Amil: O que fez a UnitedHealth decidir vender o plano de saúde e sair do Brasil
20/01/2022

RIO - Uma década depois de comprar a Amil com a promessa de reforçar o perfil inovador e acelerar o crescimento da empresa, a gigante UnitedHealth Group se prepara para deixar o país sem alcançar os resultados que esperava.

Ex-executivos e fontes do setor de saúde afirmam que uma combinação de fatores levou a americana a ficar para trás no Brasil, como a insistência em um modelo importado de gestão, erros na transição do comando e a centralização de decisões no exterior.

Mas não é só. Em uma década, rivais nacionais ganharam espaço, em um mercado que movimentou R$ 15 bilhões em fusões e aquisições no ano passado e que soma 48,68 milhões de beneficiários, o maior patamar desde 2016.

Dados levantados pelo GLOBO com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mostram que em 2012, a Amil tinha 2,93 milhões de beneficiários de assistência médica, um patamar que se manteve igual, em novembro último.

Concorrentes como a NotreDame, por exemplo, registraram um salto de usuários, de 1,63 milhão para 3,17 milhões no mesmo período. A Hapvida quase dobrou sua carteira de tamanho, para 2,82 milhões.

Um dos ex-executivos da Amil atribui os problemas a um modelo engessado, no qual todos os processos na empresa, de Recursos Humanos à Logística, passam pelo aval dos americanos. O efeito no dia a dia, segundo o relato, era mais demora e burocracia na tomada de decisões.

Retorno menor que rivais

Entre os exemplos, o ex-executivo, que pediu para não ser identificado, afirma que era exigido o mesmo rigor de documentação para empresas de grande porte, como a multinacional responsável pelos computadores, e para as de pequeno porte, como um escritório que vendia planos em Nova Iguaçu.

O economista Carlos Ocké-Reis, da diretoria de Estudos e Políticas Setoriais de Inovação e Infraestrutura do Ipea, analisou o desempenho econômico-financeiro das operadoras líderes de mercado de planos de saúde entre 2007 e 2019.

Segundo ele, desde 2013, quando o grupo decidiu fechar o capital da Amil na Bolsa, a operadora apresentou sucessivos resultados negativos, enquanto as concorrentes aceleraram os ganhos:

— Se analisarmos o retorno sobre o patrimônio líquido, mesmo antes da pandemia, é possível observar que a empresa deixou de ser rentável. Em anos de recuperação, o lucro líquido auferido foi menor do que o das demais. Na crise, uns ganham, outros perdem, daí o movimento de concentração, fusão e aquisição do mercado de planos, hospitais e laboratórios. De modo geral, grandes grupos econômicos da saúde estão ganhando muito dinheiro, sobretudo as operadoras.
 

No Brasil, de acordo com dados da ANS, a Amil oferecia em novembro assistência médica e odontológica a 5,1 milhões de beneficiários. No país, a UnitedHealth conta ainda com o Américas Serviços Médicos, que contabiliza 16 hospitais e 41 clínicas médicas, distribuídos em seis estados brasileiros, com estrutura que soma 2.332 leitos e mais de 17 mil profissionais.

No mercado, a expectativa é que a Amil divulgue perdas em 2021. Mas a controladora viu seus ganhos aumentarem, de acordo com o balanço divulgado na quarta-feira nos EUA. No quarto trimestre, a empresa lucrou US$ 4 bilhões, um aumento de 84% em relação a igual período do ano anterior. As receitas somaram US$ 73,7 bilhões entre outubro e dezembro.
 

A saúde privada no Brasil é um grande negócio e com grande potencial de crescimento, diz o presidente da Federação Brasileira de Hospitais (FBH), Adelvânio Francisco Morato, chamando atenção para o fato de que apenas 48,68milhões de brasileiros, o equivalente a 22,7% da população do país, contam com plano de saúde.

Ele pondera, no entanto, que além de diferenças em relação a outros países, como a existência do SUS, e de aspectos locais, o Brasil representa desafios extras para empresas estrangeiras, como a capacitação da mão de obra e a legislação trabalhista.

 

— Só em um hospital, há 80 profissões diferentes. Cada uma com um regramento. É como administrar uma cidade, cada departamento seria uma secretaria diferente. Há um problema sério de capacitação da mão de obra que dificulta a gestão padronizada em todo o país. A operação de plano de saúde é ainda mais complexa — afirmou.

Executivos que já foram ligados ao grupo afirmam que a falta de visão sobre o futuro da companhia se tornou mais visível após a morte do fundador da Amil, Edson Bueno, em 2017. Anteriormente, ele mantinha uma cadeira no conselho do grupo e ainda conseguia direcionar parte dos rumos da empresa.

De lá para cá, foram ao menos quatro mudanças de praticamente toda a direção e decisões que trouxeram impacto negativo, como a de descredenciar hospitais da Rede D’Or, o que levou a operadora a perder usuários, principalmente no Rio.
 

Disputa entre bancos

No mercado, executivos lembram que a Amil trouxe várias inovações, como modelos de remuneração de prestadores, projetos de atendimento primário e telemedicina. Mas, de uns tempos para cá, perdeu terreno diante do avanço de rivais nacionais embora permaneça como uma gigante.

Por enquanto, as principais candidatas a arrematar os ativos da UnitedHealth no país são empresas brasileiras, a Dasa e a Rede D’Or. Diante do porte do grupo e do risco de concentração de mercado, a expectativa é que haja uma venda fatiada.

 

Para Angélica Carlini, advogada especializada no setor de seguro e saúde e coordenadora educacional da Escola de Negócios e Seguros, o excesso de regulação no país também atrapalha a entrada de operadoras estrangeiras.

— Os players internacionais estão acostumados a atuar em em um mercado liberal. Não adianta ter uma ideia genial para implementar em um sistema complexo — afirmou.

A decisão de centralizar decisões nos EUA vale também para a venda das operações no Brasil, o que teria deixado executivos descontentes com a perspectiva de transição adiante. Entre os bancos, há uma corrida para ver quem vai coordenar a operação de venda. Segundo fontes, além do BTG, que foi consultado, instituições como Alvarez & Marsal e Bank of America disputam a condução da operação.

Fonte: O Globo




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