão ganhou novas camadas de complexidade, à medida que a ANS busca alternativas para controlar o aumento dos preços sem comprometer a sustentabilidade do sistema.
A proposta da ANS aborda três frentes principais: a ampliação do agrupamento de contratos, o reajuste dos planos individuais e coletivos e a regulamentação da venda online de planos, além de ajustes nos planos ambulatoriais. Todas essas medidas visam atender às demandas dos mais de 50 milhões de beneficiários e preparar o setor para os desafios de 2024.
A primeira mudança proposta pela ANS é a ampliação do agrupamento de contratos, uma medida que busca incluir um número maior de beneficiários sob um mesmo grupo, diluindo os riscos financeiros entre as operadoras. Isso é importante porque, nos últimos anos, os custos assistenciais — aqueles diretamente relacionados à prestação de serviços de saúde — aumentaram em 9% entre 2020 e 2022. Esse cenário pressiona os preços dos planos, levando a reajustes que pesam cada vez mais no bolso do consumidor.
Ao diluir riscos, a medida tenta conter a escalada dos preços, promovendo um ambiente onde os reajustes possam ser mais controlados e previsíveis. Em um momento em que a saúde financeira de muitas famílias está comprometida, esse tipo de regulação pode fazer uma diferença crucial.
Os reajustes aplicados em 2023 foram um alerta claro sobre o desequilíbrio entre a inflação médica e a capacidade de pagamento da população. Enquanto a inflação geral se manteve em torno de 5%, a inflação médica ultrapassou os 16%, refletindo diretamente nos valores dos planos de saúde. O reajuste máximo de 9,63% para os planos individuais foi o maior em cinco anos, mas ainda assim não reflete a realidade dos planos coletivos, que cobrem a maior parte dos beneficiários no Brasil e podem ter reajustes ainda maiores por serem menos regulados.
A ANS está propondo medidas para padronizar esses reajustes, especialmente nos planos coletivos, que frequentemente sofrem aumentos desproporcionais. Controlar esses valores excessivos é fundamental não apenas para proteger os beneficiários, mas também para manter a sustentabilidade do setor a longo prazo. Um sistema que não equilibre o custo com a capacidade de pagamento dos usuários está fadado a perder seu público, gerando uma espiral negativa para todos os envolvidos.
Outro ponto crucial na discussão é a regulamentação da venda online de planos de saúde. O aumento da digitalização de serviços de saúde trouxe consigo novos desafios, como garantir a transparência e a segurança das transações feitas no ambiente digital. A ANS está preocupada em estabelecer normas que assegurem que o consumidor tenha clareza sobre os produtos adquiridos, além de criar mecanismos de proteção contra fraudes.
Os planos ambulatoriais, que cobrem apenas consultas e exames, também estão sendo revistos para oferecer opções mais acessíveis aos beneficiários. Esses planos podem ser uma saída viável para quem não consegue arcar com o custo de um plano completo, mas ainda assim deseja garantir acesso a cuidados essenciais.
Com mais de 25% da população brasileira dependendo de planos de saúde suplementar, as decisões tomadas agora pela ANS moldarão o futuro do setor e o acesso da população aos serviços médicos. O cenário para 2024 indica que a pressão por reajustes controlados, equilibrada pela necessidade de manter a viabilidade financeira das operadoras, será um dos grandes desafios para o setor.
A inflação médica, que historicamente supera a inflação geral, continuará a ser um fator determinante. Acredito que as medidas da ANS são um passo importante para garantir que os planos de saúde permaneçam acessíveis e sustentáveis, mas a execução dessas políticas e a colaboração com o setor privado serão fundamentais para que essas mudanças surtam o efeito desejado.
Como diretor da Associação Brasileira de Startups de Saúde e Healthtechs (ABSS) e CEO da OPME Log, enxergo essas iniciativas com otimismo. O debate sobre os reajustes deve ser constante, e é nosso papel, como parte do ecossistema de saúde, trabalhar junto à ANS e outras entidades para garantir que os avanços propostos sejam concretizados em prol dos beneficiários e da saúde do país como um todo. A saúde suplementar é uma peça fundamental para o bem-estar de milhões de brasileiros, e o equilíbrio entre acessibilidade e sustentabilidade deve estar no centro dessa discussão.
*Michel Goya é CEO da OPME Log e Diretor da ABSS.