A resposta é não. Para se ter uma ideia, três em cada dez brasileiros nunca foram atendidos por um médico. O cenário fica ainda mais complicado quando levamos em consideração que mais de 90% dos centros de exames do país são privados, como apontam dados do IBGE. Essa defasagem compromete o tratamento adequado das doenças, já que a maioria das decisões médicas levam em conta o diagnóstico de exames laboratoriais. Também dificulta o acompanhamento de doenças crônicas, como colesterol ou diabetes, maiores fatores de risco à saúde no Brasil.
Além disso, o acesso à saúde pode ser ainda mais limitado quando analisamos as regiões do país. Enquanto Sul e Sudeste têm mais apoio e infraestrutura, as demais regiões sofrem de um acesso precário que resulta no declínio na qualidade de vida da população. Como prova disso, Roraima (53,1%) e Amapá (51%) apresentam o menor índice de vacinados com duas doses da Covid no Brasil. No geral, estados do Norte registram reforço abaixo de 30%, de acordo com o Ministério da Saúde.
E por falar nela, a pandemia também agravou o quadro de desigualdade em todas as esferas. Uma pesquisa publicada em abril pela Fiocruz, apontou que 11,8% dos brasileiros deixaram de procurar a rede de saúde pública durante a crise sanitária do coronavírus. O desgaste com o sistema, suas burocracias e, em alguns casos, o alto custo dos medicamentos, afastaram a população das clínicas e hospitais.
Como reflexo desse afastamento, a automedicação cresceu significativamente no Brasil no último ano. No Dia Nacional do Uso Racional de Medicamentos, em 05 de maio, o Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico (ICTQ) apontou que o número de pessoas que tomam remédios por conta própria passou de 76%, em 2014, para 89%, em 2022. A verdade é que hoje em dia a maioria das pessoas – para não dizer todas – que sentem uma dor de cabeça, dor de barriga ou mal estar, se dirige à farmácia e se automedica.
Mas a população não pode ir pelo caminho mais fácil, que, aliás, também é o mais perigoso. Antes de qualquer coisa, é necessário procurar o atendimento especializado. A boa notícia é que muitos testes essenciais como os de diabetes, pressão e HPV, para citar alguns exemplos, estão disponíveis em farmácias. Ou seja, é possível ter cuidados primários fora das clínicas ou laboratórios, considerados elitizados. A ideia é que as farmácias auxiliem nessa triagem, para posteriormente encaminhar o paciente para um posto de saúde ou hospital particular, dependendo do seu quadro clínico.
Assim, se evidencia a necessidade de políticas voltadas para a saúde e da implementação de tecnologias, como forma de facilitar a democratização de uma saúde de qualidade e acessível para todos. Graças ao desenvolvimento de novas soluções no mercado, está sendo possível fazer o controle profilático de doenças. Como exemplo, temos o passaporte digital da vacina e apps integradores de prontuário médico entre farmácias, hospitais, clínicas e laboratórios.
Nessa jornada, organizações públicas e privadas devem avançar juntas na inovação, para aumentar o acesso não só aos exames, mas à saúde de forma geral em nosso país. Certamente, a verdadeira democratização da saúde apenas acontecerá quando cada cidadão tenha a possibilidade de usufruir de um sistema de qualidade sempre que necessário. Afinal, a saúde é um bem básico.
*Everton Cruz é o CEO da empresa franco-brasileira Mooh!Tech