A medicina personalizada tem sido uma aliada no tratamento de diversos tipos de câncer – área onde é possível ver os maiores avanços -, doenças cardiovasculares (infarto e acidente vascular cerebral), neurodegenerativas (doença de Parkinson e Alzheimer) e síndromes metabólicas.
“Na oncologia, por exemplo, 15% das terapias são guiadas pela genômica, onde painéis genéticos apontam se determinado paciente irá responder ou não a uma medicação. O impacto clínico da medicina personalizada nesse paciente é evidente”, diz Renato Vieira, diretor Executivo, Médico, Ensino e Pesquisa na BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Esses avanços têm levado as empresas de saúde, como hospitais, laboratórios e operadoras, a buscarem maneiras de se adaptar a essa nova realidade para que inovações tecnológicas no campo do diagnóstico e do tratamento possam ser oferecidas aos pacientes.
Gustavo Riedel, diretor de Genômica Latam da Dasa, conta que o laboratório vem desenvolvendo testes e avançando na medicina personalizada. Alguns exemplos citados por ele são as triagens neonatais – como o NIPT (teste pré-natal não invasivo) –, que ampliaram as possibilidades de diagnóstico.
“Os painéis e exomas completos que fazemos – que analisam regiões codificadoras do genoma humano para identificar variantes que possam estar relacionadas com a doença do paciente – estão cada vez mais abrangentes. Esses avanços se devem aos métodos de sequenciamento de nova geração (NGS), tecnologias que diferenciam os serviços que oferecemos”, comenta.
Para atender às demandas cada vez maiores na medicina personalizada, a Dasa Genômica tem trabalhado na otimização de processos, utilizando novos sistemas e equipamentos de última geração, buscando com isso aumento da eficácia, o que contribui, consequentemente, na visão de Riedel, para um aumento do acesso.
O Grupo Sabin também tem apostado na medicina personalizada adotando novas tecnologias diante da crescente utilização da análise genômica. O Sabin vem incorporando abordagens baseadas em dados genômicos e personalização de tratamentos por meio de várias estratégias.
“Investimos em tecnologias de ponta para análise genômica e formamos parcerias estratégicas com instituições de pesquisa e empresas de biotecnologia; desenvolvemos painéis genéticos personalizados para doenças específicas; investimos na educação e capacitação dos profissionais para interpretação dos dados genômicos; adotamos uma abordagem centrada no paciente, oferecendo explicações sobre os exames e os resultados feita por médicos geneticistas e outros especialistas; e expandimos nossos serviços de genômica para atender à demanda crescente por testes genéticos personalizados”, explica Gustavo Barra, coordenador do setor de Genômica do Sabin Diagnóstico e Saúde.
O alto custo da medicina personalizada ainda é um impeditivo para que as terapias sejam ofertadas a um maior número de pessoas e também uma preocupação para os players de saúde.
“A cada dia surgem novas tecnologias que oferecem tratamentos e exames mais eficazes. No entanto, isso exige altos investimentos, porém o setor de saúde suplementar passa, atualmente, por um cenário bem delicado. Entretanto, é imprescindível incorporar novas terapias, cirurgias e aparelhos de diagnóstico para se manter competitivo. Conseguir equilibrar essa equação não é fácil, mas quem conseguir vai ocupar um papel de protagonista no mercado”, analisa Luiz Paulo Tostes Coimbra, presidente da Unimed Nacional.
Na BP, a busca pela sustentabilidade passa pela indicação e uso das novas tecnologias com base em evidências. Os critérios para o uso da terapia CAR-T, por exemplo, em oncologia, são rígidos. “As equipes envolvidas no tratamento do paciente se reúnem semanalmente para avaliar as indicações, sempre buscando garantir que a medicação seja ofertada ao paciente com base em evidências científicas.”
Vitor Asseituno, CEO da Sami Saúde, diz que, para manter as contas equilibradas diante do cenário de medicina personalizada, as operadoras de saúde podem investir em programas de gerenciamento de doenças crônicas, promover a prevenção e detecção precoce de condições de saúde e adotar tecnologias que melhorem a eficiência operacional. “No caso de síndromes genéticas, também investir em aconselhamento genético para as famílias.”
Para as operadoras, Asseituno aponta ainda como dificuldades a serem vencidas a mudança de cultura, porque parte da população está acostumada a associar quantidade a qualidade, e acaba considerando melhores os tratamentos que incluem dezenas de exames e passagem por diversos especialistas - e não os cuidados mais coordenados, que consideram o histórico, os sintomas ou rotina de cada pessoa, numa personalização de fato, com resolução assertiva.
Mas há ainda outros entraves a serem enfrentadas, na opinião de Vieira, como a necessidade de desenvolver uma cultura científica na população e a fragmentação do sistema de saúde, que não permite que um paciente tenha acesso a todo o seu histórico médico.
“Isso nos leva a uma realidade na qual o indivíduo não pode fazer escolhas em relação ao seu tratamento e, indo além, desconhece o desempenho do hospital em que está sendo tratado. Essa transparência é fundamental para que o sistema de saúde possa evoluir”, comenta ele.
Na área laboratorial, os desafios estão na integração da medicina genômica aos serviços, além da complexidade dos dados genômicos. “A integração de sistemas, os custos elevados dos testes genéticos e a necessidade de aumentar o conhecimento do público são temas sobre os quais estamos avançando”, aponta Barra.
Se os desafios são muitos, por outro lado existem oportunidades, como a personalização do tratamento, prevenção e detecção precoce de doenças, expansão de serviços, colaborações e parcerias para impulsionar a inovação e iniciativas de educação e conscientização sobre a importância da genômica para a saúde. “Os desafios destacam a necessidade de uma abordagem estratégica e adaptativa na adoção da medicina genômica nos serviços de saúde”, diz Barra.
Segundo Coimbra, com o uso da medicina personalizada em uma crescente, se torna cada vez mais improvável que uma empresa consiga se manter competitiva sem parcerias. “Por isso entendo que o futuro do setor de saúde passa pela consolidação de parcerias. Trabalhar em conjunto com outras empresas é a melhor alternativa para que se possa entregar o que há de mais moderno na medicina, mantendo a sustentabilidade da saúde suplementar.”
Para as operadoras, Asseituno avalia que as oportunidades disponíveis incluem a possibilidade de diferenciar-se no mercado por meio de abordagens inovadoras, atração e retenção de clientes por cuidados mais personalizados e a utilização de tecnologia para otimizar processos e reduzir custos operacionais.
Vieira destaca ainda a importância da parceria com as operadoras para que seja ofertado ao paciente o melhor tratamento, e com empresas de terapia celular e instituições de ensino, como a Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto, que atualmente está focada no desenvolvimento de uma terapia CAR-T totalmente nacional, instituições das quais a BP tem se aproximado.
“A busca por parcerias, reunindo a expertise de diversos atores no cenário da saúde, é fundamental. Aqui na BP, buscamos nos unir a empresas de biotecnologia – porque em uma instituição hospitalar não conseguimos desenvolver um novo sequenciador, por exemplo. Precisamos também do apoio da indústria farmacêutica, para o desenvolvimento de novos medicamentos, e de parceria com operadoras de saúde para viabilizarmos a oferta das terapias mais modernas.”
Ele também destaca o papel da união com instituições governamentais – para um melhor entendimento em relação à absorção das novas tecnologias -, com Organizações Não Governamentais (ONGs) e instituições de ensino. “Precisamos compor um ecossistema para criarmos uma nova forma de assistência.”
A Unimed também caminha na direção da aproximação com os principais atores do cenário de saúde, e destaca uma joint venture com a Oncoclínicas. “Há um horizonte de oportunidades tanto do ponto de vista da nossa rede própria quanto incorporação de tecnologias, como biomarcadores e testes genéticos, para diagnóstico e tratamentos de câncer na parceria com a Oncoclínicas”, destaca Coimbra.
São inúmeros os avanços nas iniciativas de sequenciamento genético da população, no entanto, o que especialistas observam, na área de medicina personalizada, é que é preciso olhar agora para a formação dos profissionais de saúde, que é essencial para a expansão da genômica.
Na opinião de Asseituno, ainda são poucos os médicos preparados para receber um paciente no consultório com seu perfil genômico e saber como utilizar essa informação.
Atividades educacionais voltadas para médicos prescritores das mais diversas especialidades e profissionais de assistência multidisciplinar em saúde são o ponto de partida para disseminar a medicina genômica e a sua aplicabilidade em diagnósticos e tratamentos.
“Nossos especialistas apontam a importância da educação médica nessa área, promovendo a capacitação dos médicos geneticistas, mas também de outras áreas, para disseminar a medicina genômica e a sua aplicabilidade em diagnósticos e tratamentos nas mais diversas patologias, além de discutir as principais inovações e frentes de trabalho da área”, comenta Riedel.
Assim como Asseituno, em relação ao tema capacitação, Barra comenta sobre a necessidade de preparar profissionais para a interpretação de dados genômicos, incluindo conteúdos de genômica nos currículos de graduação e pós-graduação em Ciências da Saúde, oferecendo cursos de educação continuada, proporcionando treinamento prático em laboratórios e centros de pesquisa, desenvolvendo competências em bioinformática, estabelecendo equipes multidisciplinares com especialistas em genética, implementando ferramentas de suporte à decisão clínica baseadas em inteligência artificial, criando programas de certificação e credenciamento e incentivando a participação em pesquisas genômicas.
Seguindo essa tendência de necessidade de capacitação profissional, a BP passou a oferecer, desde 2023, dois cursos de pós-graduação na área: Medicina Genômica com Ênfase em Oncologia e Multiprofissional em Genética e Genômica. “Nossa visão é a de preparar os alunos para a medicina do amanhã. Queremos contribuir para a formação de especialistas que detenham conhecimentos sobre inteligência artificial, genômica, entre outros temas que estão norteando os novos rumos da saúde”, destaca Vieira.
Por fim, ele aposta que os investimentos em medicina personalizada contribuirão para a sustentabilidade do sistema de saúde. “Além do melhor desfecho clínico, temos uma redução do tempo de permanência do paciente no hospital. A medicina de precisão nos permite filtrar o paciente que tem melhores chances de resposta com uma terapia, reduzindo imensamente os custos. No passado, no tratamento oncológico, por exemplo, oferecia-se uma mesma medicação para 100 pacientes e 40 se beneficiavam. Hoje, se 40 a recebem, todos podem se beneficiar.”