O Patient Blood Management (PBM) é definido como um conjunto de cuidados com base em evidências para otimizar os resultados médicos e cirúrgicos dos pacientes, gerenciando e preservando clinicamente o sangue do próprio paciente. O gerenciamento de sangue se concentra nas necessidades do paciente e nas condições que geralmente levam a transfusões, tais como perda de sangue, coagulopatias, disfunção plaquetária e anemia. Além disso, requer uma abordagem multiprofissional e multidisciplinar e visa o uso racional dos produtos sanguíneos dentro do ambiente hospitalar.
Pesquisas apontam que a transfusão sanguínea está na lista dos cinco procedimentos mais realizados no mundo. Além de alto custo, esse tipo de procedimento implica em malefícios para o paciente. Como um órgão transplantado, o sangue é visto como um “invasor” pelo organismo, por isso, quanto maior o número de transfusões, mais consequências para o paciente. Entre elas estão possíveis inflamações em órgãos vitais, mais complicações no pós-operatório, tempo ampliado de internação, entre outras ocorrências1.
A Society for the Advancement of Patient Blood Management (SABM) relata uma importante situação sobre a pertinência da hemostransfusão quando considerado a melhora dos resultados clínicos do paciente. Neste cenário, a entidade relata que 59% das hemotransfusões foram consideradas inapropriadas para o benefício clínico do paciente, ao passo que somente 12% foram consideradas apropriadas, e, as demais, incertas.
Segundo ainda a SABM, o gerenciamento do sangue do paciente pode reduzir eficazmente: índice de mortalidade (até 68%), reoperações (até 43%), readmissões hospitalares (até 43%) e complicações (até 41%). Estes índices trazem ainda o benefício da redução de custos de 10 a 24%2.
Essas são medidas de gestão que compreendem diferentes processos pré, intra e pós-operatório, principalmente nos pacientes críticos. Uma delas consiste em identificar precocemente os doentes com anemia, permitindo tratar a deficiência de ferro antes da cirurgia, eliminando assim a necessidade de uma possível transfusão.
Há vários ensaios clínicos randomizados que demonstraram melhores desfechos clínicos utilizando princípios do PBM. Entre os principais benefícios dos PBM encontrados nos mais diversos estudos ao redor do mundo estão a redução das transfusões de sangue, do tempo de internação hospitalar, das complicações como insuficiência renal aguda, infecção, eventos tromboembólicos e redução da mortalidade.
Outra estratégia visa identificar e tratar antecipadamente pacientes com alterações de coagulação sanguínea. Também é possível recorrer a outros tipos de recursos que podem prevenir ou conter sangramentos durante e após a cirurgia. Entre as alternativas, estão o uso recorrente dos selantes (impedem o sangramento e vedam vazamentos) e os hemostáticos (interrompem o sangramento intraoperatório e interagem com a cascata de coagulação). Os objetivos podem ser alcançados através dos chamados três pilares do PBM, que são estratégicos para implementar a mudança de paradigma do PBM: otimizar a eritropoiese do paciente, minimizar o sangramento e aproveitar e otimizar a reserva fisiológica específica de pacientes com anemia.
A pandemia de Covid-19 impôs um cenário de desafios que afetaram os sistemas de saúde em todo o mundo. Um dos maiores deles foi a queda acentuada nos estoques de sangue nos principais hemocentros, o que tornou a implementação do Gerenciamento de Sangue do Paciente nos hospitais um fator urgente e essencial. A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem incentivando os governos e hospitais a adotarem?o Programa como forma de controlar a escassez de sangue, e solicitou oficialmente aos seus Estados membros, a implementação destes projetos desde 2010.
1. Aryeh S. A Global Definition of Patient Blood Management. Anesth Analg. 2022;10.1246.
2. Society for the Advancement of Patient Blood Management. Executive PBMP Slide Deck.; 2020.
*Guilherme Rabello é gerente no InovaInCor, Núcleo de Projetos de Inovação do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMUSP.