O boom de casos de Covid ocasionados pela Ômicron neste início de ano colocou os sistemas de saúde novamente sob pressão. A demanda por atendimento explodiu, na esteira da maior transmissibilidade da variante do coronavírus. Felizmente, dessa vez, o avanço da vacinação garantiu forte anteparo contra agravos da doença. Além disso, também na atual onda, a telemedicina se mostrou aliada essencial no enfrentamento da pandemia.
Sim, é fato que parte dos pacientes atendidos à distância têm tido dificuldades, enfrentado filas e esperas demoradas pela consulta. Estes contratempos estão relacionados, principalmente, à intensidade desta nova onda da Covid, que pegou a todos, em todo o mundo, de surpresa.
Mas há também um segundo fator a considerar. O aumento exponencial de demanda pela telemedicina também reflete o sucesso desta modalidade de atendimento, que estreou há menos de dois anos e ainda é exercida em caráter emergencial no país.
Como toda novidade, a telemedicina enfrenta desafios e, necessariamente, ainda precisa sofrer adaptações sucessivas — às vezes em tempo recorde — até chegar a um estado de excelência. No caso da saúde suplementar, as operadoras estão investindo em melhorias nas suas plataformas e reforçando suas equipes médicas, algo que esbarra no desafio do afastamento de profissionais de saúde infectados.
As associadas à FenaSaúde estimam ter realizado 6,5 milhões de teleatendimentos desde abril de 2020. Os índices de satisfação e de resolutividade aferidos junto aos usuários ultrapassam 90%. Esta é uma conquista que veio para ficar.
Num país com dimensões como as do Brasil, a telemedicina é importante instrumento de democratização de acesso. Basta dizer, por exemplo, que pacientes da região Norte, onde situam-se menos de 5% dos médicos brasileiros, podem agora ser atendidos por profissionais de qualquer lugar do território.
Sob este aspecto, a prática dos últimos dois anos jogou por terra a chamada territorialidade, ou seja, a restrição de atendimentos à unidade da federação à qual o médico está ligado por meio do seu conselho profissional, como alguns defendem. Todos puderam atender a todos, onde estivessem. Estivesse em vigor, a limitação teria fechado portas a quem mais precisa e menos acesso tem à saúde no país.
A telemedicina também tem se revelado crucial para o sucesso das estratégias de contenção da Covid e de outras doenças. Sem ela, teria sido bem mais difícil evitar idas não urgentes e/ou não emergenciais a hospitais, consultórios e postos de saúde, reduzindo bastante os riscos de contágio, em consonância com as melhores orientações das autoridades sanitárias no mundo todo.
A realidade mostrou que os pacientes podem ser assistidos à distância mesmo quando se trata de uma primeira consulta com o médico, que mantém total autonomia para indicar casos em que esta condição não se aplica e o atendimento precisa ser presencial. Aliás, imaginemos o que teria acontecido se os milhares que acorreram à telemedicina nesta nova onda da Covid tivessem que se dirigir, primeiro, a um consultório ou um hospital…
Estas são algumas das características que o exercício da telemedicina, tal como tem sido praticada entre nós desde o início da pandemia, mostrou serem mais benéficas para os sistemas de saúde e para os pacientes. É desejável que a regulamentação definitiva da telessaúde — que também abarca a prática de outras especialidades, como terapias, ora em discussão no Congresso Nacional — leve em conta estes aprendizados.
A telemedicina é um raro caso de experiência inovadora que está podendo ser testada no dia a dia enquanto nossos legisladores definem seu arcabouço legal. O laboratório dos últimos dois anos deixa claro que quanto menos restritivas e mais abrangente forem, sobretudo por tratarem de uma modalidade de assistência que envolve inovação contínua, melhores as regras serão. E mais os pacientes poderão ser beneficiados pelos atendimentos de saúde feitos à distância com uso da tecnologia.
*Vera Valente é diretora-executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde).