Com o avanço da digitalização, adotar uma cultura data driven no ambiente de negócios vem se tornando uma demanda cada vez mais urgente para todas as organizações. Quando avaliamos o mercado de Saúde, essa criticidade ganha diferentes contornos e está intrinsecamente ligada à forma como a informação está distribuída entre diferentes stakeholders.
Isso porque o setor de Saúde possui minimamente três diferentes constituintes: paciente, provedores de saúde e pagadores. E, atualmente, cada um desses agentes toma decisões a partir do seu próprio interesse e conjunto de informações, o que torna o ecossistema do setor desequilibrado no Brasil e, por vezes, acarreta decisões não muito alinhadas ao melhor desfecho clínico do paciente.
Para construir um ambiente sustentável de toda essa cadeia, é necessário pensar em um ecossistema com maior transparência de informações entre as partes. Ou seja, os stakeholders devem mensurar e compartilhar dados sobre desfechos clínicos, a fim trazer um maior alinhamento dos incentivos. Desta forma, será possível tornar as decisões de saúde centradas em qualidade, com utilização de dados como viabilizadores de resultado clínico e econômico do setor.
Cientes desses desafios e possibilidades, algumas organizações já estão com iniciativas concretas de transformação no mercado, mesmo que ainda de forma incipientes. A pandemia, nesse sentido, propiciou quebras de paradigmas e barreiras muito importantes para que a agenda transformacional ganhasse relevância no setor.
Cito aqui, dentro das organizações provedoras de serviços de saúde, três áreas prioritárias na agenda transformacional do segmento e que tem como viabilizador central o uso dos dados.
Para viabilizar novos modelos de remuneração baseados em valor, provedores de saúde precisam desvendar o black box, ou seja, saber exatamente o que funciona, qual o valor de cada insumo e decisão, bem como qual a interação entre eles. Desta forma, é possível otimizar a combinação de insumos, recursos e processos dentro dos produtos e serviços oferecidos por uma instituição de saúde.
Uma vez que essa quebra de silos ocorra, com maior visibilidade sobre performance de protocolos e de contratos, uma experimentação com novos modelos de remuneração pode ocorrer de forma orgânica e trazer um maior alinhamento de incentivos entre stakeholders.
O movimento para criação de um ecossistema de saúde integrado no país já está acontecendo. Há algumas organizações que começaram a integração de diferentes ofertas de serviços (serviços diagnósticos, serviços hospitalares, consultórios médicos, etc.) com o objetivo de acompanhar fim a fim a jornada do paciente e viabilizar a coordenação do cuidado entre níveis de atenção.
Apesar disso, essa iniciativa está apenas começando no Brasil e esbarra no desafio de centralizar dados que estão distribuídos em diversos sistemas proprietários – estes alocados em cada prestador de serviço. E para que esse movimento tenha sucesso, as organizações vão precisar de dados longitudinais dos pacientes para colocá-los em linhas de cuidado e, consequentemente, navegá-los por meio de uma jornada otimizada. Essa coordenação é fundamental para eliminar gaps de tratamentos entre níveis de atenção, o que possibilita a implementação de protocolos de screening baseados em evidências para maior prevenção.
O avanço da digitalização e de novas tecnologias, como sensores e IoT, tem permitido que provedores de saúde possam inovar e oferecer serviços para atender necessidades não contempladas no modelo atual. Um exemplo desse movimento são os cuidados com doenças crônicas e mentais, que estão muito mais relacionadas a fatores comportamentais, sociais e genéticos.
Os tratamentos necessários para essas doenças requerem um gerenciamento e monitoramento do usuário, com um cuidado contínuo e a distância, que possibilita tomar ações de prevenção e promoção à saúde, além de um maior engajamento do paciente. A criação de programas deste nível de acompanhamento depende de uma plataforma única que viabilize o workflow de equipes de cuidado, comunicação entre profissionais e pacientes, integrando dados mais atualizados de toda a jornada de saúde.
Essas três agendas transformacionais dependem intrinsecamente da construção de um ecossistema de dados que permita com que organizações de saúde utilizem informações de forma escalável, orgânica e sistêmica.
*Patrícia Meirelles é gerente de Consultoria de Negócios da Logicalis.