A demanda elevada e o consequente aumento dos custos dos tratamentos tiveram impacto importante para a Santa Casa, aumentando o déficit SUS. “Do ponto de vista da sustentabilidade financeira da Instituição, este foi um ano especialmente desafiador. O represamento de atendimentos vivido ao longo da pandemia fez com que muitos pacientes, em especial aqueles vinculados ao SUS, voltassem a buscar assistência com condições agravadas de saúde, o que acarretou uma demanda muito acima da média e a consequente majoração dos custos dos tratamentos, ocasionando um crescimento ainda mais importante do já conhecido déficit SUS, fechando o ano em torno de R$ 170 milhões”, explica.
Por outro lado, ocorreram conquistas de relevância, a nível institucional e nas áreas de inovação, assistência e na obtenção de acreditações. “Institucionalmente, são motivo de orgulho todas as iniciativas – como o movimento Chega de Silêncio – realizadas em defesa das Santas Casas e hospitais filantrópicos, responsáveis por mais de 51% dos atendimentos aos pacientes do SUS no país. Também celebramos a regulamentação da Telemedicina, agora praticada em bases legais definidas e que representa um grande ganho para a saúde pública”, comemora.
“Gostaria de poder celebrar, mas os avanços foram tímidos e ainda não efetivados, tais como o PL 7/2022, que prevê R$ 2 bilhões para custeio, e o PEC 127/2022, que viabiliza recursos para pagamento do piso nacional da enfermagem, ambos aprovados e ainda não liberados, mesmo imprescindíveis frente às demandas reprimidas pós-pandemia. ”
Segundo Matos, a inovação tem sido um fator de transformação cada vez mais presente na Santa Casa. “Internamente, um aspecto que entendo fundamental mencionar é que a Santa Casa tem buscado, ao longo dos últimos anos, e com especial ênfase no ano recém encerrado, consolidar a inovação como um valor na organização, traduzindo-a em ações e soluções práticas que tragam melhorias em seus processos assistenciais e de gestão, com ganhos incrementais focados na melhoria constante da experiência do paciente e na sustentabilidade da instituição. Pode parecer curioso, mas hoje temos em nosso DNA – mesmo sendo uma instituição com 219 anos de existência – a perspectiva da inovação como elemento chave para o presente e como diretriz para o futuro. ”
“Em termos estruturais, buscamos ampliar o nível de profissionalização e o escopo de atuação de nosso Centro de Inovação, em funcionamento desde 2019, uma estrutura criada com o objetivo de captar projetos de inovação que venham de alguma maneira reduzir o déficit SUS, por meio de soluções que melhorem a experiência do paciente, segurança, empoderamento médico e assistencial, qualidade assistencial, captura de valor em projetos, eficiência operacional, criação de novos produtos e sustentabilidade para o negócio, sempre integrado com o Escritório de Valor.”
“Objetivamente com relação às nossas conquistas, colocamos em curso neste ano um Programa de Gestão da Inovação, uma formação de lideranças da Instituição para adesão à cultura de inovação, estimulando que todas as áreas fomentem dentro de suas equipes melhorias que gerem valor para os pacientes. ”
“Na prática, entre os inúmeros projetos e soluções colocadas em monitoramento e avaliação de viabilidade, vale mencionar alguns que já estão em pleno funcionamento e trazendo retornos tangíveis à organização”, completa o Diretor-geral.
Várias iniciativas relacionadas à cultura de inovação e transformação digital foram citadas por Matos. “Nos processos administrativos, a solução Multichannel (Whatsapp + chatbot), que é a digitalização dos canais de agendamento de consultas e exames, permitiu melhorar o atendimento ao paciente, desonerando as atividades humanas (autoagendamento pelo bot) e gerando ganhos expressivos na reocupação das agendas que teriam no show, com impacto direto na geração de receitas. Já a ferramenta Overmind, que automatiza os processos de autorização e elegibilidade de pacientes, nos proporcionou significativos ganhos de tempo em diversas atividades assistenciais. Outra importante implantação foi a HFOCUS, que nos permitiu a digitalização da pesquisa de satisfação para avaliação dos serviços, abrindo a possibilidade de benchmarkings e a gestão de indicadores críticos de forma muito mais eficiente. ”
“Na área assistencial, implementamos a solução Transição do Cuidado, um aplicativo para transferência de pacientes da emergência para as unidades de internação de forma ágil e segura, com foco integral na melhoria da experiência do paciente. Na área da oncologia, o Painel de Gestão de Tempos da Quimioterapia permite maior agilidade no atendimento dos pacientes e proporciona uma melhora na jornada do paciente em quimioterapia. Outra solução importante é a Justmiine, uma plataforma de manejo remoto de pacientes que inclui componentes de telemedicina, navegação, monitoramento remoto e protocolização do cuidado desde pacientes crônicos e de medidas preventivas até cuidado cirúrgico e oncológico. ”
“Há ainda uma série de outras soluções inovadoras já em andamento ou implementação, como o APP Hotelaria, que nos permite ganhos importantes de tempo nos processos de higienização e redução de perdas com tempo de espera, o Projeto Upflux, dirigido à gestão de leitos, ou a How.AI, inteligência artificial que auxilia médicos e profissionais da saúde a encontrarem pacientes elegíveis para as linhas de cuidado e para os estudos de pesquisa clínica, integrado com o centro de pesquisa”, completa.
“E vale mencionar também a consolidação, ao longo deste ano, de importantes soluções inovadoras implantadas anteriormente, entre elas o robô Laura, que monitora em tempo real os sinais de deterioração clínica dos pacientes; a NoHarm, inteligência artificial que atua nas prescrições fora do padrão, gerando muito mais segurança para os pacientes e 8x mais produtividade das farmácias clínicas; a Stargrid, uma solução inteligente para digitalização na geração de escalas de trabalho, atingindo mais de 6 mil usuários, com ganho de tempo estimado em 8h/mês para gestores e uma hora/mês para colaboradores; e a solução DR TISS de atendimento virtual para telemedicina, com significativa redução de tempo de atendimento, contágio e filas.”
“Em resumo, talvez a grande conquista seja de fato a disseminação da cultura de inovação transversalmente dentro da Instituição, movimento que julgamos fundamental para a melhoria constante da experiência do paciente e para a sustentabilidade da Instituição no médio e longo prazos.”
No terreno das acreditações, mantivemos a ONA Nível III nos hospitais de Porto Alegre e atingimos a certificação Nível I no Hospital Dom João Becker, em Gravataí, motivo de grande orgulho para nós, medida em que aquela Unidade está passando por um processo de profunda reestruturação de seus processos assistenciais e de gestão.”
Principais investimentos previstos para 2023: Entrega do Hospital Nora Teixeira é destaque
“Fundamentalmente focado na sustentabilidade de longo prazo da instituição, o novo ciclo de planejamento e gestão prevê para o próximo ano a entrada em funcionamento do novo Hospital Nora Teixeira, que terá importância estratégica para a sustentabilidade da instituição, gerando – pelo atendimento de pacientes particulares e convênios – receitas fundamentais para o equacionamento do déficit gerado pelo atendimento ao SUS, de cerca de R$ 170 milhões ao ano.”
“Com entrega prevista para 2023, o Hospital Nora Teixeira terá um custo total de R$ 255 milhões, em grande parte com recursos da sociedade, com impulso inicial de R$ 80 milhões de Alexandre Grendene e Nora Teixeira, além de doações da sociedade civil, organizações empresariais e instituições públicas e privadas”, pontua.
“Além do novo hospital, também deverá ser entregue uma obra que chamamos “Rua da Saúde”, uma via interna, coberta e com remodelação urbanística, que trará modernidade arquitetônica e melhorias importantes para a circulação das mais de 20 mil pessoas que aqui transitam diariamente. Em outra frente, um novo sistema de acessibilidade que integrará todos os hospitais do complexo Santa Casa por meio de passarelas aéreas climatizadas também terá as obras finalizadas, representando um importante avanço para os usuários e colaboradores da instituição”, adiciona Mattos.
“O fato é que os investimentos superiores a R$ 500 milhões realizados nos últimos 4 anos, em grande parte fruto de generosas doações, ampliaram a base de sustentabilidade da Instituição para a continuidade da entrega de seu propósito, com a adequação e modernização de estruturas e tecnologias à medicina de alta complexidade aqui praticada é referência no país”, entende.
Eficiência: Relacionamento Comercial, Inteligência de Mercado, Experiência do Paciente, Mapa Estratégico da Experiência do Paciente e outras iniciativas
A busca pela eficiência tem sido elemento prioritário para a gestão da Santa Casa. Matos cita as principais ações adotadas: “No ano que passou, demos início a uma reestruturação em nossa área comercial, buscando fundamentalmente o aprimoramento dos processos de vendas e relacionamento com as operadoras de saúde e o desenvolvimento de produtos e serviços adequados às novas demandas do mercado. Como exemplo, vale mencionar o significativo crescimento da cirurgia robótica, que atingiu a marca de 500 cirurgias em menos de dois anos na Santa Casa.”
“Ainda neste sentido, também criamos uma nova área de Inteligência de Mercado, voltada ao estudo de mercado, aperfeiçoamento dos modelos de remuneração com as operadoras de saúde complementar e a ampliação da oferta de produtos e serviços médico-assistenciais. “
“Concomitantemente, a geração de valor com ensino e pesquisa, a qualificação da experiência do paciente e a inovação para geração de ganhos incrementais estarão cada vez mais integradas ao nosso dia a dia, consolidando bases seguras para o exercício profissional de nosso qualificado Corpo Clínico. ”
“Além disso, como já mencionado anteriormente, temos o objetivo de manter e incrementar a Inovação como elemento estratégico de gestão, dando ainda mais ênfase nos próximos anos. Em 2022, estruturamos uma área centrada na geração de valor em saúde e na experiência do paciente. Denominado Escritório de Valor, foi criado com o objetivo fundamental de reduzir variabilidade nos processos, padronizar medidas de desfecho e custo, criar propostas de novos modelos de pagamento baseados em valor, redesenhar a jornada do paciente com base na coordenação integrada, garantir que as plataformas de TI estejam alinhadas à Agenda de Valor, o que significa, na prática, uma perfeita integração e sintonia com a Inovação. ”
Matos explica que entre os projetos iniciados e que serão alvo de ainda maior ênfase da gestão, estão o Programa 60+, a Gestão do Cuidado por Linhas Assistenciais e a Construção do Mapa Estratégico da Experiência do Paciente. “Todos estes projetos com o envolvimento da alta direção, criação de times de governança em experiência e diversas ações de fortalecimento da cultura e boas práticas”, afirma.
“A Santa Casa do futuro” e as diretrizes estratégicas para o ciclo 2023
“Sem dúvida alguma, a conclusão das grandes obras em desenvolvimento na Instituição – por exemplo, Hospital Nora Teixeira, Rua da Saúde, novo sistema de acessibilidade por passarelas, entre outras – está no centro de nossa atenção, devendo todas estarem em pleno funcionamento ao longo de 2023”, reforça o Diretor-geral da Santa Casa.
“A questão comercial, já mencionada, também é um eixo importante, que deverá ser pautado pela diversificação de produtos e serviços, tanto de natureza assistencial quanto aqueles dirigidos à prevenção da saúde, bem como a ênfase em parcerias que viabilizem processos e serviços inovadores e de qualidade para o mercado. ”
“No âmbito assistencial, há uma importante diretriz focada na consolidação de modelos para aperfeiçoar a segurança dos processos assistenciais, de forma a qualificar ainda mais as condições de trabalho de nossos profissionais e, prioritariamente, a experiência do paciente. ”
“Outro ponto fundamental que será alvo de nossa atenção é o que chamamos “organizar a Santa Casa do futuro”, estabelecendo modelos transparentes de sucessão, de forma a garantir a segurança e a perenidade institucional e de serviços. ”
Tendências que ditarão os rumos da saúde e a atuação da Santa Casa
“Acreditamos que as fusões, com a consolidação de grandes conglomerados de saúde, deverão ainda ocorrer, o que acarretará naturalmente uma série de outras mudanças no mercado. Hospitais como a Santa Casa deverão estabelecer e consolidar alianças que permitam a sua sustentabilidade no médio e longo prazos”, explica.
“Outro aspecto diz respeito ao comportamento dos consumidores. Cada vez mais, a escolha de prestadores de serviços se dará pela qualidade das entregas, medidas especialmente pela qualidade dos desfechos assistenciais. Naturalmente, neste processo caberá aos prestadores de serviços dar transparência de seus resultados para a sociedade, desenvolvendo relações de confiança e compromisso com as pessoas. E devemos somar a isto o fato de que as pessoas, cada vez mais, buscarão instituições com propósitos, com entregas e engajamento real com a sociedade”, completa.
“Neste mesmo sentido, vejo que o mercado comprador será cada vez mais exigente na tomada de preços e avaliação de custos, também demandando transparência das Instituições.”
“Ainda num futuro próximo, acredito que a inteligência artificial estará cada vez mais presente como fator de segurança para os processos assistenciais, e haverá grandes investimentos na prevenção da saúde, com uma rápida evolução da genética e do mapeamento de tendências de doenças”, adiciona.
“Por último, vejo que o setor privado será crescentemente parceiro do setor público em soluções assistenciais, especialmente no que tange à atenção primária à saúde, como já vemos atualmente. ”
Gargalos que devem ser foco de atenção dos governos e das organizações de saúde em 2023
“Sem dúvida alguma, o equacionamento da questão do déficit SUS permanecerá no centro das atenções da saúde no país. Já é mais do que chegado o momento de haver uma solução objetiva e duradoura para o financiamento da saúde pública, desonerando os prestadores de serviços do SUS – em especial hospitais filantrópicos e Santas Casas – desta responsabilidade de pagarem uma conta que não é sua na origem. Aqui, no Rio Grande do Sul, ainda temos a questão do IPE, que vive um momento conturbado, mas que deverá levar a um debate resolutivo sobre seu modelo de contratualização, de forma a se tornar sustentável no tempo, sob pena de desassistência de uma grande parcela de gaúchos”, entende.
“Mas celeridade é a palavra que se impõe agora. O cenário macro indica a necessidade premente de maior equilíbrio entre políticas econômicas e sociais, com ênfase na saúde, educação e assistência social, razões de existir desta Santa Casa. ”
“Assim, é fundamental retomarmos uma capacidade mínima de investimento com recursos próprios. De um lado, pelo equacionamento dos déficits crescentes, notadamente do SUS, superior a R$ 160 milhões/ano, e do IPE Saúde. De outro, pela valorização do sistema suplementar de saúde, aprimorando relacionamentos e ampliando a acessibilidade para convênios e particulares, cujas escolhas pela Santa Casa contribuem para o desenvolvimento do papel social da Instituição”, defende.
Agradecimentos
“Gostaria de agradecer formalmente a todos aqueles que, de alguma forma, ajudaram a Santa Casa a completar mais um ano cumprindo sua missão de entregar saúde de qualidade à sociedade, com especial ênfase aos nossos colaboradores e ao nosso corpo clínico, um conjunto de profissionais que nos orgulha e faz acreditar numa Santa Casa cada vez mais forte a cada ano”, finaliza Matos.