Ocupando cinco andares da sede do Banco Central no centro do Rio de Janeiro, um edifício antigo, em frente ao mercado popular conhecido como Saara, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) fiscaliza e regula o mercado de seguros, previdência aberta e de títulos de capitalização fazendo uso de uma estrutura pequena. O resultado disso é a lentidão na atuação.
O mercado de seguros movimenta R$ 150 bilhões por ano e cresce a um ritmo anual de dois dígitos. O órgão que o regula tem 457 funcionários - sendo que 17% destes estão prestes a se aposentar - e um orçamento anual da ordem de R$ 150 milhões. Para efeito de comparação, a Argentina, cujo mercado de seguros é bem menor que o brasileiro, tem um órgão regulador com mais de 500 funcionários.
Criada em 1966, em pleno regime militar, a Susep segue um modelo considerado ultrapassado pelo mercado e por entidades internacionais, por se tratar de uma autarquia sem as prerrogativas especiais dadas às agências reguladoras modernas. Isso impede o órgão de ter independência frente ao poder Executivo, que pode indicar e exonerar seus dirigentes quando quer, e de ter poder mais efetivo para punir irregularidades.
Em relatório divulgado em dezembro sobre o mercado de seguros brasileiro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) criticou a "estrutura legal que governa a Susep", que teria elementos que minam sua independência e capacidade de cumprir metas. "Não existe regra para a nomeação do superintendente e diretores, e não há requisitos mínimos de qualificação", afirma relatório do FMI. "Os dirigentes são nomeados e podem, a qualquer momento, ser demitidos pelo presidente da República."
As indicações políticas para cargos na autarquia são criticadas também pelo mercado segurador. "Faltam critérios técnicos para a escolha do superintendente, que é baseada em questões políticas", diz o executivo de uma seguradora que pediu para não ser identificado. Ele pondera que em outras autarquias e nas agências reguladoras ocorre a mesma coisa, mas que, em algumas, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), há a preocupação de colocar profissionais técnicos. De fato, a norma que criou a CVM prevê que seu presidente deve necessariamente ter experiência no mercado de valores mobiliários.
O FMI também fez críticas à estrutura da autarquia. Segundo a instituição, apesar de o Congresso Nacional ter destinado 800 vagas de funcionários à Susep, menos de 500 foram aprovadas pelo Ministério do Planejamento.
"De fato, temos muitas deficiências em termos de quadro de pessoal, o que obviamente dificulta nosso trabalho", diz o superintendente da Susep, Luciano Portal Santanna. "A autarquia não tem estrutura e recursos humanos para atender ao mercado", observa outro executivo do setor.
Segundo ele, isso resulta na demora na resposta às companhias quando essas entram com algum pedido na autarquia, por exemplo. O processo de autorização de produtos leva em média quatro meses e o aval para uma resseguradora estrangeira atuar como local (modalidade que tem reserva de 40% de mercado) leva um ano.
Para fazer frente a essas dificuldades e tendo em vista o potencial de crescimento do setor nos próximos anos, Santanna apresentará ao Ministério da Fazenda em meados de março um projeto para mudar a natureza jurídica da Susep e transformá-la em uma agência reguladora com maiores poderes de intervenção no mercado e mais independência em relação ao Executivo. A proposta está sendo trabalhada desde o segundo semestre do ano passado.
"Temos uma estrutura muito enxuta, criada décadas atrás. O mercado se expandiu e a Susep não", disse Santanna. "Os benefícios [da mudança] seriam permitir estabilidade no cargo para os dirigentes da entidade e dar mais poder aos fiscais nas punições por irregularidades", completou.
Também está previsto o fim do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), ao qual a Susep é submetida. O órgão é composto por representantes da Fazenda, da Susep, do Ministério da Justiça, do Banco Central, do Ministério da Previdência e da CVM e é responsável por fixar as diretrizes e normas da política de seguros no país.
"Foi criado um grupo de trabalho para analisar a proposta, que já tem uma versão preliminar, finalizada em dezembro do ano passado", disse Santanna. Participam do grupo servidores da Susep e procuradores da Advocacia Geral da União (AGU).
Em linhas gerais, o projeto prevê a criação da Comissão Nacional de Seguros, agência que substituiria a Susep, e define critérios objetivos para a escolha dos dirigentes da autarquia, prevendo estabilidade no cargo e maior autonomia para decidir.
Na opinião de Jorge Hilário, presidente da Confederação Nacional das Empresas de Seguro (CNSeg), passados quase 50 anos, está na hora de rever as diretrizes do órgão regulador do mercado de seguros. "O decreto-lei que criou a autarquia foi baixado em meio à ditadura, não passou pelo Congresso, foi feito pela burocracia", disse. "A Susep é uma daquelas autarquias clássicas, não é um órgão regulador moderno", criticou.
Entre os pontos fortes da atuação da Susep apontados pelo executivos ouvidos pelo Valor estão o combate à atuação de empresas ilegais (ler mais nesta página) e a regulamentação do requerimento de capital em linha com os padrões internacionais. Semana passada, foram aprovadas regras mais rígidas de capital adicional para as seguradoras.
© 2000 – 2012. Todos os direitos reservados ao Valor Econômico S.A. . Verifique nossos Termos de Uso em http://www.valor.com.br/termos-de-uso. Este material não pode ser publicado, reescrito, redistribuído ou transmitido por broadcast sem autorização do Valor Econômico.
Leia mais em: