Pesquisadores do Institut Pasteur de São Paulo (IPSP) desenvolveram uma ferramenta que permite acompanhar a transmissão de uma doença infecciosa, auxiliando os tomadores de decisão na análise de riscos e nas melhores medidas para mitigar futuras epidemias. A partir do cruzamento de dados epidemiológicos sobre um surto de sarampo em Manaus, com as coordenadas geográficas dos infectados (CEP das residências), o grupo criou um mapa de calor que permitiu acompanhar a evolução da doença na cidade.
O estudo, publicado no Einstein Journal, analisou dados geográficos das residências de mais de 7.000 pessoas com sarampo em Manaus durante o surto de 2018 e 2019. As análises espaciais e temporais foram realizadas para caracterizar vários aspectos do surto, incluindo o início e a prevalência dos sintomas, dados demográficos e situação vacinal.
“Tivemos acesso aos micros dados da epidemia de sarampo em Manaus, em 2018, e conseguimos saber a localização das pessoas infectadas (o CEP). Fizemos a análise tradicional e identificamos informações importantes como taxa de contágio e áreas mais impactadas, por exemplo. Mas queríamos ir além disso e realizar uma análise mais ampla, que permitisse a criação de uma ferramenta de fácil visualização e entendimento do problema”, afirma Helder Nakaya, pesquisador principal do IPSP que coordenou o estudo.
Nakaya explica que a ferramenta é útil para o gestor público, pois com ela é possível estimar com rapidez o impacto de medidas de controle – como isolamento e vacinação – na transmissão da doença. “O modelo foi criado a partir de dados de sarampo, por ser uma doença de rápida transmissão. Mas é possível, a partir desse modelo, criar ferramentas para o mapeamento de outras doenças, algo que pode ser muito útil para as secretarias de saúde”, diz.
O pesquisador ressalta que, além de facilitar a visualização da transmissão de doenças, a ferramenta permite concentrar dados epidemiológicos e de saúde, que geralmente ficam espalhados em diferentes bancos de dados. “Isso auxilia muito no monitoramento. Muitas vezes o gestor público sabe os dados da taxa de transmissão de uma determinada doença. Mas o que isso quer dizer? Geralmente, são apenas tabelas com vários números que não necessariamente querem dizer muita coisa para ele. Por isso é importante reunir uma série de dados e outras informações para que o gestor público possa compreender a situação de uma maneira rápida”, diz.
No trabalho realizado com os dados de Manaus, os pesquisadores também conseguiram dimensionar o impacto da vacinação em novos surtos de sarampo, já que aproximadamente 95% dos casos reportados de sarampo ocorreram em indivíduos que não tinham sido vacinados.
“Uma mensagem importante do nosso trabalho é a importância da vacinação. A análise reforçou que vacina é o melhor jeito de combater epidemias. Em Manaus, a cobertura vacinal contra o sarampo estava baixa já há dez anos. Como a ferramenta permite visualizar onde os casos estão ocorrendo e fazer análises de grupamento de casos, é possível direcionar tanto os esforços para a vacinação, quanto o atendimento de saúde para os bairros mais afetados – medidas importantes para o combate da doença”, diz Nakaya.
A solução, criada pelos cientistas do IPSP, contou também com a parceria do Hospital Albert Einstein, Universidade do Estado do Amazonas, Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado, Universidade de São Paulo, Instituto de Tecnologia da Geórgia e Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas e Instituto Todos pela Saúde (ITpS).
A ferramenta para o monitoramento de casos de sarampo é aberta está disponível online aqui. A partir desse estudo, os pesquisadores disponibilizaram outra ferramenta que pode ser adaptada para qualquer epidemia ou surto, disponível aqui.