O sistema de saúde suplementar brasileiro enfrenta uma crise significativa, com custos crescentes e dificuldades de acesso aos serviços. Neste cenário desafiador, a expansão da cirurgia ambulatorial é uma alternativa promissora, capaz de oferecer benefícios tanto para pacientes quanto para os sistemas de saúde.
Atualmente, apenas 20% a 30% dos procedimentos cirúrgicos no Brasil são realizados em regime ambulatorial, um número muito aquém dos mais de 70% observados em países como Estados Unidos, Canadá, França e Noruega. Esta disparidade levanta uma questão crucial: por que o Brasil ainda não aproveitou plenamente o potencial da cirurgia ambulatorial?
A resposta envolve diversos fatores, incluindo a necessidade de treinamento profissional, infraestrutura adequada e uma mudança de mentalidade entre pacientes e profissionais de saúde, porém, na minha visão, o principal fator é a falta de incentivos adequados para fomentar a migração.
A implementação de incentivos e mecanismos financeiros adequados irá desempenhar um papel crucial na promoção da cirurgia ambulatorial no Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Centers for Medicare and Medicaid Services (CMS) adotou políticas de pagamento que incentivam o uso de centros cirúrgicos ambulatoriais, incluindo taxas de reembolso mais altas e a ampliação da lista de procedimentos elegíveis. Como resultado, mais de 70% das cirurgias eletivas nos EUA são realizadas em regime ambulatorial. Durante o período de 10 anos de 2019 a 2028, estima-se que a economia total projetada do Medicare gerada pelos Centros Cirúrgicos Ambulatoriais seja de $73.4 bilhões.1
Gráfico: Durante o período de 10 anos, de 2019 a 2028, as economias totais do Medicare geradas pelos Centros Cirúrgicos Ambulatoriais deverão ser de 73,4 bilhões de dólares
Na França, o governo implementou incentivos financeiros e mudanças regulatórias, como taxas de reembolso mais altas para procedimentos ambulatoriais e a criação de unidades dedicadas em hospitais. Essas medidas elevaram a participação da cirurgia ambulatorial de cerca de 50% no início dos anos 2000 para mais de 70% atualmente. Esses casos de sucesso demonstram o potencial de incentivos bem elaborados para impulsionar a migração da cirurgia hospitalar para a ambulatorial, gerando economias significativas e melhorando a sustentabilidade do sistema de saúde. O estudo considerou que, quando 70%, do grupo de 11 procedimentos avaliados, fosse realizados em regime ambulatorial, de 2019 à 2023, a economia seria de €73,3 milhões.2
Ora, por qual razão, os decisores do setor público e privado destes e diversos outros países, adotaram políticas similares, pagando mais ao prestador, quando os procedimentos são realizados em regime ambulatorial? A resposta curta é: Porque custa menos, sem comprometer a qualidade e a segurança.
São incontáveis e crescentes experiências positivas com o modelo, por todo mundo. Precisamos enfatizar que benefícios potenciais são enormes e merecem atenção, especialmente em momentos de crise, onde soluções comprovadamente eficazes e custo-efetivas devem ser colocadas em prática com a máxima urgência. Quem serão os decisores com coragem de abraçar a mudança? O tempo dirá.
Para que a cirurgia ambulatorial possa expandir-se de forma sustentável no Brasil, é fundamental que sejam implementadas políticas e regulamentações adequadas. Isso inclui a criação de diretrizes específicas e critérios de qualidade e segurança para esses procedimentos.
A expansão da cirurgia ambulatorial no Brasil representa uma oportunidade significativa para melhorar a eficiência e a qualidade do atendimento no sistema de saúde suplementar. Com a implementação adequada de políticas, treinamento, infraestrutura e acima de tudo incentivos, é possível alcançar resultados semelhantes aos observados em países desenvolvidos, beneficiando pacientes, profissionais de saúde e o sistema como um todo.
Ao enfrentar os desafios e aproveitar as vantagens da cirurgia ambulatorial, o Brasil pode dar um passo importante em direção a um sistema de saúde mais eficiente, acessível e centrado no paciente. A SOBRACAM (Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial), vem trabalhando neste sentido, buscando abrir para essa transformação, com esforços coordenados de todos os envolvidos, para que os benefícios potenciais tornam essa jornada não apenas necessária, mas também altamente recompensadora.
Estamos prontos para essa mudança? Ou continuaremos presos a modelos ultrapassados enquanto o mundo avança em outra direção? A cirurgia ambulatorial é mais do que uma tendência; é um chamado à ação para repensarmos e aprimorarmos nosso sistema de saúde. Você fará parte deste despertar necessário para transformar a saúde no Brasil?