“Vivemos uma doença: a falta de integralidade”
19/06/2015 - por Verena Souza

Chegou a hora de resgatar a visão integrada e sistêmica para conseguir tratar o paciente com efetividade e ser sustentável. Esse foi o recado de Osvaldo Barrios, ex-ministro da Saúde do Chile (2002/2003) e, hoje, integrante da Organização Pan-Americana da Saúde do México, país onde reside.

“O que aconteceu com a gente? Não existe outro tipo de saúde a não ser a integral. Vivemos a doença da falta de integralidade. Continuamos vendo órgãos, peças, apenas partes. Não pensamos holisticamente e sistemicamente, não enxergamos a pessoa, vemos tudo descontextualizado”, afirmou com eloquência Barrios durante o Congresso de Gestão em Saúde, parte da programação do Fórum Hospitalar 2015, nesta quinta-feira (21).

Os serviços de saúde brasileiros foram construídos sob uma visão fragmentada e as inconsistências decorrentes disso pressionam as instituições do setor por uma mudança urgente. “AMAs e UPAs são besteira. Criamos uma realidade fragmentada para atender a demanda, voltada para atender fragmentos de doença. Não olhamos o ser humano como um ser integral”, disse o Superintendente do Hospital Sírio Libanês, Gonzalo Vecina Neto, e coordenador científico do Congresso.

A construção de unidades de saúde de maneira desintegrada e as diretrizes clínicas, muitas vezes, norteadas por esse olhar pontual e limitado, são reflexo de relações também separadas. “Temos feudos dentro das instituições hospitalares. Os cardiologistas não conversam com os nefrologistas, que também não falam com os neurologistas e assim por diante. Cada um quer fortalecer a sua própria identidade, o seu quadrado, e nessa luta de fortalecer papeis estamos perdendo a capacidade de trabalhar em conjunto”.

Na visão de Barrios, a saúde integral não vai acontecer enquanto os feudos não forem quebrados. “Temos que nos convencer e acabar com essas barreiras auto-impostas. Ir além, tirar esse arame farpado que nos separa”, disse ele “chacoalhando” a plateia.

A pergunta que fica é: e será que queremos? Para Jorge Reboredo, da Sociedade Latino-americana de Auditoria de Serviços de Saúde (Argentina), “os médicos nunca quiseram essa história de equipe multidisciplinar”.

A partir de uma formação acadêmica distante, clamar por um trabalho colaborativo tem sido um grande desafio para o setor. “Temos que deixar de formar médicos longe das enfermeiras, dos nutricionistas (…). Eles têm que se unir, ter currículos compartilhados”, sugeriu Barrios.

Tanto Vecina quanto Barrios mencionaram a importância da atenção primária, dos cuidados preventivos, de equipes multidisciplinares e do fortalecimento do SUS para a construção dessa saúde integral. “Temos que cuidar da experiência do SUS. O SUS é propriedade e valor para toda a América. Se colocarmos o colocarmos em risco, estaremos colocando em risco um valor continental. Deixem de pensar em crise e pensem no SUS”, defendeu Barrios.

Diversos temas relativos à Saúde foram discutidos durante a Hospitalar 2015 e, aparentemente, muitas mudanças parecem ser necessárias para que a saúde integral se concretize. Entretanto, o complexo se reduz ao simples quando compreendemos que a visão fragmentada é a raiz de todas as problemáticas do setor. Enquanto esse paradigma não é quebrado, um sistema de saúde que funcione em torno do “paciente integral” ainda fica na esfera do irrealizável.





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